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Governo não pode proibir demissão de não vacinados, dizem especialistas

Rafael Neves

Do UOL, em Brasília

01/11/2021 20h25Atualizada em 03/11/2021 13h31

Publicada hoje em edição extra do Diário Oficial da União, a portaria do governo que proíbe a demissão de funcionários por falta de vacinação não tem sustentação legal, segundo especialistas em direito do trabalho ouvidos pelo UOL.

Para os advogados, o governo tentou equiparar a demissão de não vacinados a outros tipos de discriminação já proibidos por lei, mas a inclusão dessa categoria só poderia ser feita por meio de uma nova mudança na legislação. Ou seja, uma portaria ministerial não teria poder para determinar a proibição.

"A meu ver, a portaria ministerial é inconstitucional, seja por invadir temática reservada à competência de lei federal, seja porque viola frontalmente o poder diretivo das empresas, seja porque estimula o descumprimento à vacinação", opina o advogado Ricardo Calcini, especialista em direito do trabalho.

Assinada pelo ministro do Trabalho e Previdência, Onyx Lorenzoni, a portaria é baseada em uma lei de 1995 que proíbe, por parte das empresas, a exigência de atestados de gravidez ou esterilização para fins de demissão ou contratação. De acordo com os especialistas, seria preciso mudar a lei para colocar a vacinação entre estas categorias.

Segundo a portaria, as empresas que usarem a vacinação como critério para uma demissão terão que pagar indenização por danos morais e escolher entre duas opções: reintegrar o funcionário, pagando o salário equivalente ao período em que ficou afastado, ou manter a demissão e pagar em dobro o salário.

Ambas estas possibilidades estão previstas na lei de 1995 que trata da exigência de atestados de gravidez ou esterilização. Sem passar pelo Congresso, portanto, o governo quer aplicar o mesmo entendimento à exigência de vacinação, apesar de não haver previsão em lei.

"Uma portaria não pode restringir a aplicação de justa causa para um trabalhador que se recusa a se vacinar. E muito menos tem a possibilidade de determinar reintegração ao emprego ou o pagamento dos salários em dobro", critica o advogado Nasser Ahmad Allan, mestre e doutor pela UFPR (Universidade Federal do Paraná) e especialista em direito do trabalho.

O governo fundamenta a portaria no fato de que a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) prevê uma série de possíveis demissões por justa causa, que vão desde embriaguez até improbidade, mas falta de imunização não está entre elas. O UOL pediu esclarecimentos ao Ministério do Trabalho e Previdência, mas não teve resposta até a publicação da reportagem.

Em vídeo publicado no Twitter pouco antes da publicação da norma, o ministro Onyx Lorenzoni afirmou que a vacinação é uma questão de "livre arbítrio e foro íntimo de cada pessoa".

Controvérsia

Em entrevista a UOL em setembro, a presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), ministra Maria Cristina Peduzzi, defendeu a possibilidade de demissão por falta do comprovante de imunização. Segundo a ministra, funcionários que não tomam a vacina podem comprometer o bem coletivo no trabalho e, assim, poderiam ser demitidos, inclusive com justa causa. Até o momento, contudo, o TST ainda não firmou posicionamento sobre o assunto.

Especialistas em saúde reforçam a necessidade de que as pessoas estejam vacinadas para diminuir a possibilidade de contrair o vírus e, consequentemente, transmiti-lo. Sem a imunização, a pessoa fica mais suscetível a contrair o novo coronavírus, além de ter o risco de desenvolver a forma grave da covid-19.

Apesar de não ver legalidade na portaria do governo, o advogado Nasser Allan considera que as empresas não devem, em regra, demitir ou deixar de contratar por este motivo. "Só em situações absolutamente pontuais e excepcionais se justificaria uma demissão por justa causa para quem se recusa a tomar vacina", opina.

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Errata: este conteúdo foi atualizado
Na data da publicação da matéria, o UOL informou que o posicionamento do TST (Tribunal Superior do Trabalho) é favorável à possibilidade de demissão por falta de vacinação. O tribunal, porém, não tem posicionamento consolidado a respeito. O texto foi alterado.