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Credor foi quem mais ganhou com boom dos frigoríficos no Brasil

Gerson Freitas Jr.

15/12/2017 14h11

(Bloomberg) -- A forte expansão dos frigoríficos brasileiros desde a ida à bolsa de valores, 10 anos atrás, beneficiou uma única classe de investidores: os que compram dívidas.

Quem apostou, por exemplo, nas ações da Minerva após o IPO, em 2007, amarga hoje uma perda acumulada de 68% em dólar, mais que o dobro do declínio do Ibovespa no período. Em contrapartida, os títulos de dívida emitidos no exterior pela companhia -- os chamados bonds -- deram um retorno de 198%, o dobro da média dos títulos corporativos do mercado emergente.

Assim como Marfrig e JBS, seus concorrentes maiores, a Minerva acumulou dívidas elevadas para financiar sua expansão. E embora as vendas tenham se multiplicado por quase oito desde o ano do IPO, os ganhos adicionais foram, em grande parte, parar nos bolsos dos credores. A Minerva gasta hoje o equivalente a quase 80% de seu Ebitda, o lucro antes de juros, impostos, amortização e depreciação, com o serviço da sua dívida --um recorde entre os pares globais. Resta pouco na forma de lucros e dividendos para os acionistas.

"Isso foi parte da mágica, na perspectiva dos bondholders", disse Ian McCall, que ajuda a administrar US$ 190 milhões em ativos do mercado emergente na First Geneva Capital Partners. "Você estava recebendo a maior parte do Ebitda que essas empresas geravam."

JBS, Marfrig e Minerva abriram o capital na Bolsa de Valores de São Paulo em meio a um boom nos preços das commodities e incentivos do governo para a consolidação do setor. A JBS foi o grande destaque, tornando-se rapidamente o maior produtor mundial de carnes, após investir quase US$ 20 bilhões em aquisições no Brasil e no exterior. Mas Minerva e a Marfrig também cresceram de modo acelerado. As três empresas dominam as exportações brasileiras de carne bovina, com aproximadamente três quartos dos embarques. O Brasil é o maior exportador mundial da commodity.

Para uma indústria habituada a margens apertadas, o elevado custo de capital no Brasil é uma barreira importante para a redução de dívidas. A Marfrig, por exemplo, gasta quase o mesmo valor que a Tyson Foods com o pagamento de juros, embora sua dívida seja apenas um quarto do tamanho da dívida da gigante americana. A Tyson gasta apenas 7% de seu Ebitda com o pagamento de juros. Seus bonds deram retorno de 132% durante a última década, mas o valor de suas ações quintuplicou.

Minerva e Marfrig voltaram a expandir suas operações nos últimos meses diante da forte demanda externa por carne bovina e da oferta maior de gado para abate na América do Sul. As duas rivais também buscam ocupar o espaço aberto pela JBS, que foi forçada a reduzir suas operações em bovinos em meio ao escândalo produzido pela delação dos irmãos Batista, em maio.

Marfrig e JBS optaram por não comentar o tema. A Minerva não respondeu à solicitação da reportagem.

Capacidade de abate

A Minerva aumentou sua capacidade de abate em 50 por cento após desembolsar US$ 300 milhões na compra dos ativos da JBS na Argentina, no Paraguai e no Uruguai, anunciada em junho. A Marfrig reabriu cinco frigoríficos no Brasil, quase dobrando sua capacidade de abate no país. A estratégia levou o JPMorgan a reduzir sua recomendação para ambas as ações, citando a maior alavancagem e as margens apertadas entre os motivos para a decisão. A dívida líquida acumulada por Minerva e Marfrig correspondia a mais de quatro vezes o Ebitda no terceiro trimestre.

As empresas se comprometeram a reduzir a alavancagem até 2018. A Minerva concluiu sua estratégia de expansão e, tão logo a dívida caia para níveis confortáveis, deve pagar mais dividendos aos acionistas, afirmou o diretor financeiro da companhia, Edison Ticle, em uma reunião com analistas em São Paulo, no último dia 28.

Marfrig tem dito a investidores que sua dívida líquida pode ser reduzida a 2,5 vezes o Ebitda no próximo ano com a planejada abertura de capital da Keystone, sua divisão americana. A JBS já reduziu a dívida líquida para 3,42 vezes o Ebitda no último trimestre depois de vender ativos como parte de um acordo com os bancos. A empresa promete continuar a reduzir seu endividamento nos próximos trimestres diante do forte desempenho de suas operações nos EUA.

"O cenário está melhorando consideravelmente para os produtores de carne no Brasil", disse Raul Grego Lemos, analista da Eleven Financial Research. Investidores que fugiram do setor em meio a uma série de escândalos no último ano devem gradualmente voltar a olhar os fundamentos do setor, disse ele. "Uma visão mais positiva vai acabar sendo traduzida no preço das ações."

--Com a colaboração de Paula Sambo