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Sob Bolsonaro, mais que dobra percentual de verbas bloqueadas da Educação

17/05/2019 14h22

Por Marcela Ayres

BRASÍLIA (Reuters) - O bloqueio orçamentário imposto pelo governo Jair Bolsonaro para garantir o cumprimento da meta fiscal deste ano significou um congelamento de quase um quarto nas verbas passíveis de corte do Ministério da Educação, maior percentual dos últimos três anos, apontou estudo elaborado pela Consultoria de Orçamento e Fiscalização Financeira (COFF) da Câmara dos Deputados.

O estudo apontou que, desta vez, a maneira como o contingenciamento atingiu o Ministério da Educação foi mais dura. O bloqueio de 5,8 bilhões de reais para a pasta representou uma tesourada de 23,67% no total de despesas discricionárias previstas para o MEC no ano.

Em 2018, o bloqueio inaugural do orçamento implicou congelamento de 10,06% para as verbas livres do MEC. Em 2017, esse percentual foi de 15,4%, mostrou o levantamento.

Por lei, o governo federal deve reavaliar suas receitas e despesas a cada bimestre para, de olho na meta de resultado primário, soltar ou segurar os chamados gastos discricionários, que são aqueles que podem ser reduzidos.

O bloqueio logo após o primeiro bimestre é corriqueiro e o governo anunciou no fim de março que congelaria quase 30 bilhões de reais no geral.

O levantamento da COFF mostrou que o bloqueio no primeiro bimestre aconteceu em todos os anos de 2012 para cá, à exceção de 2018, quando o governo retirou da programação dos órgãos 16,2 bilhões de reais do limite de empenho e 21,7 bilhões de reais do limite de pagamentos, numa medida que, na prática, também restringiu o manejo orçamentário.

Nominalmente, o MEC foi o ministério que sofreu maior contingenciamento, embora proporcionalmente outras pastas tenham sofrido uma limitação bem maior --como o Ministério de Minas e Energia, com 79,54% das despesas discricionárias da pasta para o ano.

Mas a consultora da Câmara Marcia Rodrigues, uma das responsáveis pelo estudo, destacou que o bloqueio para o MEC tem especificidades que ameaçam o funcionamento de suas atividades no dia a dia.

"Quando você olha Minas e Energia, que tem o maior corte, é porque tudo que ele faz (com despesas discricionárias) é investimento. Então cortar 79% pode não ser tão terrível quanto cortar 23% do MEC porque praticamente tudo neste caso é custeio e manutenção", afirmou ela.

"Se aquele ministério só faz obra, ele continua rodando. O MEC, como quase tudo é manutenção, o investimento é pequenininho, pode afetar muito fortemente o funcionamento", acrescentou.

PROTESTOS

Embora a equipe econômica tenha anunciado o contingenciamento há quase dois meses, a insatisfação popular cresceu nos últimos tempos, embalada pela maneira como o governo geriu a divulgação de informações, culminando com a grande manifestação nas ruas do país realizada nesta semana.

No fim de abril, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, chegou a afirmar que a balbúrdia feita pelas universidades federais seria um critério para definição de quais delas teriam suas verbas reduzidas em 30%, chegando inclusive a enquadrar três delas: a Universidade de Brasília (UnB), a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Diante da repercussão negativa, o MEC voltou atrás e disse que o contingenciamento, na realidade, afetaria todas as federais, numa medida necessária diante do congelamento nas despesas anunciado pelo governo para toda a Esplanada.

Na visão do diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente do Senado (IFI), Felipe Salto, o governo perdeu o bonde ao não explicar o porquê do contingenciamento. Ao se ater a aspectos ideológicos do debate, deixou de esclarecer à população por que é necessário um ajuste estrutural nas contas públicas para o país voltar a ter fôlego para direcionar recursos às áreas que considerar prioritárias.

Como as despesas obrigatórias, como com aposentadorias e com a folha de pagamento, crescem muito acima da inflação, o governo vem sistematicamente cortando as despesas discricionárias para conseguir cumprir a regra do teto de gastos.

"As despesas discricionárias devem encerrar o ano de 2019 em 101 bilhões (de reais). Em 2014 elas tinham chegado a quase 200 bilhões -- 194 bilhões. Isso mostra que, na ausência de mudança de gasto obrigatório, como a Previdência, por exemplo, o ajuste fiscal imposto pelo teto recai sobre as despesas discricionárias", disse Salto.

"Na ponta qual é o reflexo disso? As pessoas na rua reclamando de falta de dinheiro para a educação", afirmou ele. "É uma situação insustentável que só vai ser alterada quando o governo e o Congresso conseguirem avançar no ajuste fiscal para valer."

Num reflexo do desarranjo fiscal e das incertezas sobre o comportamento das receitas, em meio à pífia recuperação econômica, membros do governo já divulgaram que haverá outro contingenciamento no Orçamento, a ser anunciado até 22 maio, data de publicação do próximo relatório bimestral de receitas e despesas.

(Por Marcela Ayres; Edição de Camila Moreira e Maria Pia Palermo)