IPCA
0,83 Abr.2024
Topo

Fed vê vício em remédios e heroína afetando mercado de trabalho

Jeanna Smialek

20/07/2017 11h25Atualizada em 21/07/2017 09h31

(Bloomberg) -- A fábrica de Bill Polacek enfrenta um problema tão grande no mercado de trabalho que até a presidente do banco central dos EUA está falando sobre ele.

Há alguns anos, Polacek entrevistou 350 candidatos para 50 vagas abertas para soldadores e ferramenteiros da fábrica que fica em Johnstown, no Estado da Pensilvânia. Quando reduziu o número de candidatos para 100, ele descobriu que metade tinha antecedentes criminais ou não passou no teste de uso de drogas.

"Nós não estávamos atraindo as pessoas certas", disse Polacek, que passou a trabalhar com escolas de ensino médio para ampliar seu acesso à mão de obra.

A dificuldade que Polacek encontrou para contratar pessoal na época se tornou um grande problema para muitos empregadores atualmente. Embora a taxa de desemprego nos EUA esteja próxima do menor nível em 16 anos, o abuso de derivados de ópio tornou-se uma crise para muitas comunidades do país.

A epidemia chamou a atenção do Federal Reserve e foi discutida demoradamente pela presidente da instituição, Janet Yellen, durante depoimento ao Senado na semana passada. Paralelamente, escritórios regionais do Fed relatam que empresas em suas respectivas jurisdições estão citando a epidemia como impedimento às contratações.

Derivados de ópio

A epidemia de derivados de ópio está fora da alçada tradicional do Fed, mas é importante para o banco central por dois motivos. Se o vício impede que as pessoas sejam contratadas, isso pode ajudar a explicar porque a parcela de gente na melhor idade para trabalhar que está de fato trabalhando é a menor até hoje. Em segundo lugar, o Fed reforçou o foco no desenvolvimento da mão de obra e das comunidades nos últimos anos e a crise é uma realidade dolorosa que prejudica o capital humano em todo o país.

Dados da Agência de Abuso de Substâncias e Saúde Mental dos EUA indicam que 2,7 milhões de adultos acima de 26 anos estavam abusando de remédios contra dor em 2015 e que atualmente 236.000 usam heroína. Embora esse grupo seja pequeno dentro de uma força de trabalho formada por 160 milhões de pessoas, é provável que responda por boa parte dos 7 milhões de desempregados.

A maioria das pesquisas econômicas sobre os efeitos da crise causada pelos derivados de ópio é acadêmica e não realizada por funcionários de Fed. A conclusão é que existe uma relação de mão dupla entre as drogas e a economia americana.

Poucas oportunidades de trabalho

As poucas oportunidades de trabalho para a classe operária e a classe média dos EUA aparentemente ajudaram a alimentar esses vícios. Por sua vez, o uso de heroína e o abuso de remédios podem piorar as chances de um viciado conseguir emprego e resultar em antecedentes criminais que prejudicarão as perspectivas de trabalho dessa pessoa durante anos.

"Eu acho que tem a ver com a queda da participação das pessoas na melhor idade para trabalhar", disse Yellen aos senadores na semana passada, quando indagada sobre a crise. "Eu não sei se é causal ou um sintoma de mazelas econômicas de longa data que afetaram essas comunidades e afetaram particularmente trabalhadores para os quais as oportunidades de trabalho diminuíram."

Livro Bege

Na edição de 12 de julho, o Livro Bege, que reúne pesquisas do Fed sobre condições econômicas regionais, afirmou que "contatos no setor fabril em Louisville e Memphis relataram dificuldades para encontrar funcionários experientes ou qualificados e alguns citaram que candidatos não passaram em testes de uso de drogas". Em conversas com o responsável pelo escritório do Fed na Filadélfia, Patrick Harker, empresários também mencionaram o problema como barreira para encontrar funcionários.

Já o escritório regional do Fed em Boston publicou uma pesquisa em setembro sobre a relação entre a fraqueza da economia local e o uso de derivados de ópio na região conhecida como Nova Inglaterra, que reúne diversos Estados no nordeste do país.

Pesquisas dos economistas Anne Case e Angus Deaton, da Universidade de Princeton, sobre o avanço da taxa de mortalidade entre a classe média branca sugerem que a ruptura de estruturas econômicas e sociais tradicionais contribuiu para o aumento dos suicídios, overdoses e da incidência de alcoolismo entre esse grupo demográfico.