Americanas: Quem pode ser punido e quais as frentes de investigação?
Há diversas investigações para apurar o rombo bilionário nas Americanas. A empresa entrou em recuperação judicial com dívida de R$ 43 bilhões, após admitir R$ 20 bilhões em "inconsistências contábeis". Credores acionaram a Justiça para tentar responsabilizar inclusive os acionistas bilionários da empresa. Entenda quem pode ser punido.
Quais investigações estão sendo feitas?
CVM
A Comissão de Valores Mobiliários criou uma força-tarefa para o caso Americanas, com oito processos em andamento. As investigações ocorrem em cooperação com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal. A autarquia mantém um canal para receber denúncias em seu site.
Os processos apuram, entre outros pontos:
- eventuais irregularidades em informações contábeis;
- possíveis irregularidades na divulgação de notícias, fatos relevantes e comunicados da empresa;
- se houve o crime de insider trading, que é quando há a negociação de ações da companhia por quem tem informações privilegiadas.
Ministério Público Federal
O MPF-SP também apura se houve uso de informações privilegiadas. Diretores da empresa venderam mais de R$ 210 milhões em ações da varejista no segundo semestre de 2022, depois que a companhia anunciou a troca de seu presidente.
Minoritários e credores
- Entidades que representam acionistas minoritários buscaram a Justiça e a B3 (Bolsa) para pedir indenizações da empresa e dos acionistas de referência, os bilionários Jorge Paulo Lemann, Carlos Alberto Sicupira e Marcel Telles, donos da gestora 3G Capital.
- Grandes bancos querem obrigar o trio de acionistas a ressarci-los com seu patrimônio pessoal. Para isso, buscam meios para provar que houve fraude na varejista.
- O Bradesco foi à Justiça para pedir o armazenamento de e-mails de diretores, membros do conselho de administração e funcionários da área de contabilidade da empresa. A Justiça aceitou o pedido.
Comitê independente
- As Americanas criaram um comitê interno para investigar o rombo em seus balanços. A composição do comitê foi alvo de críticas dos credores, que afirmam que os membros do comitê têm relacionamento próximo com a empresa.
- A empresa diz que o comitê tem o objetivo de apurar o caso "com absoluta autonomia e isenção", e que as acusações contra seus membros "são levianas e improcedentes".
Houve fraude? Quem pode ser punido?
As investigações ainda estão em curso e há muito a ser apurado. Um dos principais pontos a ser esclarecido é se o rombo foi causado por fraude deliberada ou por erro.
Se foi fraude, é preciso saber quem tinha conhecimento. Entenda quem pode ser responsabilizado:
Empresa
- Se forem constatadas condutas ilícitas ou em desacordo com as normas, a empresa pode ser obrigada a pagar indenização aos acionistas. Pode também ser punida pela CVM com multas e sanções.
- Procurada, a empresa não comentou. Anteriormente, as Americanas afirmaram ter criado um comitê independente "para apurar as circunstâncias que ocasionaram as inconsistências em lançamentos contábeis".
Auditorias
- Nos últimos cinco anos, as informações financeiras das Americanas foram auditadas pelas auditorias PwC (de 2019 a 2021) e KPMG (de 2017 a 2019), duas das mais respeitadas do mundo.
- O escândalo da varejista pode ter consequências para as auditorias, segundo especialistas. PwC e KPMG disseram que não comentam balanços auditados, por questões contratuais.
A auditoria está ali para pegar esse tipo de coisa, e por alguma razão isso não aconteceu.
Renata Oliveira, advogada do escritório Rayes & Fagundes
Executivos
Caso fique provada a fraude, as pessoas que atuavam na empresa, em especial aquelas que lidavam com as finanças da varejista, podem vir a ser responsabilizadas.
Isso pode ocorrer no âmbito administrativo, com impedimento de atuar em outras empresas de capital aberto; no âmbitos civil, com pagamento de indenização; e também no âmbito criminal, com prisão.
Nesse caso, dentre os crimes que podem ser considerados estão:
- Insider trading: Negociar ações usando informação privilegiada. A pena é de um a oito anos de reclusão e multa.
- Colarinho branco: Conjunto de crimes que incluem "induzir ou manter em erro sócio, investidor ou órgão público em relação à operação ou situação financeira da empresa". A pena é de dois a seis anos de reclusão e multa.
A possibilidade de uma pessoa ser presa é considerada remota por analistas.
Quem comandava a empresa?
Nos últimos anos, a varejista esteve sob o comando de quatro executivos. O principal deles é Miguel Gutierrez. Ele trabalhou nas Americanas durante 30 anos, dos quais passou 20 como CEO.
Deixou o posto no fim de 2022 para dar lugar a Sergio Rial, que ficou menos de dez dias no cargo e trouxe à tona o rombo bilionário. Os outros três principais executivos continuam na empresa.
Acionistas bilionários
Os bilionários acionistas de referência da empresa foram duramente criticados por credores, que buscam responsabilizá-los pelo rombo. Grandes bancos como Santander e Bradesco querem obrigar o trio a ressarci-los com seu patrimônio pessoal.
No entanto, essa não é uma tarefa simples. Será preciso provar que os acionistas tinham conhecimento do que ocorria nos balanços da empresa.
Pela lei, a responsabilidade dos acionistas de uma empresa é restrita ao valor das suas ações, o que protege seu patrimônio pessoal.
O acionista responde com o capital dele. Se as ações vão a zero, ele perde dinheiro, mas não passa disso. A lei das S.A. protege o cotista.
Douglas Duek, CEO da Quist Investimentos, empresa especializada em recuperação judicial
Qual a atuação dos acionistas bilionários na empresa?
Os três são donos das Americanas há 40 anos. No ano passado, eles abriram mão do controle da empresa em uma reorganização societária, mas continuaram como acionistas de referência, ou seja, com poder para influenciar a gestão da companhia.
Carlos Alberto Sicupira integra o conselho de administração e foi o presidente do conselho durante anos. Paulo Alberto Lemann, filho de Jorge Paulo Lemann, também integra o conselho. As investigações em curso também vão analisar a responsabilidade do conselho de administração no caso.
Em nota, os três acionistas dizem não ter conhecimento de manobras contábeis na companhia.
Jamais tivemos conhecimento e nunca admitiríamos quaisquer manobras ou dissimulações contábeis na companhia. Nossa atuação sempre foi pautada, ao longo de décadas, por rigor ético e legal.
Contávamos com uma das maiores e mais conceituadas empresas de auditoria independente do mundo, a PwC. Ela, por sua vez, fez uso regular de cartas de circularização, utilizadas para confirmar as informações contábeis das Americanas com fontes externas, incluindo os bancos que mantinham operações com a empresa. Nem essas instituições financeiras nem a PwC jamais denunciaram qualquer irregularidade.
Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, em nota
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