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Para evitar fraudes, concessão de rodovias deve mudar

André Borges, Lu Aiko Otta e Tânia Monteiro

Brasília

10/05/2018 07h00

O governo decidiu fazer mudanças drásticas no modelo de concessão de rodovias, com o intuito de tornar os projetos mais alinhados com as demandas de órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU), e viabilizar os leilões ainda neste ano. Com as medidas, o que se pretende é eliminar brechas que permitem superfaturamento nas obras, golpes que costumam ser dados por meio de aditivos contratuais.

O jornal 'O Estado de S. Paulo' teve acesso exclusivo às propostas já desenhadas pelo governo e pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). Pelas regras, fica proibida a inclusão de novos investimentos para melhoria e ampliação de capacidade da rodovia nos primeiros cinco anos da concessão.

Essa proibição também valerá para os últimos cinco anos dos contratos, os quais costumam ter validade de 30 anos. Nos dois períodos, o concessionário só poderá executar aquilo que já estava previsto no contrato.

Hoje não há essas proibições de prazos e as obras são executadas conforme demandas apresentadas pelas empresas ou pela ANTT. Normalmente, a realização de investimentos não previstos tem como consequência uma elevação nas tarifas de pedágio, para restabelecer o equilíbrio financeiro do contrato.

O governo também decidiu proibir a inclusão de investimentos fora das revisões quinquenais (a cada cinco anos) dos contratos. A ideia é que a concessão se concentre apenas em seu "estoque de obras" já incluso na concessão. Novas intervenções só poderão ser apresentadas após o término desse estoque.

Grandes obras não previstas originalmente no contrato terão de ser discutidas. A construção de contornos urbanos, por exemplo, ficará condicionada à comprovação das vantagens dessa obra em relação a outras e só poderá ser realizada após a realização de audiência pública, processo que hoje não existe.

Foi decidido ainda que o aumento das tarifas de pedágio para bancar obras como a construção de uma pista adicional só poderá ocorrer depois que o projeto for entregue pela concessionária. Hoje esse custo é cobrado conforme o avanço do empreendimento, embutido na tarifa de pedágio do usuário da rodovia.

A renovação das concessões também foi deixada de lado. Os novos editais vão permitir que seja feita a prorrogação contratual por até cinco anos após o término da concessão, prazo que poderá chegar a, no máximo, dez anos, e por uma única vez, para fins de reequilíbrio financeiro da concessão por conta da execução de novas obras.

'Engessados'

A reportagem repercutiu cada uma das propostas com a Associação Brasileira de Concessionárias de Rodovias (ABCR), que representa as empresas que atuam no setor. Na avaliação de César Borges, presidente da entidade, as medidas indicam que o governo se dispõe a "engessar" os projetos. "Não sabíamos desses detalhes todos. O que podemos dizer, com base nessas informações, é que isso vai engessar o contrato. Significa retirar a autonomia da ANTT e reconhecer que há desconfiança sobre sua capacidade de fiscalizar e tomar decisões técnicas", comentou.

O interesse das empresas nas novas propostas, no entanto, segue inalterado, de acordo com Borges, que foi ministro dos Transportes no governo da ex-presidente Dilma Rousseff. "As empresas do setor seguem interessadas nos projetos e respeitarão as regras dos contratos. Agora, quem vai sofrer com isso é o usuário, nos casos em que obras necessárias apareçam, mas não possam ser executadas por causa de regras desse tipo."

O presidente da ABCR afirmou que, sobre o pagamento de obras adicionais somente após a sua conclusão, não há problemas para as empresas, "desde que o reequilíbrio dos contratos efetivamente ocorra". Ele também minimizou preocupações com a prorrogação de até dez anos para as concessões. "É um prazo razoável para que os investimentos sejam amortizados."

Como fica:

Ampliação

Nos primeiros 5 e nos últimos 5 anos do contrato a concessionária só poderá fazer obras previstas para melhoria da rodovia

Pedágio

O aumento nas tarifas de pedágio para bancar obras na estrada só poderá ocorrer depois que o projeto for entregue pela concessionária.

Relicitação será regulamentada nos próximos dias

Sob pressão depois que a Aeroportos Brasil Viracopos (ABV) entrou com pedido de recuperação judicial, o governo anunciou ontem que divulgará, "nos próximos dias", um decreto regulamentando a relicitação. Trata-se de instrumento criado para socorrer concessionárias com dificuldades de honrar seus compromissos com o governo, como Viracopos. Até hoje, um ano e meio depois de criada, a medida não foi aplicado por falta da regulamentação.

A ABV batalha há nove meses pela relicitação. Em abril, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) para obter uma resposta do governo. Com uma decisão desfavorável da corte, ingressou com o pedido de recuperação judicial esta semana.

A concessionária de rodovias Via 040, que administra o trecho da BR-040 entre Brasília e Juiz de Fora (MG), também é candidata à relicitação, segundo a Agência Nacional de Transportes Terrestres. Outra que pediu para usar o mecanismo foi a Rodovia do Aço, que administra 200 km da BR-393 no Rio.

A relicitação permite que uma concessionária com problemas devolva o negócio para que ele seja leiloado e entregue a outro grupo econômico. Até que seja escolhido um sucessor, a concessionária fica à frente do negócio, numa espécie de "operação padrão".

"O objetivo é manter a continuidade dos serviços prestados pelas concessionárias enquanto o governo faz nova licitação", disse o ministro dos Transportes, Valter Casimiro, após reunião com representantes do Planejamento e o presidente do BNDES, Dyogo Oliveira.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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