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Bolsonaro questiona Comissão da Verdade e diz ser "balela" discussão sobre documentos da ditadura

30/07/2019 11h42

(Reuters) - O presidente Jair Bolsonaro questionou nesta terça-feira as descobertas da Comissão Nacional da Verdade (CNV), que apontou crime contra a humanidade na ação do regime militar no Brasil, e disse ser "balela" a discussão sobre documentos que registram assassinatos cometidos por agentes do regime.

"A questão de 64 não existem documentos se matou ou não matou, isso aí é balela, está certo?", disse Bolsonaro a repórteres quando saía do Palácio da Alvorada, ao ser questionado sobre declaração dada na véspera a respeito do pai do presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, que foi apontado pela CNV como desaparecido durante o regime militar após ser preso pelas forças do Estado.

De acordo com a Comissão Nacional da Verdade, Fernando Augusto Santa Cruz Oliveira, pai do presidente da OAB, foi visto pela última vez em fevereiro de 1974, quando foi preso no Rio de Janeiro por agentes do DOI-Codi.

Em buscas por ele, a família recebeu diversas negativas de que tivesse sido preso, mas em suas investigações a CNV encontrou um relatório do Ministério da Aeronáutica da década de 1990 em que se informava ao Ministério da Justiça que ele havia sido preso em 23 de fevereiro de 1974 e era considerado desaparecido desde então. Ele tinha 26 anos.

"Comissão da Verdade? Você acredita em Comissão da Verdade?", afirmou Bolsonaro, ao ser questionado sobre os documentos da CNV que apontam o desaparecimento do pai do presidente da OAB.

"Você quer documento para isso, meu Deus do céu? Documento é quando você casa, quando você se divorcia. Eles têm documento dizendo o contrário?, acrescentou.

Na segunda-feira, Bolsonaro afirmou que o pai do presidente da OAB era membro do grupo Ação Popular, classificado pelo presidente da República como "sanguinário", e que poderia contar a Felipe Santa Cruz como o pai desapareceu.

A declaração foi feita no âmbito de críticas de Bolsonaro à OAB, que tem questionado ações propostas pelo governo. Bolsonaro reclama que a entidade teria impedido a quebra do sigilo telefônico do advogado de Adélio Bispo, que o atacou com uma faca durante a campanha eleitoral do ano passado. A OAB e a própria Polícia Federal negaram que tenha sido pedida uma liminar pela OAB para impedir o acesso.

Em resposta à declaração de Bolsonaro, o presidente da OAB anunciou que irá ao Supremo Tribunal Federal (STF) para que o presidente da República esclareça as afirmações sobre o desaparecimento de seu pai. Santa Cruz afirmou que os comentários de Bolsonaro são "inqualificáveis" e que demonstram "mais uma vez traços de caráter graves em um governante: a crueldade e a falta de empatia".

Nesta terça, Bolsonaro afirmou que não vê problema no fato de a OAB ingressar no Supremo, e reiterou que fez a afirmação com base em seu "sentimento", e que "não tem nada escrito" a respeito.

O presidente afirmou na véspera que a informação que teve à época do desaparecimento do pai do presidente da OAB foi de que Fernando Santa Cruz foi assassinado por outros integrantes da Ação Popular. Bolsonaro tinha 18 anos quando o pai do presidente da OAB desapareceu em fevereiro de 1974.

A CNV foi instalada em maio de 2012 e em 2014 entregou três volumes do relatório sobre os crimes da ditadura. O acervo da comissão reúne milhares de documentos, testemunhos de vítimas e familiares, depoimentos de agentes da repressão política, 47 mil fotografias, vídeos de audiências públicas, diligências e depoimentos, laudos periciais, livros, entre outros.

(Reportagem de Pedro Fonseca, no Rio de Janeiro, e Lisandra Paraguassu, em Brasília)