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Análise: Medidas de Draghi não afetam custo do capital

Chris Bryant

07/04/2016 15h05

(Bloomberg) -- As políticas heterodoxas de Mario Draghi derrubaram os rendimentos de títulos soberanos e corporativos para os menores níveis já registrados. Mas até agora, tiveram pouco impacto sobre o custo do capital próprio, que permanece persistentemente elevado desde a crise financeira. Isso talvez explique porque a tentativa do presidente do Banco Central Europeu de impulsionar os investimentos não tenha dado resultado.

O custo do capital próprio é o retorno exigido pelos investidores em termos de dividendos e ganhos de capital para deter ações de uma empresa. Juros baixos deram sustentação às ações, mas não o bastante para impedir a ampliação da diferença entre o custo do capital próprio e da dívida .

Por que o capital próprio é tão caro? Uma razão importante é que a volatilidade causa tensão entre os investidores que compram ações, portanto eles querem um prêmio generoso sobre títulos públicos "sem risco". Esse "prêmio de risco de mercado" tende a caminhar na direção oposta dos rendimentos dos títulos corporativos.

Teoricamente, isso não deveria importar muito porque a emissão líquida de ações representa aproximadamente 2,5 por cento do financiamento total para as empresas europeias, que recorrem mais aos empréstimos bancários, de acordo com o economista-chefe do Natixis, Patrick Artus.

Mas na vida real, grandes companhias devem obediência ao custo teórico do capital próprio.

Investimentos que não prometem retorno superior ao custo médio ponderado do capital (custo combinado de dívida e ações, ou WACC na sigla em inglês) geralmente não recebem financiamento. O mesmo se aplica aos bancos, que dificilmente conseguem emprestar mais dinheiro se não obtêm retorno.

O WACC é maior do que se costuma pensar. Um exemplo é a gigante química BASF, que pela lógica, teria custo baixo de capital. A empresa vendeu em 2014 títulos com prazo de cinco anos a um cupom de 1,375 por cento, mas projeta WACC antes dos impostos de 10 por cento neste ano.

E apesar de os bancos centrais terem feito de tudo menos fazer chover dinheiro do céu, as companhias ainda não desembolsam recursos. O investimento global caiu cerca de 10 por cento em 2015, de acordo com a Standard & Poor's, e pode encolher mais 4 por cento neste ano. Esse recuo é puxado pelo combalido setor de commodities. Mas excluindo energia e matérias-primas, o investimento ainda diminuiu 2 por cento no ano passado.

O que deu errado? Em um mundo marcado por baixo crescimento e excesso de capacidade instalada na indústria, é difícil para as empresas gerarem retorno superior ao WACC e isso claramente limita os investimentos.

As empresas europeias poderiam simplesmente aplicar WACC menor, mas estão relutantes ? sem dúvida por acreditarem que os juros não permanecerão baixos para sempre. As organizações também poderiam reduzir o WACC ao acumular dívidas, mas diferentemente de seus pares mais agressivos nos EUA, também estão céticas em relação a isso.

O estrategista de renda variável Robert Buckland, do Citi, argumenta que o custo do capital próprio elevado tem outras consequências indesejáveis. Investidores do mercado de dívida ? que foram obrigados a partir para ações porque os bancos centrais abocanham títulos a torto e a direito ? exigem enormes dividendos para manter ações em carteira. Empresas que dão prioridade a investimentos de longo prazo ao invés de dinheiro no caixa são penalizadas por essa classe de acionistas avessa ao risco.

Quando a empresa alemã de iluminação Osram anunciou a construção de uma fábrica na Malásia de 1 bilhão de euros no ano passado, suas ações desabaram. O anúncio da Peugeot nesta semana de um empreendimento de compartilhamento de automóveis nos EUA foi recebido de forma parecida.

Até agora, as empresas europeias estão bem atrás das americanas em termos de recompra de papéis, mas planos divulgados recentemente por Ryanair e Siemens sugerem mudança. A decisão do BCE de comprar títulos corporativos também pode incentivar essa tendência, tirando dinheiro dos investimentos.

Mas há motivos para esperança. É possível que a compra de títulos corporativos pelo BCE obrigue alguns fundos de pensão e outros investidores a parar de fugir de ativos de risco como ações. Ao provocar a alta dos preços das ações, o custo do capital em ações diminuiria. A subida das ações também ajudaria a tapar o buraco nos planos de previdência das empresas, que é outro motivo para as organizações não investirem.

Se isso não funcionar, o BCE poderia expandir o programa de flexibilização quantitativa (QE) para incluir ações. Em uma medida menos polêmica, os governos poderiam remover o viés nas legislações tributárias que tende a penalizar ações. Os juros sobre a dívida frequentemente podem ser contrabalançados pelos impostos corporativos, mas isso é mais difícil no caso dos pagamentos a acionistas.

Nenhuma opção parece provável. Portanto, quando representantes dos bancos centrais se reunirem para discutir porque suas intervenções não surtiram mais efeitos positivos, eles fariam bem em considerar o custo do capital próprio.