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Empresários citam bônus a funcionário que votar em Bolsonaro; isso é legal?

Pedro Leite Knoth

Colaboração para o UOL, em São Paulo

19/08/2022 13h26

O empresário José Koury, proprietário do shopping Barra World, cogitou oferecer um bônus a funcionários que votassem em Jair Bolsonaro nas eleições deste ano. Em mensagens de WhatsApp reveladas pelo Metrópoles, Koury explica que acha a medida uma "ótima ideia", mas que não sabia se remunerar funcionários por meio do voto era ilegal ou não. "Alguém aqui no grupo deu uma ótima ideia, mas temos que ver se não é proibido. Dar um bônus em dinheiro ou um prêmio legal pra todos os funcionários das nossas empresas", escreveu.

Koury faz parte de um grupo de WhatsApp de empresários que apoiam a reeleição de Jair Bolsonaro. Além de falar sobre o bônus para funcionários que votassem no presidente, o grupo fez ataques e proferiu ofensas ao STF (Supremo Tribunal Federa)l, ao TSE (Superior Tribunal Eleitoral), às urnas e incitou golpes antidemocráticos caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fosse eleito.

Dentro do grupo também se encontram proprietários de outras grandes empresas: Luciano Hang, das Lojas Havan, Afrânio Barreira, dono do Grupo Coco Bambu, José Isaac Peres, dono da rede de shoppings Multiplan, Ivan Wrobel, dono da W3 Engenharia, e Marco Aurélio Raymundo, o Morongo, dono da marca de roupas de surf Mormaii, entre outros.

Pagar bônus a funcionários por voto fere a lei eleitoral? O advogado especialista em Direito Eleitoral Fernando Neisser, membro da Abradep (Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político), afirma que a conduta do empresário, caso se concretize, fere a lei eleitoral porque é um pagamento de valor pelo voto em um determinado candidato.

Prometer o pagamento de qualquer bem, como um 13º ou até um 16º salário, como fez um fazendeiro no Tocantins caso Bolsonaro vença, é um crime que fere o Código Eleitoral e pode ser punido com 1 a 4 anos de prisão.

O empresário pode ser processado? Koury não pode ser processado sem evidências de que a compra de votos não passou de uma ideia dentro do grupo de WhatsApp em que a conversa aconteceu.

"O mero fato de discutir condutas ilegais, por si só, não é crime eleitoral", explica Fernando Neisser. "Claro que, com um elemento como esses [as mensagens de WhatsApp], me parece o suficiente para abrir uma investigação para entender se isso estava em prática ou se está limitado apenas à conversa".

Quem poderia investigar a compra de votos? Caso o empresário bolsonarista fosse indiciado por violar a lei eleitoral, quem conduziria a investigação seria o Ministério Público Eleitoral da zona de votação onde ocorreu a compra de votos.

Mas e o candidato que foi favorecido pela compra de votos? Se o candidato beneficiado concordar ou tomar conhecimento da compra de votos e não acionar a Justiça Eleitoral, ele pode ter a candidatura ou o mandato cassados pelo TSE, além de receber uma multa de R$ 50 mil.

Quando uma pessoa compra votos em favor de algum político, dois processos correm em paralelo: um na esfera criminal e outro na Justiça Eleitoral. No segundo caso, a investigação deve descobrir se o candidato sabia, autorizou ou consentiu com o crime, e um inquérito poderia ser conduzido pela PGR (Procuradoria-Geral da República) a pedido de um partido, coligação ou outro candidato, explica Neisser.

E do ponto de vista do trabalho? Uma empresa que bonifica ou premia funcionários que votam em um candidato está sujeita a processos dos empregados por danos morais coletivos, punições por parte de Sindicatos e investigação do MPT (Ministério Público do Trabalho), observa a advogada trabalhista Fernanda Garcez, da Abe Advogados.

Garcez elenca que a empresa ou empresário estaria ferindo o princípio da isonomia ao privilegiar apenas uma parcela de seus funcionários de forma seletiva. "Não apenas isso, mas a empresa estaria ferindo princípios constitucionais de cada cidadão, como direito ao voto secreto e à liberdade política. É um risco para a própria democracia", pontua a advogada.

A Justiça do Trabalho pode agir? Como no caso das transgressões à Lei Eleitoral, o MPT poderia abrir uma investigação sobre o caso. Após essa etapa de coleta de provas, caso ficasse comprovado que a empresa comprou votos, o órgão poderia pedir um TAC (Termo de Ajustamento de Conduta), ou ingressar com uma Ação Civil Pública contra a empresa.

Por fim, caso condenada, a empresa poderia pagar uma multa por danos morais. Ela pode variar de acordo com o tamanho da empresa e dos danos sofridos. No caso de grandes empresas, cita Fernanda Garcez, o MPT costuma impor uma multa proporcional ao tamanho do infrator.

"Por outro lado, diante da liberdade de expressão, esse tipo de fato deve ser sempre muito bem analisado antes de qualquer providência contundente contra a empresa", diz Luis Henrique Borrozzino, advogado do trabalho e membro das Comissões de Direito do Trabalho da OAB/SP. "Afinal de contas, o cenário político vive em intensa turbulência e qualquer tipo de fala ou bandeira levantada é objeto de críticas e severas acusações, muitas vezes, sem fundamento."

Já houve punição em casos semelhantes? Em maio deste ano, a empresa Havan foi condenada a indenizar em R$ 30 mil uma mulher que trabalhava na varejista em 2018 e se sentiu coagida a votar conforme as preferências do dono da companhia, Luciano Hang.

Segundo a decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, as pressões de Hang se enquadram em "utilização do poder diretivo do dono" da Havan para "induzir seus empregados a votarem em seu candidato", Bolsonaro. Ao UOL, a companhia disse que entrará com "o recurso devido ao TST (Tribunal Superior do Trabalho)".

Em 2018, o empresário publicou ao menos dois vídeos afirmando que, caso Bolsonaro fosse derrotado no pleito de 2018, as lojas da Havan corriam risco de fechar e deixar milhares de pessoas sem emprego.