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Sauditas e aliados enfrentam Irã no pior choque desde anos 1980

Donna Abu-Nasr

04/01/2016 17h18

(Bloomberg) -- A Arábia Saudita e alguns de seus aliados no Golfo Pérsico cortaram ou rebaixaram as relações com o Irã no maior colapso das relações entre potências do Oriente Médio em quase três décadas, aumentando o temor de piora dos conflitos nessa volátil região.

O governo saudita e o Bahrein deram aos embaixadores iranianos 48 horas para partirem depois que manifestantes atearam fogo à embaixada saudita em Teerã no fim de semana, após a execução do clérigo saudita Nimr al-Nimr, um crítico do tratamento do reino à sua minoria xiita. Os Emirados Árabes Unidos rebaixaram sua representação diplomática ao nível de chargé d'affaires (encarregado de negócios).

A disputa entre a Arábia Saudita e o Irã expõe novamente os atritos em uma região tensa e pode piorar conflitos no Iêmen e na Síria, onde a Arábia Saudita, dominada pelos sunitas, e o Irã, xiita, travam guerras por procuração. O crescente desentendimento ocorre após críticas sauditas ao acordo liderado pelos EUA, no ano passado, sobre o programa nuclear do Irã, uma reaproximação com a qual a liderança em Teerã conta para impulsionar sua economia.

"O Irã agora está basicamente isolado em sua região", disse Ghanem Nuseibeh, fundador da empresa de consultoria Cornerstone Global Associates, com sede em Londres, em entrevista, de Dubai. "O país será o lado que mais sofrerá com esse isolamento. Os iranianos esperam uma reintegração mais ampla ao mundo com o acordo nuclear, mas agora, na prática, fizeram exatamente o oposto".

Reação dos mercados

O preço do petróleo subiu enquanto os mercados acionários da China, do Japão e da Europa despencavam no primeiro dia completo de negociação de 2016. Apesar de a preocupação estar voltada principalmente à economia chinesa, a perspectiva de novos atritos no Oriente Médio contribuíram, inicialmente, para a turbulência. Os contratos futuros do petróleo, em um ponto, estavam em alta de mais de 3 por cento em Londres, de US$ 38,50, antes de recuarem.

"Do ponto de vista dos investimentos, a notícia é ruim: apostava-se na reativação do diálogo entre os sauditas e os iranianos e na redução das tensões", disse Jihad Azour, ex-ministro das Finanças libanês e atualmente vice-presidente da consultoria Booz Co. em Beirute. "Claramente isto não acontecerá durante algum tempo".

O ministro das Relações Exteriores saudita, Adel al-Jubeir, que anunciou a decisão de expulsar os iranianos, disse no domingo à noite que seu povo deixaria de ter relações com "um país que apoia o terrorismo e o sectarismo". A declaração foi repetida por Bahrain, que acusou o Irã de financiar, apoiar e armar extremistas e incitar conflitos na região.

Os Emirados Árabes Unidos também acusaram o Irã de uma inédita e "contínua interferência nos assuntos internos dos estados do Golfo e árabes", segundo a agência oficial de notícia WAM. O Kuwait disse que apoiava "todas as medidas adotadas pela Arábia Saudita para manter sua segurança e estabilidade", segundo um funcionário não identificado do Ministério das Relações Exteriores mencionado pela agência de notícias estatal KUNA.

Mão vingativa

O líder supremo iraniano, aiatolá Ali Khamenei, havia dito anteriormente que as autoridades sauditas enfrentariam as repercussões pela execução do clérigo xiita e que "a mão divina da vingança agarrará os políticos sauditas pela garganta". O grupo libanês Hezbollah, apoiado pelo Irã, acusou a família real saudita de matar al-Nimr.

O impasse entre o Irã e a Arábia Saudita é o maior entre as potências regionais desde o fim dos anos 1980, quando o reino suspendeu os laços com o Irã depois de sua embaixada ter sido atacada após a morte de peregrinos iranianos durante o Hajj, em Meca. Além disso, a Arábia Saudita apoiou o Iraque de Saddam Hussein contra o Irã durante a primeira Guerra do Golfo.

O enfrentamento mais recente provavelmente minará os esforços já precários de acabar com a guerra na Síria, onde a Arábia Saudita apoia militantes sunitas e o Irã financia o regime do presidente Bashar al-Assad.

Título em inglês: Saudis and Gulf Allies Confront Iran in Worst Clash Since 1980s

Para entrar em contato com o repórter:Donna Abu-Nasr, em Beirute, dabunasr@bloomberg.net