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Com Lula, o que esperar para Auxílio Brasil, salário mínimo e gasolina?

Perspectivas para 2023 apontam para inflação global em alta e pouco espaço no Orçamento, segundo economistas - Isaac Fontana/CJPress/Estadão Conteúdo
Perspectivas para 2023 apontam para inflação global em alta e pouco espaço no Orçamento, segundo economistas Imagem: Isaac Fontana/CJPress/Estadão Conteúdo

Do UOL, em Brasília e em São Paulo

31/10/2022 04h00Atualizada em 31/10/2022 12h00

O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) prometeu muitas melhorias na economia, mas deve enfrentar um cenário desfavorável, dizem especialistas ouvidos pelo UOL. As perspectivas para o próximo ano apontam para inflação global em alta e pouco espaço no Orçamento para investir em políticas públicas que estimulem a criação de empregos e o aumento da renda das famílias.

Durante a campanha, Lula se comprometeu a manter o valor de R$ 600 do Auxílio Brasil e a promover outras ações de transferência de renda que foram reduzidas ao longo da gestão de Jair Bolsonaro (PL). Também falou em retomar a política de valorização do salário mínimo. O problema, dizem os economistas, é o quanto essas promessas vão custar e os desafios que vão gerar em termos orçamentários.

Segundo Maílson da Nóbrega, economista e ministro da Fazenda durante o governo de José Sarney (1985-1990), não há espaço no Orçamento, e insistir nos compromissos pode agravar o "já delicado" quadro fiscal do Brasil.

Marcelo Paixão, professor associado de Desigualdades Sociais e Raciais e Afroempreendedorismo da Universidade do Texas, nos Estados Unidos, diz que o Brasil não vai ficar de fora do impacto da inflação internacional, com efeitos da guerra na Ucrânia e dos preços globais de combustíveis.

Renan Pieri, professor de economia da FGV-SP (Fundação Getúlio Vargas), destaca que o programa de governo de Lula, assim como o de Bolsonaro, não detalhava seus planos econômicos "para a gente diferenciar os impactos da eleição de cada um".

Veja a seguir uma análise dos principais pontos da economia para o próximo ano:

Pobreza: Os economistas ouvidos pelo UOL afirmam que o combate à pobreza, que aumentou na pandemia, será prioridade do governo Lula. Grande parte do investimento deve ser feito em programas de transferência de renda, como o Auxílio Brasil, que vai voltar a se chamar Bolsa Família.

O desafio, diz Pieri, é "criar políticas públicas para além de transferência de renda, especialmente aquelas com foco em educação, para que as pessoas saiam da armadilha da pobreza estrutural, que passa pelas gerações e limita o potencial de ganho econômico das famílias".

Auxílios: Ao longo da campanha, Lula prometeu manter o Auxílio Brasil em R$ 600 e pagar mais R$ 150 por criança de até seis anos. A proposta é redesenhar o programa, que voltaria a se chamar Bolsa Família.

Para especialistas, Lula deve manter a rede de cobertura, sem mexer tanto no número de beneficiários, mas sim em quem está sendo beneficiado. O valor mais alto, porém, é um "desafio orçamentário", segundo Paixão.

Inflação: Para os economistas, pode haver uma aceleração na alta dos preços no início do novo governo. Essa inflação seria puxada pelo fim do teto do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) que incide sobre combustíveis e energia, medida adotada em junho e válida até dezembro, para conter a escalada dos preços.

Paixão afirma que uma mudança na política de preços da Petrobras, hoje atrelada ao mercado internacional, "pode fazer os combustíveis ficarem mais baratos no curto prazo e, por consequência, reduzir a inflação".

Petrobras: A expectativa é de que a política de preços da Petrobras seja "abrasileirada" — isto é, deixe de ser atrelada às variações do petróleo no mercado internacional e à cotação do dólar.

Mas os especialistas dizem que a mudança pode resultar em queda no lucro e, consequentemente, uma distribuição menor de dividendos para os acionistas, o que impactaria nas ações da Petrobras na Bolsa.

"Acho que é uma maluquice", diz Maílson da Nóbrega.

Lula também é contra a privatização da empresa e, por isso, deve fazer uma revisão no plano de venda das refinarias e subsidiárias. A medida foi apontada em seu programa de governo.

Privatizações: Além de ser contra a privatização da Petrobras, Lula prometeu reverter a venda da Eletrobras. A reestatização é possível, mas é uma operação delicada que pode afetar o mercado, como disseram especialistas ouvidos pelo UOL em junho.

Ainda assim, Lula deve ter um olhar favorável às concessões, afirma Paixão: "É um modelo que tem a participação do setor privado por um tempo e ajuda a manter a taxa de investimentos mais alta".

Combustíveis: Com o fim do teto do ICMS em dezembro, o preço dos combustíveis —já defasado— pode voltar a subir no início do governo Lula. Os economistas dizem que não há espaço no Orçamento para manter o imposto em patamar mais baixo. Além disso, é provável que a medida não tenha o mesmo apoio do Congresso, já que os estados dependem muito da receita que arrecadam com o ICMS.

Mudar a política de preços da Petrobras pode fazer o preço dos combustíveis cair no curto prazo, mas pode gerar "problemas de caixa" no médio e no longo prazo, diz Pieri, da FGV.

Salário mínimo: A promessa é de que o salário mínimo volte a ter aumento real, isto é, acima da inflação. O senador eleito Wellington Dias, um dos coordenadores da campanha de Lula, disse que a nova regra de correção deve considerar o crescimento médio do PIB (Produto Interno Bruto) dos cinco anos anteriores, podendo chegar a 2% em 2023.

Os analistas dizem que não está claro de onde sairá o dinheiro para bancar esse aumento, exceto pelo fim da regra do teto de gastos.

Aposentadorias: Lula prometeu recriar o Ministério da Previdência e reajustar o salário mínimo acima da inflação, o que impacta diretamente nas aposentadorias e pensões. Assim, os economistas dizem que o tema depende da política definida para a nova regra fiscal e para o salário mínimo, que afeta os valores e pressiona o Orçamento.

Empregos: Espera-se que as políticas do governo Lula sejam focadas no emprego formal. Em paralelo, os economistas afirmam que a taxa de desemprego pode ser reduzida por meio de outras ações indiretas, como o controle das contas públicas e da inflação, que farão com que o país volte a crescer como um todo.

Funcionários públicos: Especialistas dizem que não haverá mudanças nas regras de remuneração do funcionalismo público ou na quantidade de vagas ofertadas, apesar de eventuais pressões da categoria. Na campanha, Lula prometeu "recomposição gradual" dos salários dos servidores públicos, atrelada ao crescimento da economia a partir de 2023.

Teto de gastos: Lula defende o fim do teto de gastos e, ao longo da campanha, foi muito cobrado a apresentar detalhes sobre a regra fiscal que vai substituí-lo. Até agora não se sabe o que o governo eleito deve fazer, mas é consenso entre os economistas que o modelo atual é inviável.

"[Lula] vai ser obrigado a recriar a âncora fiscal que foi destruída pelas seguidas violações do teto de gastos pelo governo Bolsonaro. É um dos grandes desafios do período. O novo presidente tem que ter consciência do tamanho do pepino que ele tem para resolver no ano que vem", diz Maílson da Nóbrega.

Banco Central: Por ter autonomia, ao menos em tese, o Banco Central não deve sofrer influência do governo na política monetária.

Na campanha, no entanto, Lula disse que o BC deveria estabelecer metas de crescimento econômico e de geração de emprego, além de atuar no controle da inflação. A proposta foi criticada por ex-integrantes do BC na época e pelo presidente da instituição, Roberto Campos Neto.

Juros: O desafio, segundo especialistas, será reduzir os juros básicos da economia (Selic), hoje em 13,75% ao ano, a níveis pré-pandemia.

Economistas afirmam que será necessário um conjunto de ações para que os juros caiam. Além do controle da inflação, será importante adotar uma nova regra fiscal que diminua o tamanho da dívida, permitindo ao BC reduzir a Selic gradualmente. A campanha de Lula não adiantou detalhes sobre esses tópicos.

Dólar e Bolsa. É impossível prever como o mercado financeiro se comportará. Mas é consenso entre especialistas que a cotação do dólar e o desempenho da B3, a Bolsa de Valores brasileira, estará relacionado à capacidade de o presidente eleito resolver ou ao menos minimizar os problemas que vai herdar.

Adotar medidas "irresponsáveis", diz Maílson da Nóbrega, pode levar a insegurança jurídica e queda da confiança, fazendo com que investidores deixem o Brasil. Essa fuga de capitais pressionaria o câmbio, fazendo o dólar disparar, o que também teria impacto na inflação.