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Sindicato: Para Caixa pagar R$ 600 sem fila, outros bancos tinham de ajudar

Sérgio Takemoto, presidente da Fenae - Divulgação
Sérgio Takemoto, presidente da Fenae Imagem: Divulgação

Ricardo Marchesan

Do UOL, em São Paulo

19/05/2020 04h00

A Caixa começou a pagar a segunda parcela do auxílio emergencial de R$ 600 nesta semana. Durante o saque da primeira parte do benefício, diversas agências registraram grandes filas e aglomerações, algo que contraria as orientações médicas durante a pandemia de coronavírus.

A Caixa afirma que fez mudanças para reduzir os problemas, como o aumento de número de funcionários e do horário de atendimento. Para Sérgio Takemoto, presidente da Fenae (Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal), isso não é suficiente.

A entidade defende que outros bancos também participem da operação de pagamento, além de outras medidas, como a contratação de mais funcionários.

Em nota ao UOL, a Caixa não comentou a proposta de descentralização dos pagamentos, mas disse que está contratando mais 296 empregados, além de adotar medidas de segurança nas agências para proteger funcionários e clientes, e que faz campanhas de informação sobre o pagamento do auxílio.

Confira a seguir os principais trechos da entrevista que Sérgio Takemoto concedeu ao UOL.

UOL - Como a Fenae avalia a operação de pagamento do auxílio emergencial pela Caixa até agora?
Sergio Takemoto - Em primeiro lugar, é importante ressaltar que o auxílio é uma ajuda necessária e importante para a população brasileira. Porque é um país tão desigual, tão carente de políticas públicas, que esse valor é importantíssimo, representa a sobrevivência das pessoas.

Desde que foi lançado esse programa, nós ficamos muito preocupados ao saber que somente a Caixa iria operacionalizar o pagamento.

Primeiro, porque a gente avaliava desde o início que teria um grande contingente de pessoas que seria atingido por esse auxílio. E avaliávamos que não seria possível somente a Caixa ser responsável por fazer todo esse atendimento.

Desde o início, as entidades sindicais solicitaram descentralização dos pagamentos, que não ficasse somente sob responsabilidade da Caixa.

Pedimos que seja feito um atendimento decente, que a população merece, e para que os empregados não corram riscos.

Essa descentralização incluiria também os bancos privados??
Sem dúvida nenhuma a gente queria que todos os bancos fizessem o pagamento. Bancos públicos e bancos privados.

É uma obrigação dos bancos. Os bancos são uma concessão pública. Eles têm que prestar o serviço à população neste momento de calamidade que se encontra o país e com a necessidade de fazer o atendimento à população brasileira.

Praticamente metade da população brasileira se inscreveu para receber esse crédito, e já houve um pagamento para 50 milhões de pessoas. Há necessidade de outros órgãos, além da Caixa, para fazer esse pagamento, para que possa dar conta e sem gerar esse tumulto.

Um dos argumentos para que a Caixa centralize esse pagamento é que ela tem experiência no pagamento de outros benefícios sociais.
Sem dúvida, a Caixa tem expertise. A Caixa fez o pagamento do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) lá em 2016, 2017, de 25 milhões de contas e sem gerar nenhum atropelo.

Só que dessa vez a gente estava falando de um número de 100 milhões de pessoas que se inscreveram para receber. A Caixa poderia e deveria estar à frente desse pagamento. A Caixa tem o Cadastro Único, tem o pagamento do Bolsa Família. Só do Bolsa Família, são 19 milhões de famílias, que são atendidas todos os meses.

Mas esse governo desconhece o país, porque estamos falando de 20 milhões de invisíveis, que o governo reconhece que existem. São 20 milhões que não têm conta em banco, que não têm cadastro em lugar nenhum. Todo esse contingente, todo esse número de pessoas se dirigiu à Caixa. Então é impossível somente uma instituição, mesmo sendo a Caixa, dar conta desse volume.

O próprio presidente da Caixa recentemente reconheceu que eram inevitáveis as filas. Ou seja, já se sabia que teria esse tumulto e nenhuma providência foi tomada para minimizar isso.

Foi uma grande irresponsabilidade do governo e da direção da Caixa de não buscar alternativas para dar um bom atendimento à população e dar condições de segurança para os funcionários.

Avalia que essas filas seriam evitáveis apenas com a descentralização ou outras medidas seriam necessárias?
Precisariam tomar outras medidas. Por exemplo, nós também reivindicamos que houvesse uma campanha de esclarecimento muito forte. Que se usasse a mídia para esclarecer quem tem direito, onde recorrer caso houvesse problemas. Porque assim não precisariam ir às agências da Caixa. 60% a 70% das pessoas foram nas agências para tirar dúvidas.

A Caixa é responsável pelos pagamentos, não pela análise dos dados, que é feita pela Dataprev. Então não adiantava as pessoas irem às agências da Caixa para querer saber por que não foi liberado o pagamento, por que estava ainda em análise. Tudo isso é de responsabilidade da Dataprev. O que faltou foi uma campanha de esclarecimento.

Também faltou o envolvimento de outros órgãos governamentais, porque não havia ninguém para auxiliar na organização dessas filas, não permitir que houvesse aglomeração, as pessoas próximas umas das outra, contrariando as orientações da OMS (Organização Mundial da Saúde). Então faltou planejamento.

Por isso que dizemos: ou foi muita incompetência ou foi má-fé dos órgãos governamentais para que isso ocorresse.

A Caixa tomou algumas medidas para diminuir as filas, como aumento do número de funcionários no atendimento, ampliação do horário de funcionamento e abertura de agências em alguns sábados e feriados. Isso resolve o saque da segunda e terceira parcelas?
Isso não resolve. Isso está levando os empregados ao esgotamento, porque eles entram às 7 horas da manhã e não têm horário para sair.

Imagine todos os dias trabalhar sob essa tensão, de ter que atender um público enorme e ainda estar sujeito a ser contaminado, a pegar uma doença. Os funcionários da Caixa não são empregados do setor de saúde, não foram treinados para evitar uma contaminação.

Há um grande acréscimo de empregados adoecidos, com covid-19. Nós já tivemos três mortes. Tudo isso gera um estresse muito grande no empregado.

A Caixa tomou medidas adequadas para proteger seus funcionários de contaminação?
Sim. Desde que a OMS decretou a pandemia, o movimento sindical, e a Fenae junto, vêm negociando com a Caixa e com todos os bancos.

Desde o início, nós negociamos uma série de medidas de proteção para os empregados da Caixa, como equipamento de proteção individual, máscaras, álcool em gel e proteção em acrílico nos guichês, aquelas máscaras de polietileno. Isso foi negociado.

A Caixa comprou um número muito grande de máscaras, porque tudo isso foi negociado junto com o movimento sindical e com o movimento associativo dos empregados da Caixa.

O presidente da Caixa, Pedro Guimarães, falou que, por causa do grande número de pessoas que têm direito ao auxílio, não há como eliminar as filas, apenas diminuir as aglomerações. Concorda?
Estamos muito preocupados, porque, além dessa segunda parcela, o próprio governo admite que tem mais 20 milhões na fila, 20 milhões de pessoas que estão com o seu cadastro ou inconcluso, ou em análise. Fora isso tem mais 3,5 milhões de pessoas que não foram receber seu benefício ainda.

Ou seja, há um contingente muito grande. E a Caixa não parou de fazer o seu serviço, que é o pagamento de seguro-desemprego, fundo de garantia, que aumentou muito com o número de demissões nesse período.

Foi correta a opção da Caixa pela prioridade do online para evitar a aglomeração nas agências?
A gente entende que a maior parte da população, uma grande parte, consegue fazer, tem familiaridade com esse tipo de aparelho, com esse tipo de tecnologia. Tanto que 30 e poucos milhões de pagamentos já foram efetuados por pessoas que se cadastraram pelo aplicativo.

Mas a gente também tem um contingente, estimado em 7 milhões de pessoas, que não têm acesso. Por isso que, como não houve uma resposta por parte da Caixa, nem do governo, aos nossos pedidos, nós mandamos uma carta para o consórcio do Nordeste para que todos os governadores do Nordeste adotassem medidas para ajudar nas filas e também colocassem todos os órgãos governamentais à disposição da população que não têm acesso à internet e que não tem familiaridade com essas tecnologias.

Há várias iniciativas de algumas prefeituras isoladas para ajudar a população.

É evidente que teria que utilizar a internet, todos os aplicativos, toda essa nova tecnologia, mas também tinha que pensar nessa população que não está familiarizada ou que não tem acesso à internet.

O governo atrasou a divulgação do calendário de pagamento das próximas parcelas do auxílio. Essa demora na divulgação também prejudica o atendimento?
Com certeza, porque está todo mundo precisando desse recurso. Elas recebem a informação de que o dinheiro vai estar disponível numa data e vão lá. Quando você joga uma informação, e depois desmente, não é todo mundo que vai saber que foi cancelado.

Então o que acontece? As pessoas foram às agências. Chegando lá, o empregado da Caixa fala que não está disponível.

Vão querer saber por quê. Vão ficar bravos. Tudo isso gera tensão. O empregado da Caixa, além de estar sobrecarregado com o trabalho, ainda tem um desgaste mental enorme. Tudo isso agrava. Porque a pessoa quer receber. Para ela, a Caixa que não quer pagar, e o responsável é o empregado da Caixa.

Caixa afirma que adotou medidas de segurança

Em nota ao UOL, a Caixa afirma que vem adotando diversas medidas para melhorar a segurança de clientes, funcionários e parceiros durante a pandemia, para "atender com mais qualidade a população e garantir que o auxílio chegue a quem realmente precisa, nessa que é a maior ação de pagamentos à população e bancarização da história do país".

Entre as medidas adotadas, cita que as agências estão funcionando para atendimento presencial em seu interior apenas de serviços essenciais, "com fluxo de pessoas no interior limitado e higienização ampliada e frequente", com espaçamento no atendimento aos clientes, e que os empregados em grupos de risco estão afastados, em trabalho remoto.

Também afirma que comprou equipamentos de proteção para os trabalhadores, como óculos, máscaras e luvas, e colocou álcool em gel nas unidades.

O banco afirma que está contratando mais funcionários, convocando mais 296 aprovados no concurso de 2014, para reforçar os atendimentos nas agências, principalmente no Norte e Nordeste. "Após a realização de exames médicos e da apresentação de documentos, a expectativa é de que os convocados iniciem os trabalhos já nos próximos dias", afirma.

A Caixa diz que também está fazendo campanhas de informação com orientações aos funcionários, com materiais como "FAQs (perguntas frequentes), cartilhas e hotsite exclusivo para prestar esclarecimentos aos empregados".

Também afirma que está informando a população mantendo "atualizadas todas as informações sobre o pagamento do auxílio emergencial em sua página na internet www.caixa.gov.br e perfis de redes sociais, dá ampla divulgação aos cronogramas e calendários de pagamento também por meio de publicidade, divulgação de informes e banners em suas agências e correspondentes lotéricos, com distribuição de material impresso e utilização de carros de som".

Além disso, diz que divulga informes para a imprensa sobre todas as etapas do pagamento do auxílio e dá publicidade aos números, mantém à disposição dos jornalistas e público em geral diversas matérias e publicações em vídeo e áudio em seu site Caixa Notícias e realiza coletivas de imprensa em seu perfil do Youtube para esclarecer dúvidas dos jornalistas.