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Escolas de campo abrem os olhos dos camponeses

18/02/2018 10h05

Presépio Delgado.

Roma, 18 fev (EFE).- Excluídos do sistema educacional e sem quase formação, mais de 12 milhões de camponeses de todo o mundo encontraram nas escolas do campo a possibilidade de aprender por si mesmos e experimentar técnicas para melhorar sua produção.

Desde a criação da primeira destas escolas na Ásia em 1989 como parte de um programa da ONU que ensinava os produtores de arroz a controlar as pragas sem tantos pesticidas, mais de 90 países as incorporaram.

Frente às clássicas visitas de especialistas que levavam a tecnologia ao campo sem ensinar aos agricultores a enfrentar os novos problemas, surgiu a alternativa de adaptar os conhecimentos às circunstâncias de cada um.

A ideia já foi proposta pelo educador brasileiro Paulo Freire na década de 1960 com os seus estudos sobre alfabetização adulta e agricultura no Chile.

"Frequentemente a maior parte dos agricultores não têm títulos com a escola e nem foram ao colégio. É importante investir na formação da população rural se quisermos um desenvolvimento sustentado", explicou à Agência Efe Anne Sophie Poisot.

Esta especialista da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) ressalta que as escolas de campo põem no "centro do processo" os pequenos produtores, que "abrem os olhos e querem continuar experimentando como fazem os cientistas".

Uma atitude vista no estado indiano de Andhra Padresh, onde a exploração agrícola fez baixar o nível dos aquíferos de forma alarmante.

Ali, os participantes do curso, além de aprender a medir a disponibilidade de água, começaram a regar melhor os cultivos e a realizar um consumo doméstico mais responsável.

Em outras partes, foi replicado esse modelo impulsionado pela FAO, que acaba de lançar uma plataforma digital para divulgar as experiências e conectar os profissionais.

No Nepal ajudaram no cultivo de frutas e hortaliças através da polinização. No Paquistão foram projetados modos de produzir alimentos mais nutritivos e rentáveis, e na China um projeto conseguiu reduzir em um terço o uso de pesticida.

Os agricultores costumam se reunir em grupos e, com ajuda de um especialista ou "facilitador", observam o que acontece no terreno, discutem o que vão fazer e analisam os resultados antes de compartilhar conclusões e recomendações.

O treinamento dura o quanto durar um ciclo inteiro de produção, como diz o jargão: vai "de semente a semente", "de ovo a ovo" ou "de bezerro a bezerro".

Perante os que o veem insuficiente para transformar a dura realidade de tantos produtores (em 2013 havia 766 milhões de pobres no mundo, dos quais 80% viviam em zonas rurais), Poisot mostra o pouco custo desses programas, de US$ 25 a US$ 40 por pessoa, levando em conta o que se aprende.

"Muitos governos os assumiram e criaram programas nacionais. Também as comunidades continuam com as atividades após o curso, sem ter de se limitar a uma semana, e formaram associações", acrescentou a especialista.

Outras agências e ONGs estão aplicando os mesmos princípios. Um responsável da organização CARE, Karl Deering, detalhou que a aprendizagem em grupo está servindo para a adaptação à mudança climática sem que "o analfabetismo seja um problema".

Muitos agricultores, antigos conhecedores dos padrões do clima, passam assim a tomar decisões e fazer prognósticos a partir de dados mais confiáveis que eles mesmos são capazes de avaliar com novas ferramentas.

Na Tanzânia, Deering trabalhou com grupos de produtoras ajudando a se associar e tramitar empréstimos e economias. "Por aí começa seu empoderamento econômico. Economizar entre elas lhes dá confiança e lhes permite discutir com os seus maridos e chegar ao mercado "para vender seus produtos", explicou Deering.

O técnico do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (FIDA) Norman Messer classificou de "impressionante" o impacto que as escolas de campo têm nas mulheres, muitas das quais se expressam pela primeira vez na esfera pública.

"Os programas podem ser muito mais eficientes integrando as escolas de campo para agricultores", concluiu Messer.