Mourão viaja a China com a missão de desfazer mal estar
(Bloomberg) -- O vice-presidente Hamilton Mourão chega à China neste domingo com a missão de dissipar qualquer resquício de mal-estar que colocasse em risco a parceria comercial entre os dois países.
China é tema sensível e divide opiniões no governo. Enquanto o presidente e o grupo ideológico manifestaram restrições ao país asiático, expondo-o como uma economia predatória que quer comprar o Brasil, a ala militar e os técnicos, como a ministra Tereza Cristina (Agricultura) têm visão pragmática de que seria um erro abrir mão dos chineses por razões políticas.
"Os chineses entendem que Mourão tem papel central para tone down a retórica de Bolsonaro. Eles sabem que a relação Mourão-China será fundamental na presidência", afirma Oliver Stuenkel, especialista em China da FGV.
Nos últimos meses, Bolsonaro abrandou a narrativa maniqueísta, martelada durante a campanha, pela qual o Brasil deve se aproximar dos EUA e se afastar de Pequim, mas mantém a visão crítica ao comércio com os chineses. No mês passado, em conversa com jornalistas em seu gabinete, repetiu frase usada na campanha de que "a China não quer comprar no Brasil, a China que comprar o Brasil".
"Os EUA são campeões da democracia e da liberdade, e nosso governo tem colocação muito clara sobre o que isso representa, mas por outro lado temos que ter pragmatismo suficiente para entender a importância da China para o desenvolvimento econômico do Brasil", disse o vice-presidente dias atrás. Ele afirmou que levará ao presidente chinês, Xi Jinping, uma carta de Bolsonaro com mensagem de "amizade" e empenho para "continuar na parceria que a gente tem".
Negócios bilaterais estão no topo da agenda de Mourão na China, hoje o maior parceiro comercial do Brasil. Exportações para o gigante asiático atingiram recorde de U$ 67 bilhões em 2018, com superávit para o Brasil de mais de U$ 30 bilhões, segundo o Ministério da Economia do Brasil. Investimentos chineses somam U$ 98 bilhões de 2007 a 2017.
A China busca apoio formal do Brasil ao "Belt and Road Initiative", megaprojeto de investimentos globais em infraestrutura que é prioridade do governo Xi. O governo brasileiro, embora já receba grandes investimentos chineses, se absteve até agora de uma adesão ao plano, visto como marco geopolítico de Pequim. Questionado, Mourão disse que qualquer acordo, se houver, será decidido e fechado por Bolsonaro no segundo semestre.
Ao longo de cinco dias de visita, Mourão terá encontros com empresários, banquetes oficiais e será recebido pelo presidente Xi. "A visita do vice-presidente Mourão reforçará a confiança política mútua, aprofundará a cooperação amistosa e adicionará novas dimensões à nossa parceria estratégica", disse Geng Shuang, porta-voz do Ministério de Relações Exteriores da China.
A viagem ocorrerá em meio à tensão gerada pela guerra comercial entre China e EUA. Mourão afirma que o Brasil deve acompanhar a situação "de forma crítica e com cautela", porque os dois países são economias complementares e a qualquer momento o aumento das tarifas praticadas pelos EUA pode ser suspenso. "Temos uma posição muito boa, independentemente do que aconteça nessa guerra comercial entre China x EUA."
Os afagos a Mourão são uma tentativa de consolidar laços com o Brasil em meio a incertezas sobre os rumos diplomáticos do governo Bolsonaro, segundo Hussein Kalout, especialista em política externa e pesquisador em Harvard. "Interessa muito aos chineses montar uma agenda robusta para Mourão no momento em que eles tentam sedimentar compromissos com o governo brasileiro em áreas como infraestrutura e segurança alimentar".
Cumprindo promessa de campanha, Bolsonaro deu uma guinada nas relações internacionais do Brasil, priorizando EUA e Israel em detrimento de parceiros importantes. No início deste ano, o governo Xi convidou integrantes do PSL, partido de Bolsonaro, a conhecer a China e fez um esforço diplomático que resultou no compromisso do presidente de viajar ao país asiático no segundo semestre. Por sua vez, Xi deve ir a Brasília para a cúpula dos BRICS em novembro.
Entre os maiores entusiastas da relação com a China estão alguns governadores brasileiros, que já tocam sua própria rede de negócios e contatos com o país asiático. Um deles é Ratinho Junior, governador do Paraná, que esteve recentemente na China de olho em grandes projetos agrícolas e ferroviários. "Bolsonaro entendeu a importância da parceria comercial com a China", disse o governador em entrevista. Ele disse não haver conflito de interesses com o governo federal e atribuiu o acesso direto a Pequim ao interesse dos chineses à boa situação fiscal e econômica do Paraná, o que aumenta garantias para os chineses.
Apesar de Bolsonaro sinalizar maior abertura à China, a relação com Pequim continua sendo ponto não pacificado entre aliados do presidente. O deputado Luiz Philippe Orléans e Bragança (PSL), vice-presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, alerta para os limites da parceria. "É bom conversar com a China, mas depende do que for discutido. Por exemplo, o padrão 5G estabelecido pela China é perigoso porque permitiria aos chineses ter mais informações sobre cidadãos brasileiros do que o próprio governo brasileiro", afirma.
--Com a colaboração de Mario Sergio Lima.
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