Governo abrirá mão de R$ 641 bi em impostos no ano; veja maiores renúncias
O governo vai abrir mão de arrecadar R$ 641 bilhões em impostos em 2023, segundo levantamento da Unafisco (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil) antecipado com exclusividade ao UOL.
Que dinheiro é esse?
As renúncias fiscais ou os chamados gastos tributários tiveram aumento de 22% de 2022 para 2023. Em 2022, o valor foi estimado em R$ 525 bilhões. Segundo a Unafisco, isso se deve principalmente à inflação. Mas há também o impacto de benefícios novos criados, como o Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos, com custo estimado de R$ 4 bilhões, e a Tributação Específica do Futebol, com custo de R$ 2 bilhões.
O valor bilionário inclui isenções e benefícios instituídos por diversas razões. As renúncias fiscais reduzem tanto os tributos pagos por empresas quanto por pessoas físicas, como o imposto de renda. Podem ter sido criadas para executar políticas públicas, para socorrer e fomentar setores da economia, ou por pressão de categorias e empresas. O estudo usa como base o Demonstrativo dos Gastos Tributários, elaborado anualmente pela Receita Federal, mas inclui também outras renúncias ou perdas de arrecadação potencial como, por exemplo, a isenção de lucros e dividendos, a ausência do Imposto sobre Grandes Fortunas e programas de parcelamentos especiais.
No ano, R$ 440 bilhões são considerados privilégios tributários. Ou seja, isenções concedidas sem a comprovação de que geram benefícios para a sociedade, como desenvolvimento econômico, aumento de renda ou redução da desigualdade, segundo o levantamento.
Os dez maiores privilégios somam R$ 333 bilhões. Os três maiores são a isenção de lucros e dividendos distribuídos por empresas, a ausência do Imposto sobre Grandes Fortunas e a Zona Franca de Manaus.
Dos R$ 641 bilhões, R$ 201 bilhões (31%) são gastos com alguma contrapartida social ou econômica para o país, na avaliação da Unafisco. Dentre eles estão as isenções relacionadas a Prouni, MEI (Microempreendedor Individual) e a dedução de despesas médicas ou com educação do imposto de renda.
As isenções relacionadas ao Simples Nacional entram parcialmente na conta de privilégios. O Simples deve ter um custo total de R$ 88 bilhões em 2023. A Unafisco considera que parte desse benefício tem contrapartida social (R$ 66,8 bilhões) e outra parte não (R$ 21,6 bilhões). A entidade entende que a isenção faz sentido quando contempla as micro e pequenas empresas, com faturamento até R$ 1,8 milhão, pois nesse caso contribui para a geração de empregos. O Simples inclui empresas com faturamento até R$ 4,8 milhões.
Governo ataca privilégios, mas cria novas isenções
O governo Lula tem buscado aumentar as receitas, com ataques à "caixa-preta das renúncias". A meta é dar conta de medidas como o aumento do salário mínimo e do Bolsa Família sem comprometer as contas públicas. Para isso, quer atacar o que considera privilégios tributários, em especial de grandes empresas. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, já afirmou que a "caixa-preta das renúncias fiscais precisa acabar".
Em 2021, a mineradora Vale obteve R$ 19 bilhões em isenções. Os dados estão em um compilado divulgado pela Receita Federal com detalhes sobre as empresas que se beneficiam de isenções fiscais. No mesmo ano, a Eletronorte teve R$ 1,2 bilhão em isenções e a Petrobras, R$ 1,1 bilhão.
O país tem mais de 260 mil entidades isentas ou imunes de imposto, entre igrejas, associações e sindicatos. A relação com todas essas organizações também foi divulgada pela Receita Federal, em um esforço de dar mais transparência ao tema dos benefícios fiscais. A isenção para entidades filantrópicas é considerada privilégio tributário pela Unafisco.
O governo também tem criado novas renúncias, como o pacote de incentivos para carros populares. Com foco em veículos com preço até R$ 120 mil, o pacote deve incluir redução em tributos como IPI e PIS/Cofins. O desenho final do programa ainda será apresentado. Para Mauro Silva, presidente da Unafisco, é importante que ele inclua contrapartidas claras à sociedade.
O governo também manteve em 2023 parte da desoneração dos combustíveis, criada na gestão Bolsonaro. Ao retomar a cobrança, o governo Lula determinou tributação de R$ 0,47 por litro de gasolina e R$ 0,02 por litro de etanol, tarifas menores do que as cobradas antes da isenção. As alíquotas valem até junho e pode haver aumento desses impostos em julho. O diesel e o gás de cozinha continuam isentos de imposto até o fim do ano.
Os benefícios tributários não são necessariamente ruins, mas precisam ter contrapartidas claras para a sociedade. Em boa parte dos benefícios, não há uma preocupação em dar transparência para suas justificativas. A falta de transparência faz os benefícios fiscais crescerem. E não tem almoço grátis. Se alguém não está pagando, tem outro alguém que paga por ele.
Mauro Silva, presidente da Unafisco
Quais são os maiores privilégios tributários
Isenção de lucros e dividendos distribuídos por pessoa jurídica: R$ 74,6 bilhões. Quem recebe lucros ou dividendos de uma empresa fica isento de pagar imposto sobre o valor recebido.
Não instituição do Imposto sobre Grandes Fortunas: R$ 73,4 bilhões. A Constituição prevê a criação desse imposto, por isso a Unafisco calcula quanto o país deixa de arrecadar por não instituí-lo.
Zona Franca de Manaus: R$ 54,6 bilhões. As empresas instaladas na Zona Franca de Manaus, no Amazonas, recebem uma série de benefícios fiscais, como a isenção do IPI.
Programas de parcelamentos especiais: R$ 37,3 bilhões. São programas como o Refis, que permitem o parcelamento e a renegociação das dívidas tributárias das empresas.
Agricultura e agroindústria - Desoneração da cesta básica: R$ 24,6 bilhões. Alguns alimentos pagam menos imposto por serem considerados itens de cesta básica. A Unafisco considera que esse é um privilégio tributário, exceto no caso dos contribuintes incluídos em programas sociais.
Simples Nacional: R$ 21,6 bilhões. Empresas que se enquadram no Simples Nacional pagam menos imposto. A avaliação da Unafisco é que esse benefício passa a ser um privilégio ao incluir empresas com faturamento acima de R$ 1,8 milhão por ano. O Simples inclui empresas com faturamento até R$ 4,8 milhões.
Entidades filantrópicas: R$ 14,1 bilhões. Entidades filantrópicas têm imunidade tributária no Brasil.
Títulos de crédito - Setor Imobiliário e do Agronegócio: R$ 13,9 bilhões. Existem instrumentos usados para investir no setor imobiliário e no agronegócio que são isentos de imposto, como a LCI (Letra de Crédito Imobiliário) e a LCA (Letra de Crédito do Agronegócio).
Exportação da Produção Rural: R$ 10 bilhões. A contribuição social não incide sobre receitas de exportações do setor rural.
Desoneração da folha de salários: R$ 9,3 bilhões. A desoneração da folha permite a empresas de determinados setores pagarem alíquotas de 1% a 4,5% de imposto sobre a receita bruta, em vez de 20% sobre a folha de salários. A lei beneficia os setores de calçados, call center, construção civil, fabricação de veículos, dentre outros.
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