ANÁLISE-Pessoa física enfrenta teste de fogo na bolsa após recordes
Por Paula Arend Laier
SÃO PAULO (Reuters) - Investidores pessoa física estão sendo colocados à prova nessas últimas semanas e podem precisar de ainda mais sangue frio, em meio à forte volatilidade nos mercados globais, com o Ibovespa renovando mínimas desde meados de 2018 e várias ações registrando quedas de cerca de 50% neste começo de 2020.
A atitude de esperar para ver tem sido uma opção para enfrentar a turbulência, além da troca de ativos nas carteiras, principalmente com opções restritas em termos de rentabilidade com a taxa Selic em mínimas históricas, citaram profissionais de corretoras e gestoras ouvidos pela Reuters.
Mas há também alguns aumentando a posição, aproveitando a 'liquidação' recente, acrescentaram, embora não descartem efeitos no curto prazo, como uma desaceleração no ritmo de migração para a renda variável.
"A pessoa física é mais sensível a essas grandes oscilações, e tende a resgatar em momentos de crise, porém agora o que estamos vendo é uma busca por informações, para que eles obtenham mais segurança na tomada de decisões", disse Rodrigo Franchini, sócio da assessoria de investimentos Monte Bravo.
"Não existe, por enquanto, uma saída exagerada das posições de bolsa e nem dos fundos de investimentos que procurem esse tipo de alocação", afirmou.
A B3 notou um salto no número de investidores ativos desde o ano passado, chegando a 1,97 milhão de registros no final de fevereiro de 2020, contra 942 mil um ano antes, em grande parte sustentado pelo cenário de juros em mínimas recordes, mas também em apostas de retomada da economia. Apenas entre janeiro e fevereiro, a operadora da bolsa paulista viu um aumento de 120 mil investidores ativos, apesar das primeiras notícias a respeito do agravamento da epidemia em vários países do mundo.
A taxa Selic continua no menor patamar de sua história e há chance de mais queda no horizonte, mas o prognóstico para o PIB mudou, assim como ambiente financeiro global, principalmente depois do Carnaval, conforme o novo coronavírus se espalhou além da China e elevou temores sobre a atividade econômica mundial.
"Este cenário pode prejudicar a velocidade da movimentação das pessoas físicas para a renda variável, visto que compreensão de riscos e movimentos de mercado são complexos", disse Ronaldo Guimarães, sócio e diretor do banco digital modalmais. "Como o movimento foi muito agudo e rápido, os investidores têm esperado e mantido a cautela."
"EU PERDI BEM"
Após renovar recordes históricos no primeiro mês do ano, aproximando-se dos 120 mil pontos, o Ibovespa já acumulou queda de cerca de 30% desde a volta do feriado do Carnaval, no final de fevereiro. O circuit breaker - que suspende as negociações por queda muito forte - foi acionado cinco vezes, sendo a primeira vez para muitos investidores.
A última vez que a B3 havia acionado o circuit breaker, antes da atual temporada, foi em 18 de maio de 2017, no que ficou conhecido no mercado como "Joesley Day", após vir a público gravação de conversa entre o então presidente Michel Temer e o empresário Joesley Batista e sua delação relacionada a atos de corrupção envolvendo políticos.
Desde então, o Ibovespa subiu 94% até a máxima histórica de fechamento em 23 de janeiro, a 119.527,63 pontos. Apenas em 2019, acumulou alta 31,6%. Em 2020, porém, a queda acumulada já encosta nos 40%.
No começo do mês, a XP Investimentos cortou sua projeção para o Ibovespa no final deste ano para 132 mil pontos, ante 140 mil pontos anteriormente, citando a perspectiva de menor crescimento no Brasil e aumento da incerteza externa.
"Eu perdi bem. A queda nas ações neste ano fez eu perder mais que o meu ganho do ano passado. Mas ainda assim eu aproveitei a baixa para comprar alguma coisa", afirmou a médica Renata Leal, classificando-se como uma investidora mais agressiva. "Mas agora vou segurar um pouco e esperar."
Números sobre a participação dos investidores no mercado secundário de ações brasileiro mostram que essa classe continuou comprando mais do que vendendo, mesmo após o tombo.
O primeiro mês do ano terminou com um saldo positivo de 4,05 bilhões de reais, movimento que se seguiu em fevereiro, quando ficou novamente positivo, em 3,95 bilhões de reais. Em março, até o dia 14, as compras superavam as vendas em 10 bilhões de reais.
O analista Luis Sales, da Guide Investimentos afirmou que a mentalidade entre investidores tem sido a de buscar abaixar o preço médio, realizando mais compras. "Além disso, as pessoas entendem que as ações estão negociadas a patamares bem atrativos", afirmou, destacando, contudo, que a volatilidade tende a se manter elevada no curto prazo.
A ARX Investimentos ressaltou que não estava sofrendo resgates, e, segundo Paulo Bokel, responsável pela área de distribuição da gestora, movimentos como os recentes podem afetar a alocação para a renda variável, principalmente dos que estavam com uma exposição maior do que o seu perfil.
"A tomada de risco pelo investidor tem que ser condizendo com o perfil... e o investidor deve sempre respeitar sua tolerância de risco, esse deve ser o foco para a construção de seu portfólio", acrescentou.
SELIC
O cenário baixista para as taxas de juros do país é um dos argumentos dos profissionais ouvidos pela Reuters que deve respaldar a manutenção das pessoas físicas na bolsa, mesmo que em um ritmo de migração mais lento e sem um retorno imediato.
"Dada a natureza avessa ao risco da maioria dos investidores, espera-se que um choque como este leve tempo até ser digerido por completo, porém com taxa de juro no mundo e também no Brasil caindo ainda mais, é um movimento que julgo inexorável", afirmou Guimarães, do modalmais.
Na mesma linha, Sales, da Guide Investimentos, disse que não existem muitas alternativas de investimento para recuperar o capital perdido.
O Federal Reserve e outros bancos centrais no exterior agiram de forma agressiva e emergencial com cortes na taxa de juros e ofertas de dólares baratos para ajudar a combater a pandemia de coronavírus e o mercado no Brasil aguarda agora o próximo passo da autoridade monetária nacional.
O Comitê de Política Monetária (Copom) do BC anuncia nesta quarta-feira sua decisão e no mercado a expectativa é de corte na taxa Selic, atualmente em 4,25%.
Economistas do UBS, em relatório a clientes na segunda-feira, afirmaram acreditar que os últimos desdobramentos justificam um movimento mais agressivo e preventivo pelo BC. "Nós agora estimamos um corte imediato de 1 ponto percentual, levando a Selic para 3,25%", afirmaram.
"Hoje, o brasileiro entende que não tem outro investimento que possa lhe trazer um retorno adequado ou até mesmo um retorno que diminua as suas perdas de agora...a manutenção dessas posições ainda tende a ser uma vantagem frente a outras modalidades no nosso mercado", citou Franchini, da Monte Bravo.
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