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Trump pode derrubar império erguido por presidente da Huawei

Blake Schmidt

10/12/2018 16h03

(Bloomberg) -- Na enorme sede da Huawei Technologies em Shenzhen, as paredes do refeitório são decoradas com frases do fundador e presidente Ren Zhengfei. O laboratório de pesquisas lembra a Casa Branca, em Washington. No local, há um lago onde vivem três cisnes negros.

Ren foi soldado do Exército Popular de Libertação e ganhou bilhões com tecnologia. Para ele, as aves servem para lembrar que é preciso combater a complacência e se preparar para crises inesperadas. E foi o que aconteceu na Huawei. A diretora financeira, Meng Wanzhou, filha de Ren, está presa no Canadá e pode ser extraditada para os EUA, após acusações de conspirar para fraudar bancos e violar sanções ao Irã.

A prisão dela colocou a Huawei no fogo cruzado da rivalidade tecnológica entre China e EUA. O governo americano vê a empresa chinesa --grande fornecedora global de equipamentos para redes de telefonia móvel-- como potencial risco à segurança nacional.

Na equipe do presidente Donald Trump, alguns estão especialmente empenhados em impedir que a Huawei forneça equipamentos para a migração das operadoras americanas de celular para a tecnologia 5G, que promete acelerar a adoção de carros autônomos e dispositivos conectados à internet.

Ren é uma lenda no mundo dos negócios da China. Ele sobreviveu enquanto milhões morriam de fome em consequência de políticas econômicas implementadas por Mao Tse Tung e conseguiu erguer uma companhia de tecnologia que fatura US$ 92 bilhões. A Huawei é a maior fabricante de smartphones da China e segunda maior do mundo, ultrapassando a Apple, de acordo com a firma de pesquisas IDC.

Embora receba menos atenção do que as gigantes chinesas da internet, a receita da Huawei no ano passado foi maior do que a soma das receitas de Alibaba Group Holding, Tencent Holdings e Baidu. Metade das vendas é feita no exterior, principalmente na Europa, Oriente Médio e África.

Há anos, autoridades ao redor do mundo expressam preocupação com a expansão global da companhia. Em 2008, o Comitê de Investimento Estrangeiro dos EUA impediu que concretizasse uma aquisição. Mais recentemente, Austrália, Nova Zelândia e EUA vetaram ou limitaram o uso de equipamentos da Huawei.

Operadoras de celular do Japão também planejam banir alguns componentes fabricados pela companhia, conforme reportagem veiculada pela "Kyodo News" nesta segunda-feira (10).

A detenção e o processo contra Meng nos EUA se desenrolam em meio à disputa entre EUA e China pelo domínio tecnológico nas próximas décadas --com consequências potencialmente severas para a Huawei. Ren recusou o pedido de entrevista da Bloomberg News.

"Isso dá a Trump um trunfo para barganha", disse o economista George Magnus, do Centro para a China da Universidade de Oxford, no Reino Unido. "Ela é a filha do presidente, Ren Zhengfei, um ex-oficial do Exército, e as supostas interações entre Huawei e Irã são só a preocupação mais recente entre muitas."

Se a situação chegar a tal ponto, uma proibição à compra de tecnologias e componentes americanos seria um golpe duro para a Huawei. O governo Trump impôs essa penalidade à também chinesa ZTE, mas recuou.

Um veto comercial pleno nos EUA não se aplicaria somente a componentes, mas também a software e patentes de companhias americanas, alertaram os analistas Edison Lee e Timothy Chau, da Jefferies Securities.

"Se a Huawei não puder licenciar o Android do Google ou as patentes da Qualcomm em tecnologia de acesso por rádio 4G e 5G, não poderá fabricar smartphones ou estações de base 4G/5G", escreveram em relatório.

(Com a colaboração de Edwin Chan e Kevin Hamlin)