Logo Pagbenk Seu dinheiro rende mais
Topo

ENTREVISTA-Na crise, setor de etanol do Brasil quer apoio para estocar 1/4 da produção

16/04/2020 11h47

Por Roberto Samora

SÃO PAULO (Reuters) - O setor de etanol do Brasil tem buscado ajuda do governo federal para obter financiamento via instituições oficiais para estocar 6 bilhões de litros do biocombustível da safra 2020/21, o que permitiria a continuidade da colheita recém-iniciada no centro-sul, diante da queda drástica de preços e demanda pela crise do coronavírus, disse uma das principais lideranças da indústria no país.

Em entrevista à Reuters nesta quinta-feira, o presidente da União da Indústria de Cana-de-açúcar (Unica), Evandro Gussi, afirmou ainda que o financiamento, que poderia manter nos estoques volume equivalente a quase 25% da produção da safra 2020/21, exigiria 9 bilhões de reais.

"O que estamos pedindo é uma solução financeira de mercado, que é um financiamento desenhado pelos bancos oficiais que possa fazer frente a este início da safra, quando se tem o maior dispêndio de recursos, dando como garantia etanol em tanques lacrados, supervisionados por controladoras de primeira linha", disse Gussi.

Segundo ele, o financiamento para estoques de etanol teria que ter prazo de dois anos e juros semelhantes aos concedidos em pacotes emergenciais para outros setores.

"Seria uma linha de crédito, na linha do que o governo já tem feito para evitar outros colapsos... solução relativamente simples, e que se não for tomada vai no fundo gerar um problema que o governo terá que resolver com medidas muito mais drásticas", disse ele.

Segundo Gussi, sem medidas emergenciais aprovadas rapidamente, no máximo até a semana que vem, usinas de cana já começariam a parar atividades em duas ou três semanas.

"Se não for feito, as usinas param, porque não terão fluxo de caixa... ninguém está falando de lucrar neste momento, é sobreviver. Se a usina para, param os colaboradores e os fornecedores de cana", disse ele, destacando que o setor emprega, entre diretos e indiretos, 2 milhões de pessoas.

O presidente da Unica, que representa as usinas do centro-sul, onde está cerca de 90% da cana do Brasil, detalhou ainda o pedido do setor para isenção de PIS/Cofins para o etanol, que segundo ele deve ser retirado para toda a cadeia produtora, incluindo distribuidoras.

Atualmente, produtores pagam 13 centavos de real por litro de PIS/Cofins, enquanto distribuidores arrecadam 11 centavos, sobre vendas de etanol.

Questionado se a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) da gasolina poderia subir de 10 para 50 centavos por litro, para aumentar a competitividade do etanol, o presidente da Unica disse que "esse é um número que o Ministério de Minas e Energia tem estudado", e que a avaliação leva em conta impactos ao consumidor.

Para Gussi, a safra de cana do centro-sul tem potencial de ser uma das maiores da história, superando 600 milhões de toneladas, mas depende de medidas de apoio.

IMPORTAR MENOS GASOLINA?

Os preços do etanol nas usinas do Estado de São Paulo, principal produtor do Brasil, caíram cerca de 35% desde o início de março, para cerca de 1,40 real por litro na usina, de acordo com dados do centro de pesquisas Cepea, enquanto as vendas das distribuidoras para os postos no país chegaram a despencar 60% nos piores momentos do isolamento social no país, segundo disse à Reuters a BR Distribuidora.[nL2N2C11DZ]

Diante desse quadro, considerado uma "tempestade perfeita" pelo presidente da Unica, que citou ainda o impacto das disputas entre Arábia Saudita e Rússia para o mercado de petróleo, o dirigente avalia que são necessárias "medidas excepcionais e temporárias", ainda mais para um setor que contribui com "descarbonização" da matriz energética e vem se preparando para expandir a produção, com o apoio do programa governamental RenovaBio.

"Em toda esta crise, não houve uma voz dizendo que a descarbonização não será um objetivo mundial, e o Brasil não pode perder a liderança da energia limpa, em um momento em que seria fundamental, depois dessa crise", comentou.

Ele destacou ainda que as importações de gasolina seguem crescentes, e que dessa forma o país está contribuindo para gerar empregos em outras nações.

"No fundo", disse ele, "o país precisa decidir se vai privilegiar a gasolina importada, que gera emprego fora, ou se vai manter uma indústria que é orgulho nacional, que está indo bem, que tem futuro incrível".

Segundo dados da reguladora ANP citados pela Unica, as importações de gasolina cresceram cerca de 60% em 2019 ante 2018, para 4,8 bilhões de litros, e seguiram crescentes no primeiro trimestre do ano.