Presidente da Taurus diz que lei é boa, mas comprar uma arma demora 8 meses
Resumo da notícia
- Salesio Nuhs acredita que legislação brasileira não é restritiva
- Taurus é maior fabricante de armas leves do Brasil
- Presidente da empresa também diz que não há monopólio da Taurus no Brasil
- Ele afirma que alta carga de impostos impede que estrangeiras montem fábricas aqui
Uma das promessas do presidente Jair Bolsonaro em sua campanha eleitoral de 2018 foi a flexibilização das regras para compra e venda de armas. Atualmente, Projeto de Lei enviado pelo governo ao Congresso propõe mudanças no Estatuto do Desarmamento. Aprovado pela Câmara em novembro do ano passado, ele agora está em discussão no Senado.
O presidente da Taurus, maior fabricante de armas leves do Brasil, Salesio Nuhs não vê necessidade de mudanças na atual legislação brasileira de compra e porte de armas, que ele considera não ser "restritiva". Ele só considera que o processo ainda está muito lento e demora até oito meses para alguém comprar uma arma.
"O Brasil talvez hoje, entre todos os países do mundo, seja o que tem a legislação mais adequada para o comércio de armas e munições", afirma.
Em entrevista ao UOL, Nuhs também questionou a atual carga de impostos sobre armas, rebateu críticas do filho do presidente, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), aos produtos da empresa e falou os planos da companhia para o mercado externo.
Confira a seguir os principais trechos da entrevista:
UOL - Uma das promessas de campanha do presidente Jair Bolsonaro era flexibilizar as regras para compra e porte de armas. Após pouco mais de um ano de governo, como o senhor avalia o que mudou desde então?
Salesio Nuhs - A compra de uma arma de fogo não é impulsiva. A compra de uma arma de fogo é responsável. Eu não critico a burocracia. Eu acho que o Brasil tem uma lei muito importante para a compra de armas. Você tem que fazer teste prático, psicotécnico, não pode ter antecedentes. Tem uma série de coisas.
O que mudou, e que na prática ainda não está acontecendo, é a agilidade no processo. O processo ainda é muito lento, porque houve uma procura muito grande [por armas], e os órgãos, tanto da Polícia Federal quanto do Exército, não se equiparam, não se atualizaram para atender essa demanda. O processo de compras de armas demora hoje oito meses para acontecer.
No passado era quase proibitiva a compra, porque era uma questão de governo. No referendo [sobre venda de armas] de 2005 nós ganhamos o direito de poder comprar uma arma de fogo para a defesa da propriedade, da família, porém não levamos.
Porque na prática era quase impossível comprar uma arma de fogo, por causa da burocracia, prazos, dificuldades e tudo o mais. Quando você conseguia chegar no final da documentação, os primeiros documentos que você juntava já estavam vencidos, e tinha que começar todo o processo de novo.
Isso já melhorou, mas ainda não está resolvido. Tem que melhorar muito.
O senhor vê necessidade de alguma mudança na legislação atual de porte ou compra de armas?
Pelo contrário. Acho que a nossa legislação é clara para o produto que nós estamos falando. Ela não é restritiva. Eu realmente não acho que ela seja restritiva. Ela tem o peso necessário para o produto que é. A liberação dos calibres e tudo o mais está perfeito.
O Brasil talvez hoje, entre todos os países do mundo, seja o que tem a legislação mais adequada para o comércio de armas e munições.
No ano passado, após o anúncio do decreto que flexibilizava a compra de armas, a Taurus chegou a divulgar que a venda do fuzil T4 seria liberada para civis.
Hoje os colecionadores, caçadores e atiradores [desportivos] já podem comprar. São civis. Está liberada a venda do T4.
Mas o governo negou que o decreto liberaria a venda de fuzis a civis.
Na verdade, houve uma série de interpretações. Em um primeiro momento houve uma interpretação de que qualquer civil poderia comprar o T4. Que 200 milhões de brasileiros iriam comprar um fuzil. Isso nunca aconteceu.
O decreto precisava ser regulamentado, e ele foi regulamentado pelas portarias. E estabelece claramente quem é que pode comprar. Quem pode comprar não é o cidadão comum. Quem pode comprar é aquele cidadão que tem uma qualificação, que seja colecionador, caçador, atirador ou um profissional da segurança pública.
O senhor é a favor de uma mudança no Estatuto do Desarmamento, que está sendo analisada pelo Senado, para acabar com a obrigação da marcação de munições vendidas para as polícias e Exército?
Não, pelo contrário. Isso é uma tecnologia da CBC (Companhia Brasileira de Cartuchos). É uma indústria nacional. A única empresa no mundo que marca a munição. A CBC desenvolveu essa tecnologia.
Essa tecnologia, inclusive, foi elogiada pela ONU. E não teve nenhum caso no Brasil em que foi solicitada a identificação de quem foi o órgão que comprou aquela munição, que não tenha sido identificado. Pelo contrário, a indústria nacional hoje está na vanguarda com relação a essa tecnologia.
Recentemente o senhor esteve na Índia, onde a Taurus assinou uma joint venture com a empresa indiana Jindal Group para fabricação de armas no país. A Índia passa a ser um foco da Taurus neste momento?
Temos um foco na exportação para fora dos Estados Unidos no nosso planejamento estratégico.
A Taurus sempre foi muito focada em venda de produtos de uso civil para os Estados Unidos. Cerca de 80% da nossa produção ainda vai para os EUA. A gente quer se fortalecer no resto do mundo, fora dos Estados Unidos.
Não tínhamos produtos voltados para o mercado policial e militar. Nessa reorganização toda da companhia, criamos um portfólio completo de produtos para o público policial e militar. E isso deu uma exposição para a Taurus muito grande no mundo inteiro.
Qual é a expectativa de produção na Índia?
A nossa expectativa é começar no segundo semestre a produção de armas civis. Seriam basicamente revólveres e pistolas. Porque as armas policiais e militares dependem, como aqui no Brasil, de licitações públicas.
Em um segundo momento a gente vai produzir lá as armas que essa empresa ganhar nas licitações públicas.
Recentemente nós ganhamos uma licitação do exército das Filipinas, de fuzil. Existe no exército indiano uma expectativa de compra de meio milhão de fuzis em cinco anos. Nós estamos de olho exatamente nesses grandes volumes do mercado policial e militar.
E para o mercado brasileiro, quais são os planos?
A Taurus tem uma participação de quase 100% no mercado nacional de armas. São poucas as importações [de armas], apesar de o mercado já estar aberto há um bom tempo. O mercado civil brasileiro é pequeno. Não justifica nenhuma concorrente nossa investir aqui no Brasil.
Agora, pior do que isso, é que a legislação tributária e regulatória no Brasil impede de montar uma fábrica aqui. É muito melhor exportar uma arma para cá do que produzir aqui e pagar 70% de impostos [sobre armas].
Se nós não fôssemos brasileiros, se não tivéssemos orgulho de ser brasileiros, de gerar empregos aqui no Brasil, de pagar impostos aqui no Brasil, seria muito melhor eu exportar armas da minha fábrica nos Estados Unidos para cá ou da minha futura fábrica na Índia para cá, porque entra sem nenhum imposto.
A outra questão é a regulatória. A Taurus hoje tem na fila do órgão homologador mais de 200 armas esperando autorização para vender aqui. Quando você importa uma arma, não tem isso.
O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) defendeu a entrada de fabricantes estrangeiros para aumentar a concorrência e acabar com um virtual monopólio da Taurus no Brasil. Como o senhor vê essa declaração?
Quando ele esteve na Índia com a comitiva do presidente, ele deu uma declaração dessa e eu disse exatamente isso. Ninguém vai montar uma fábrica aqui no Brasil, é bobagem, porque ninguém vai montar uma fábrica para pagar 70% de imposto.
Não existe um monopólio da Taurus. No passado, as importações eram restritas. Hoje não há nenhuma restrição para importação. Hoje o cliente pode escolher entre uma arma da Taurus e uma importada.
A nossa arma hoje é uma opção do consumidor brasileiro, não é a única opção. [A arma da Taurus] tem o melhor custo-benefício. Tem um preço muito acessível. Nenhuma empresa consegue vender aqui no Brasil pelo preço da Taurus.
O problema de só ter uma empresa no Brasil não é da Taurus, é um problema da conjuntura. Eu digo o seguinte: do jeito que está organizada a questão tributária e a questão regulatória no Brasil, ninguém vai investir aqui no Brasil.
O deputado também já fez críticas à qualidade das armas da Taurus. Como o senhor vê essas declarações?
A ideia das pessoas é livre. Eu não tenho absolutamente nenhum problema de relacionamento com o Eduardo, eu conheço o Eduardo há muitos anos, muito antes de eu estar aqui na Taurus.
Respeito-o bastante, é um deputado que teve uma votação expressiva em São Paulo. É um deputado que a gente respeita. Eu respeito particularmente.
Agora, ele tem a ideia dele e tem todo o direito de ter a ideia dele.
E como o senhor vê a percepção de agentes de segurança, policiais, que já fizeram críticas à qualidade das armas da Taurus?
Hoje a Taurus recuperou a imagem dela, recuperou a credibilidade. A Taurus passou por um tropeço muito grande, e nós reconduzimos a Taurus para o local de onde ela nunca deveria ter saído.
Nós somos uma empresa de 80 anos e a quarta marca mais vendida no maior mercado de armas do mundo, que é o americano. E o cidadão americano, no segmento de armas e munições, é um consumidor extremamente exigente.
O aumento de participação de outras empresas no mercado poderia aumentar a qualidade das armas?
Uma coisa não tem nada a ver com a outra. A Taurus passou por todo um processo de reestruturação. A primeira coisa que fizemos nessa atual gestão foi estabelecer processos de produção robustos, de qualidade e de logística, para garantir a integridade dos nossos produtos.
A qualidade, integridade e confiabilidade do nosso produto não têm nada a ver com abertura de mercado.
O governo falou recentemente sobre a possibilidade de aumentar os impostos sobre produtos que têm uma tributação até mais pesada do que as armas, como tabaco e álcool. Neste cenário, o senhor vê uma perspectiva de que os impostos sobre armas diminuam?
Isso seria muito bem-vindo. Não posso responder por uma ação de governo, mas isso seria muito bem-vindo pela população. Porque a população sabe que, quando compra uma arma, dois terços [do preço] são impostos.
Seria uma ação para a segurança pública, para a segurança das pessoas que hoje não têm acesso por conta de custo.
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