Governo pode estar "um pouco otimista" sobre PIB, diz pesquisadora do Ibre
A expectativa do governo para o desempenho da economia neste ano pode estar "um pouco otimista", avaliou Juliana Damasceno, pesquisadora da área de Economia Aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), para quem há dúvidas sobre a recuperação da demanda diante do nível de desemprego.
De acordo com a pesquisadora, apesar de alguns setores apresentarem resultados positivos na atual conjuntura, outros estão sendo fortemente penalizados, como o automobilístico, com impactos que se propagam para as cadeias produtivas atreladas, o que, na visão dela, constituem em efeitos de longo prazo.
"A gente não sabe até que ponto a demanda, que é nosso principal indicador de recuperação da economia, vai se recuperar, por causa do desemprego, por causa dos autônomos, que hoje em dia representam a maior parte do nosso mercado de trabalho", afirmou em entrevista à Reuters.
A última projeção do Boletim Macro do Ibre, publicado no último dia 23, aponta para retração da economia de 5,5% neste ano, ante estimativa anterior de queda de 6,4%. O Ministério da Economia prevê contração de 4,7%, enquanto a pesquisa Focus do Banco Central com analistas de mercado mostra mediana dos prognósticos em 5,77%.
"O Brasil tem passado por uma retomada muito mais lenta do que a gente gostaria", disse, citando que, como a crise é global e outros países também estão experimentando quedas na economia, é possível ter parâmetro do que poderia ser a recuperação da atividade doméstica.
O processo de recuperação da economia brasileira vai depender, segundo Damasceno, de como se encaminha a agenda de reformas no país, com especial atenção às relacionadas às contas públicas.
Fiscal
No mês passado, pouco antes de deixar o cargo, o ex-secretário do Tesouro Mansueto Almeida afirmou que, em face de um cenário de juros baixos e liquidez elevada no país e no mundo, o Brasil tem uma janela de pouco mais de dois anos para acelerar na aprovação de reformas fiscais.
Na visão de Damasceno, essa estimativa é, sim, possível, mas é preciso levar em conta outros fatores atrelados à dinâmica das contas públicas, como o período eleitoral de 2022.
Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) com base no período entre 1995 a 2011 mostra aumento de gastos públicos em anos eleitorais.
Ainda de acordo com Damasceno, o país enfrenta outros gargalos, como a alta taxa de desemprego, resultado da pandemia do coronavírus, bem como a saúde financeira das empresas, em decorrência da crise de saúde. O problema é agravado, de acordo com a pesquisadora, pela dificuldade de se fazer o crédito chegar até a ponta.
"A situação da dívida obviamente vai ser cada vez mais preocupante. A gente precisa casar esse cenário macro com esse cenário fiscal e entender que isso vai ser primordial para que, em um futuro próximo, a gente consiga essa estabilidade que foi aí chamada de dois anos."
De acordo com Damasceno, dentre os principais desafios que o Brasil enfrentará em 2021 está a discussão sobre o teto de gastos —que limita o crescimento das despesas totais do governo federal à variação da inflação do ano anterior até 2026.
O Ministério da Economia prevê inflação medida pelo IPCA de 1,60% em 2020. De acordo com estimativa trazida pelo boletim Focus publicado nesta segunda-feira, o mercado projeta inflação de 1,67% neste ano.
"O desafio (fiscal) se torna cada vez mais apertado, a gente tem um limite muito apertado, e a gente sabe que as despesas mais sacrificadas são, obviamente, as discricionárias. E existe o limite do que a gente chama de 'shutdown' da máquina pública."
Nesse contexto, as projeções do governo para a trajetória da dívida pública, de acordo com a pesquisadora, se apoiam na premissa de um nível de juros baixos por mais alguns anos. Ela, no entanto, reforça que a inflação não é um problema resolvido no país, o que demanda cautela.
Pelas últimas projeções do Tesouro Nacional, divulgadas no início deste mês e que serão revisadas ainda nesta semana, após sofrer um salto de 22,4 pontos neste ano, a dívida bruta deve ficar praticamente estável até alcançar 98,6% do PIB em 2024. A partir daí, entraria em trajetória descendente, encerrando 2029 em 92,2% do PIB.
De acordo com Damasceno, o nível de estabilização previsto pelo Tesouro depende do prêmio de risco do país, sendo que, caso ocorra a deterioração dos níveis de confiança perante os agentes econômicos, pode haver impacto expressivo sobre o câmbio e potencial saída de capital que afete a inflação e, assim, as expectativas para a trajetória da dívida.
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