INSS manda carta cobrando milhares de reais de desaposentados; o que fazer?
Os aposentados que conseguiram na Justiça o direito de ter um benefício maior com a troca de aposentadoria, também conhecida como desaposentação, podem receber cartas do INSS cobrando a devolução das diferenças pagas. A cobrança chega a milhares de reais e pode ser descontada diretamente da aposentadoria. É possível recorrer na Justiça. Veja mais abaixo neste texto o que fazer.
Atenção: confirme com o INSS e com um advogado se a carta é mesmo do instituto para não cair em golpes, pois alguém pode mandar uma carta falsa para sua casa, pedindo dinheiro.
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Em 2016, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que os aposentados que voltam ao mercado de trabalho não podem ter um benefício maior por ter contribuído mais com a Previdência. Com essa decisão, o governo passou a cobrar os valores pagos para segurados que haviam conseguido por decisão provisória o direito na Justiça.
Segundo a AGU (Advocacia-Geral da União), que representa o governo em ações judiciais, apenas quem recebeu o benefício por decisão provisória (tutela antecipada) "irá, eventualmente, a depender de decisão judicial, devolver" os valores. Em 2016, a AGU (Advocacia-Geral da União) estimava que 182 mil processos sobre o tema estavam em andamento.
O UOL teve acesso a duas cartas enviadas a aposentados: uma de novembro de 2017, cobrando R$ 28 mil do segurado de um período de outubro de 2011 a maio de 2017, e outra de setembro de 2017, pedindo a devolução de R$ 11,5 mil referente a julho de 2014 a março de 2015.
Na correspondência, o INSS diz que o segurado poderá pagar os valores da desaposentação de uma vez. Se não pagar, terá o desconto de 30% no valor da aposentadoria.
Veja reprodução da carta:
O que é a desaposentação?
A troca de aposentadoria, também conhecida como desaposentação, acontecia quando um aposentado que continuava trabalhando pedia para trocar seu benefício por um novo, considerando no cálculo as contribuições previdenciárias feitas após a aposentadoria. Esse mecanismo era usado para aumentar o valor do benefício e só era concedido na Justiça.
Em 2016, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, por 7 votos a 4, que os aposentados que continuam trabalhando não têm direito à desaposentação. Apesar de dizer que não há o direito, o STF ainda precisa esclarecer algumas questões da decisão. Entre as regras que têm de ser definidas está a de se os aposentados que receberam a mais precisam devolver mesmo o dinheiro.
Quem está sendo cobrado?
Mesmo sem os esclarecimentos finais do STF, segurados estão recebendo em casa a carta de cobrança. A AGU não confirmou o envio das cartas e diz que apenas quem recebeu os valores por decisão provisória (tutela antecipada) irá, eventualmente, a depender de decisão judicial, devolver os valores. Isso acontecia quando um juiz permitia que o segurado começasse a receber os valores da troca de aposentadoria, mesmo sem o fim do processo.
Já os casos em que a ação terminou, não será preciso devolver os valores, mas o benefício pode voltar ao valor antigo. "Aqueles que receberam valores em decisão judicial transitada em julgado [decisão final] não precisarão devolver valores, mas poderão ter seu benefício revisto, por meio de ação rescisória", informou a AGU, em nota.
O que diz a AGU?
A AGU informou que a cobrança de valores recebidos antecipadamente é permitida de acordo com uma portaria da PGF (Procuradoria-Geral Federal) e INSS.
“Se cobranças estiverem ocorrendo, certamente se darão através do processo judicial ou por determinação das unidades da PGF, já que para cobrança se faz necessária a reversão judicial da medida que determinou a desaposentação. O INSS não faz e não pode fazer de ofício”, informou o órgão por nota.
Segundo especialistas, apesar de o INSS não poder fazer a cobrança por conta própria, alguns segurados estão recebendo a carta.
A cobrança é permitida?
Para especialistas consultados pelo UOL, a cobrança feita diretamente pelo INSS é indevida. “Esse memorando que a AGU usa como base para a cobrança é um absurdo. Os segurados trabalham a mais, pagam contribuições a mais, tentam aumentar o benefício, o juiz dá a liminar, eles conseguem a desaposentação e depois precisam devolver o dinheiro? É um absurdo”, diz a advogada e presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), Adriane Bramante.
“A cobrança não pode atropelar algo que já foi julgado. As cartas são ilegais e arbitrárias. Como foi verba obtida de boa-fé e tem caráter alimentar, ela seria irrepetível [não deveria ser devolvida]”, diz o advogado previdenciário Rômulo Saraiva.
Roberto de Carvalho Santos, presidente do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários) afirma que há uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) dizendo que é possível pedir a devolução dos valores.
“Mas entendo que não está resolvido, pois não há uma decisão final do STF. Alguns juízes de instâncias inferiores entendem, com base em uma decisão sobre um caso específico do STF, que não precisa devolver. Eu entendo que a postura do INSS em cobrar sem ter terminado a ação é temerária. Se o STF decidir que não precisa cobrar, o INSS pode ter que devolver o dinheiro para essas pessoas.”
Recebi a carta de cobrança. O que preciso fazer?
O segurado terá que procurar seu advogado ou a Defensoria Pública para entrar com recurso e tentar impedir o desconto. Não é possível resolver essa situação diretamente nas agências.
O envio de cartas para casa das pessoas pode ser um golpe. A orientação de Saraiva é que o segurado não pague os valores antes de falar com um especialista. "A recomendação é consultar um advogado de sua confiança para investigar se é fraude ou não. Se for, será preciso fazer uma denúncia. Pode acontecer de quadrilhas mapearem os segurados que estão com processo e enviar a correspondência."
Se a cobrança for do INSS mesmo, Adriane afirma que o segurado terá que avaliar sua situação. "Cada caso é um caso. Se o juiz não falou que é para devolver os valores e o INSS ficou inerte na ação, não pode cobrar agora. Já nos casos em que o juiz determinou a cobrança, o advogado pode recorrer no processo. Mas, se perder, e o processo for encerrado, o segurado vai ter que devolver o dinheiro."
Nos dois casos a que a reportagem teve acesso, os advogados conseguiram impedir o desconto na Justiça, por enquanto.
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