Estudantes usam IA para ajudar a resolver problemas, do clima à educação
Um projeto de uma estudante brasileira usa a inteligência artificial para prever que áreas costeiras devem ser impactadas pelo aumento no nível do mar. Outro projeto ensina yoga para pessoas com deficiência, e um grupo de estudantes criou uma plataforma para ajudar escolas públicas na sua gestão financeira. Essas inovações de jovens universitários aliam a IA a impactos sociais e foram os vencedores do projeto AI4Good.
Nos dias 6 e 7 de abril, eles serão apresentados na Brazil Conference, em Cambridge, em Massachusetts, nos Estados Unidos. O evento anual é realizado pela comunidade brasileira em Harvard e no MIT (Massachusetts Institute of Technology). Conheça abaixo as iniciativas.
Entenda o projeto
A Brazil Conference, que está na sua 10ª edição, contará com mais de 90 palestrantes neste ano. Com o tema "O Encontro dos Vários Brasis", o evento deve receber um público de 1.200 pessoas. Autoridades, executivos, ativistas, pesquisadores e professores se reúnem para discutir questões relacionadas à política, justiça, economia, cultura, educação, saúde e mais.
Neste ano, acontecerá a primeira edição do projeto AI4Good. O intuito é incentivar universitários brasileiros usarem a inteligência artificial para potencializar impactos sociais no país. "Vimos nos últimos anos um crescimento exponencial em ferramentas de inteligência artificial, desde coisas como o ChatGPT até algoritmos de diagnóstico médico. Acreditamos que podemos usar isso para mudar o Brasil", explica Victor Dubeux, responsável pelo programa na Brazil Conference.
Ao todo, 400 participantes de todos os estados do país se inscreveram. Durante dois meses, a Brazil Conference ofereceu workshops gratuitos com cientistas da computação da Harvard e do MIT.
Depois dos workshops, os times tinham que apresentar projetos de impacto que utilizassem os ensinamentos dos workshops para mudar a saúde, educação ou o meio ambiente no Brasil. "Escolhemos projetos que demonstrassem grande conhecimento técnico, paixão pelo Brasil e viabilidade", diz Victor.
Auxílio da IA na remobilização de populações vulneráveis de zonas costeiras
A universitária Amanda Lins, de 21 anos, é uma das vencedoras. Ele criou um algoritmo que prevê os impactos das mudanças climáticas no aumento do nível do mar em cidades costeiras para ajudar o poder público a planejar soluções. Natural de Salvador (BA), ela é técnica de inteligência artificial pelo Cimatec, do Senai, e estuda Ciência de Dados e Inteligência Artificial na mesma instituição.
O objetivo do projeto vencedor é prever quais serão os impactos da elevação do nível do mar para algumas regiões em Salvador. Amanda utilizou uma rede neural através do Google Earth Engine e criou um algoritmo para classificar o uso e ocupação do solo nos locais que serão afetados. Por meio de dados do Nasadem (NASA Digital Elevation Model), foi possível fazer uma simulação do aumento do nível do oceano nos próximos anos. "Fiz uma simulação aumentando 50 milímetros [o nível do mar] até o ano de 2050, e através disso eu consegui rastrear quais eram as áreas que iam ser impactadas, que iam ser invadidas por esse oceano", diz.
Para as próximas etapas, ela pretende analisar a vulnerabilidade social das populações daquelas áreas e identificar para onde elas podem ser remobilizadas.
Aos 16 anos, ainda na escola, foi bolsista CNPq — na época, ela desenvolveu uma pesquisa sobre análise do risco de áreas de encosta em Salvador, em Bom Juá, bairro vizinho ao que ela vive. "Eu moro numa região periférica e esse bairro sofre muito com deslizamentos por conta da chuva. Cresci muito assistindo ali o entorno, os telejornais [mostrando a situação], e sempre ficava incomodada", diz. Ela ainda participou de outras atividades, focada em projetos que atuassem na linha de frente do impacto, principalmente o impacto sustentável e as tecnologias verdes.
Ela se inscreveu na primeira edição do AI4Good com um projeto que ela quer levar para o futuro. "A questão do racismo ambiental precisa ser debatida. A gente precisa focar nessas populações de baixa renda que vão sofrer pelas influências das mudanças climáticas e elas não têm a quem recorrer", diz.
Yoga para pessoas com deficiência
Amanda Arruda, de 20 anos, é de Recife (PE) e também foi uma das vencedoras. Ela estuda Ciência da Computação no Centro de Informática da UFPE e também atua lá construindo drones autônomos. Amanda idealizou o Shanti, um aplicativo que utiliza AI e a câmera do celular para ensinar yoga de forma gratuita e inteligente para pessoas com deficiência.
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Quero receber"Shanti significa paz. Eu pratico yoga, tenho uma doença autoimune e me ajudou muito no meu tratamento. Eu percebi também que para a minha avó, que lida com o Parkinson, a fisioterapia ajudou muito. Então quis investigar como era essa situação das pessoas com dificuldade de mobilidade, de deficiência, com o exercício físico, e percebi que muita gente não tinha acesso", diz.
O usuário se registra e informa seus dados como sintomas e problemas de saúde, incluindo uma deficiência ou dificuldade de mobilidade. A partir desses dados, a plataforma utiliza a IA para formular os exercícios mais adequados.
Segundo Amanda, a IA consegue aprender com os dados e criar exercícios ainda mais personalizados. Além disso, a a câmera do celular capta as imagens e o algoritmo identifica se os exercícios estão sendo feitos da forma correta — se não, são corrigidos.
A conferência trouxe mais visibilidade ao projeto, diz a estudante. Além disso, ela destaca a importância da representatividade feminina. "Muitas minorias ficam com mais receios porque a gente vive numa área bastante masculinizada, bastante elitizada. Eu entrei na computação por conta de mulheres que me incentivaram, amigas, referências que eu tenho. E, para mim, eu acho que é a oportunidade de também me colocar como alguém disposta a estender a mão para que as próximas venham".
IA na gestão de recursos escolares
O terceiro projeto vencedor é formado por um grupo de estudantes. Giovana Dovich, 23, Augusto Villar, 23, Yasmin Feitosa, 24, todos estudantes de engenharia da USP criaram o Educ.AI. A plataforma busca ajudar escolas públicas a alocar seu orçamento de forma eficiente e melhorar o desempenho de estudantes no Enem.
A ideia surgiu de Yasmin, em um hackathon em Cambridge no ano passado. Ao retornar, se reuniu com Giovana e Augusto para criar o projeto. O projeto cruza, basicamente, as notas das escolas no Enem e o Censo das Escolas da Educação Básica do Brasil para verificar como a infraestrutura das escolas pode impactar o desempenho dos estudantes no exame. "A gente começou a tentar desenvolver um modelo ali mesmo de predição para falar onde que é melhor colocar o dinheiro daquela escola", que é sempre limitado, diz Yasmin.
A ideia é que a plataforma esteja nas mãos dos gestores com controle sobre o orçamento da escola. Conforme os dados do censo e das notas do Enem são atualizados, o objetivo é acompanhar quais áreas da instituição precisam de mais melhorias. "A gente tem a ideia de melhorá-lo, de setorizar ainda mais. Colocar, por exemplo, as escolas rurais. As escolas rurais, por exemplo, têm uma diferença dos pesos da infraestrutura, tem o transporte para a escola mesmo, que é algo bem importante", diz Augusto. Eles já visualizaram, por exemplo, que a presença de computadores nas escolas é determinante para o desempenho.
Para os universitários, o evento será uma boa vitrine. "É um projeto que depende de dados públicos. Também é um projeto que, se as pessoas da educação pública não usarem, ele não tem sentido. É importante saber que tem gente ali no evento que tem visibilidade para ajudar a gente a fazer isso acontecer", diz Yasmin.
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