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Morte de americano põe turismo na Coreia do Norte em xeque

24/06/2017 06h00

Tamara Gil e Andrés Sánchez Braun.

Pequim/Seul, 24 jun (EFE).- Pouco depois de Otto Warmbier ser detido durante uma viagem como turista a Pyongyang, outros dois americanos decidiram conhecer a Coreia do Norte.

"A caminho do aeroporto, eu me questionava: realmente quero fazer isso?", lembrou Dan, um dos viajantes, consternado com o final trágico do compatriota.

A eterna curiosidade do casal Dan e Katie - ambos na casa dos 30 anos e naturais do estado do Wisconsin, nos Estados Unidos - os levou à China, onde moram e trabalham, sendo ele como escritor e ela como professora, e depois a uma viagem à Coreia do Norte.

"Queria ir além do que a imprensa publica. Ver a parte humana", explicou Katie, pouco depois de saber da morte de Warmbier, o estudante de 22 anos que também viajou ao país liderado por Kim jong-un e entrou em coma (apesar de o motivo não ser conhecido), após ser condenado a 15 anos de prisão sob a acusação de furtar um cartaz de propaganda do regime.

Katie, Dan e Otto fazem parte do mesmo grupo: o dos milhares de estrangeiros que viajam todos os anos ao país graças a uma indústria pouco transparente que hoje está sendo questionada. A morte de Warmbier jogou luz sobre essas viagens turísticas e ao perigo que pode representar entrar em um país que oficialmente continua em guerra com os Estados Unidos e com a Coreia do Sul.

Katie e Dan contrataram um pacote (seis dias pelo equivalente a R$ 4.400) com a mesma agência que foi paga por Warmbier, a Young Pioneer Tours, e eram parte do grupo que viajou imediatamente depois do que o do jovem.

"Na reunião dos preparativos, todo mundo estava muito nervoso. Ninguém queria fazer perguntas. Sabíamos que na viagem anterior Otto tinha sido detido", contou a professora.

Os funcionários conseguiram acalmar os turistas.

"Acredito que fizeram um bom trabalho. Nos disseram: 'se seguirem as normas, se escutarem o guia, se forem respeitosos, se não fotografarem onde não pode, se perguntarem primeiro, estarão bem'", disse ela.

O casal comprou um dos pouco mais de 15 pacotes que as agências vendem para os ocidentais. A maioria dessas empresas tem sede na China e obrigatoriamente opera em conjunto com agências de turismo públicas norte-coreanas.

Segundo eles, o primeiro dia começou tenso.

"Cada grupo sempre tem que estar acompanhado de dois guias locais, e a paranoia fez com que a gente evitasse fazer qualquer comentário", disse a moça.

Aos poucos, todos relaxaram.

"Os guias são mais como cuidadores. O trabalho deles é garantir que você não vai fazer nada de errado. Te dizem quando pode e quando não pode fazer algo", completou Dan.

Nos passeios, nunca conseguiram falar com um morador, principalmente por causa da barreira idiomática.

"Eram muito tímidos, mas não acredito que fosse proibido", acrescentou o escritor, lembrando o severo controle governamental e as duras condições de vida da população: com cortes de luz constantes e zero acesso ao mundo exterior.

Para Dan e Katie, aquela foi uma experiência "única", mas eles não repetiriam.

Depois do caso de Warmbier, a Casa Branca estuda vetar as viagens de americanos à Coreia do Norte, principalmente para evitar que mais cidadãos sejam presos por um regime que os utiliza como moeda de troca.

Até hoje, outros três turistas dos Estados Unidos foram detidos - todos entre 2013 e 2014 - e repatriados meses depois. Em 2008, uma turista sul-coreana morreu ao ser baleada por um soldado depois de supostamente acessar uma zona militar restrita.

Além da questão da segurança, o governo americano quer evitar o financiamento de um Estado que dedica grande parte dos seus recursos a desenvolver programas nucleares e balísticos, mas o peso que um veto turístico teria na economia do regime é questionável.

Um estudo da ONG sul-coreana Korea Maritime Institute estima que Pyongyang receba 100 mil visitantes por ano, 95% deles procedentes da China. Este volume geraria aos norte-coreanos investimentos anuais de US$ 30 a 43 milhões, e no máximo US$ 545 mil viriam de turistas americanos.

A título de comparação, segundo dados do Anuário Estatístico de Turismo 2017 do Ministério do Turismo, Brasília, por exemplo, recebeu 79.356 estrangeiros em 2016. No mesmo ano, o Rio de Janeiro foi visitado por 1.480.121 pessoas de outros países.

Após toda a aventura, Katie e Dan também receberam algumas críticas. Na conferência de uma desertora norte-coreana em Pequim, ela perguntou: "Quem já foi ao meu país?". Metade do público levantou a mão, e ela rebateu: "Eu odeio vocês!".