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'Armadilha americana': executivo francês fala de prisão nos EUA

Tara Patel

16/01/2019 14h06

(Bloomberg) -- O pesadelo do francês Frédéric Pierucci começou pouco depois de seu avião aterrissar em Nova York em uma turbulenta noite de abril de 2013.

Assim como o recém-encarcerado titã do setor automotivo Carlos Ghosn, Pierucci, ex-executivo da Alstom, foi levado de seu avião para a cadeia, acusado de delitos financeiros.

Os acontecimentos em torno de sua prisão abrem o livro de Pierucci, "Le piège américain" ("A armadilha americana"), que chega às livrarias na França nesta quarta-feira - alguns meses depois de sua disputa de cinco anos com o Departamento de Justiça dos EUA. Em mais de 386 páginas, Pierucci descreve a vida com criminosos endurecidos em prisões da Pensilvânia e de Rhode Island, maquinações nos bastidores com advogados e promotores americanos que buscavam um acordo de delação premiada e disputas entre CEOs e políticos franceses por uma aquisição de US$ 10 bilhões do outro lado do Atlântico.

Os casos de Pierucci e Ghosn não estão relacionados e têm pouco em comum. Pierucci desembarcou em Nova York em um voo da Cathay Pacific, e Ghosn foi capturado em seu avião particular, no aeroporto de Haneda, em Tóquio, em novembro. Promotores japoneses indiciaram Ghosn por supostas impropriedades relacionadas a prejuízos com transações pessoais e à renda do ex-presidente da Nissan Motor na fabricante de veículos, acusações que ele nega. Pierucci, que acabou se declarando culpado, foi preso por seu papel em um escândalo internacional de suborno que envolveu a Alstom durante quase uma década.

Intriga corporativa

Ainda assim, os dois casos têm um traço comum: o cheiro de intriga corporativa e negociação politicamente sensível.

No caso de Ghosn, as filhas dele acusaram a Nissan de ter inventado as acusações para barrar um possível plano de fusão entre a companhia japonesa e a francesa Renault. Para Pierucci, seu longo atoleiro judicial só foi esclarecido depois que a General Electric conseguiu fechar um acordo para devorar os negócios de energia da rival francesa Alstom. Amargurado e quebrado, Pierucci diz que o ex-CEO da Alstom, Patrick Kron, foi poupado para facilitar o acordo de 2015.

"A armadilha americana", livro coescrito pelo jornalista francês Matthieu Aron, é uma história que serve de lição para os executivos de multinacionais que enfrentam cada vez mais a ameaça de litígio quando, supostamente, violam a lei dos EUA. O exemplo mais recente disso é a prisão da diretora financeira da empresa chinesa Huawei, Meng Wanzhou. Filha mais velha do bilionário fundador da companhia, Meng está no Canadá e enfrenta uma possível extradição para os EUA, acusada de ajudar a defraudar bancos para evitar sanções contra o Irã.

Caso de suborno

Pierucci foi preso de acordo com a Lei de Práticas de Corrupção no Exterior dos EUA. Essa lei extraterritorial permitiu que o Departamento de Justiça dos EUA realizasse investigações anticorrupção em todo o mundo contra empresas não americanas e rendeu bilhões em multas. Embora tenha servido para dissuadir as empresas de pagar subornos, a lei também gerou ressentimentos contra os EUA, que teria agido como uma polícia global e tido como alvo empresas estrangeiras concorrentes.

As acusações contra Pierucci, de 51 anos, giraram em torno de um contrato de US$ 118 milhões de uma usina indonésia assinado em 2005. Como parte de seu trabalho para conseguir assegurar o contrato para a Alstom, que enfrentava dificuldades na época, ele ajudou a contratar "consultores" externos para angariar apoio entre as autoridades locais. Em seu livro, Pierucci descreveu a prática como um procedimento bem azeitado e claramente definido pela hierarquia da empresa para obter a aprovação.

(Atualizações com detalhes do livro no 14º parágrafo.)