Cautela custa aos estrangeiros a maior parte do rali Brasil
(Bloomberg) -- O rali nos ativos brasileiros que levou a bolsa a um marco histórico deixou de fora muitos investidores estrangeiros que estavam reticentes com a euforia dos mercados. Agora, pode ser tarde demais para pegar o bonde.
Receosos com as perspectivas de aprovação da reforma da Previdência, investidores estrangeiros retiraram R$ 425 milhões da bolsa brasileira do começo do ano até meados de março, dando continuidade ao fluxo de saída visto em 2018 -- o maior desde a crise financeira global. Ainda assim, impulsionado pelo otimismo dos locais, o Ibovespa subiu 9,4% este ano e cruzou o tão esperado nível de 100.000 pontos esta semana.
Os investidores estrangeiros ainda estão céticos e é possível entender o porquê, dado que houve muitas promessas de reformas na América Latina que não deram certo ao longo dos últimos anos, diz João Braga, co-chefe de renda variável da XP Asset Management. Mas, para Braga, os estrangeiros estão perdendo a primeira pernada do rali.
O ceticismo dos estrangeiros deixou a bonança do mercado em grande parte para os investidores locais, que estão confiantes de que o governo conseguirá aprovar a reforma da Previdência no Congresso. Os locais aceitaram falhas de comunicação no governo, alguns escândalos envolvendo filhos do presidente e dados econômicos ainda fracos, se atendo ao otimismo que começou antes mesmo de Jair Bolsonaro ser eleito em outubro.
É verdade que alguns estrangeiros, incluindo o fundo soberano de Cingapura e o Citigroup, expressaram certo otimismo com o governo Bolsonaro, citando não apenas os planos de reforma da Previdência, mas também medidas destinadas a reduzir a burocracia e impulsionar a economia. Ainda assim, o 'real money' provavelmente não começará a fluir até que haja um progresso efetivo, de acordo com Will Landers, que acaba de assumir a direção da unidade de gestão de ativos do Banco BTG Pactual, depois de 17 anos na BlackRock Inc. O Morgan Stanley também está no campo de Landers.
"Muitas pessoas perderam o barco e esperam uma correção", disse Greg Lesko, da Deltec Asset Management, em Nova York, que está otimista em relação ao Brasil. "Os valuations estão subindo, mas ainda estamos otimistas de que o crescimento continuará melhorando, ajudando a elevar a lucratividade."
As ações brasileiras subiram 17% em dólares este ano, o terceiro melhor desempenho entre 94 índices de ações globais. Os títulos soberanos do país também estão em alta: o índice JPMorgan, que os acompanha, atingiu o maior nível de todos os tempos na terça-feira, elevando o retorno total deste ano para 4,4%. Até mesmo o real está em alta, apesar de ser o ativo menos utilizado para capturar o otimismo com a reforma por se beneficiar menos da melhora fiscal e ser mais vulnerável a fatores externos.
Edwin Gutierrez, da Aberdeen Standard, em Londres, diz que prefere ficar em modo de espera por enquanto. O gestor, que ajuda a administrar US$ 735 bilhões, não possui títulos de dívida externa do Brasil e recentemente reduziu sua exposição à dívida local em 60%. Ele diz que está confortável em reduzir o risco diante do "ruído inevitável" que virá com as negociações da reforma da Previdência.
"Será preciso um grande selloff para atrair os estrangeiros para o mercado", disse Gutierrez. "Grande parte do rali já passou. Ainda haverá ganhos se for aprovada uma reforma substancial da Previdência, mas nada como vimos nos últimos meses."
Embora alguns estrategistas ainda vejam o Ibovespa em 115.000 ou 120.000 pontos até o final do ano, as ações estão sendo negociadas a 12,4 vezes os lucros estimados, marginalmente abaixo da média dos últimos cinco anos, de 12,8 vezes, segundo dados compilados pela Bloomberg. Os analistas de câmbio projetam o dólar em R$ 3,80 até o final do ano, aproximadamente onde está negociando agora.
A reforma previdenciária é vista como crucial para a correção das contas fiscais do país. A proposta do governo, que acabou de começar a tramitar no Congresso, deve ser atenuada, mas ainda deve ser aprovada, de acordo com uma pesquisa do Bank of America Merrill Lynch com 32 gestores de fundos. Mesmo assim, provavelmente levará mais tempo do que o estimado anteriormente para que isso aconteça, disseram eles.
"Os valuations atuais já precificam uma probabilidade razoável de que a reforma seja aprovada", o que apontaria para uma queda significativa caso isso não ocorresse, disse Bradford Jones, gestor de recursos da Sagil Asset Management, em Londres. "Estamos overweight em Brasil, mas reduzimos essa posição até vermos mais clareza."
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