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Apesar de pressão para demissão de Araújo, Bolsonaro ainda tenta evitar troca de chanceler

25/03/2021 17h47

Por Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) - A pressão crescente vinda do Congresso pela saída do ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, foi sentida no Palácio do Planalto, que tenta baixar a temperatura para evitar uma demissão que o presidente Jair Bolsonaro preferia não fazer.

Dentro do Planalto, auxiliares do presidente admitem que a situação do ministro é difícil. No entanto, não há ainda uma decisão pela troca do chanceler, apesar dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) já terem deixado claro que manter Araújo não é uma opção.

Em uma tentativa de diminuir a tensão, o chanceler teve uma conversa privada, na manhã desta quinta-feira, com Lira, na residência oficial da Câmara. De acordo com uma fonte próxima ao chanceler, Araújo tentou mostrar ao parlamentar tudo o que o Itamaraty havia feito para tentar facilitar a obtenção de vacinas e os limites entre o trabalho diplomático e o que deveria ser feito pelo Ministério da Saúde.

Não adiantou. De acordo com uma segunda fonte, o encontro foi cordial, mas Lira continua convencido de que Araújo não tem como permanecer ministro.

Uma terceira fonte, parlamentar que acompanha de perto o tema, disse à Reuters que ainda há resistência do presidente, mas acredita que dessa vez a troca será feita.

A avaliação do presidente da Câmara, que já foi dita reiteradas vezes e é repetida por outros parlamentares, é que Araújo criou obstáculos na relação com países-chave para o Brasil neste momento, como a China, a Índia e os Estados Unidos.

Defensor apaixonado de Donald Trump, o chanceler, assim como o presidente, não escondeu a torcida pelo republicano na eleição de novembro do ano passado. A vitória do democrata Joe Biden tirou a interlocução supostamente privilegiada que o Brasil tinha com Washington.

O governo brasileiro, por exemplo, tentou pedir aos EUA parte do excedente que o país tem de vacinas contra Covid-19 --parte já cedida a Canadá e México--, mas a resposta foi um vago talvez.

Críticas à China, bate-boca com o embaixador do país no Brasil, ameaças de vetar equipamentos chineses no leilão de bandas 5G, também dificultaram a relação com o país asiático, maior produtor de insumos farmacêuticos e suprimentos hospitalares do mundo.

Já no caso da Índia, há avaliações de que o Araújo errou ao não apoiar uma proposta indiana de suspender as patentes de vacinas contra Covid-19 durante a pandemia. O Brasil se associou aos EUA e a países desenvolvidos e a proposta foi derrubada.

Caiu na conta do Itamaraty o atraso na chegada de insumos para produção das vacinas pela Fundação Oswaldo Cruz e pelo Instituto Butantan, e também a decisão da Índia de atrasar a entrega de vacinas prontas, já contratadas pelo Brasil.

Araújo, no entanto, é defendido pelos filhos do presidente, especialmente pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), e pela ala bolsonarista mais radical, incluindo o assessor internacional do presidente, Filipe Martins.

Boa parte do grupo mais fiel ao presidente vê o chanceler como um exemplo da retórica contra o "comunismo internacional", o "globalismo" e um defensor da extrema-direita.

No entanto, o tom da sessão com o chanceler na sessão da Comissão de Relações Exteriores do Senado foi uma amostra da crescente hostilidade contra o chanceler, no que foi interpretado no Itamaraty como um "jogo bruto".

Parlamentares por diversas vezes pediram que Araújo deixasse o cargo e afirmaram que ele não tinha condições de se manter à frente da diplomacia brasileira.

Nesta quinta, mais comedido, o presidente do Senado repetiu as críticas.

"Muito além da personificação ou do exame sobre o trabalho específico de um chanceler, o que se tem que mudar é a política externa do Brasil. Evidentemente que ela precisa ser aprimorada, melhorada, as relações internacionais precisam ser mais presentes. Um ambiente de maior diplomacia", disse, acrescentando que essa situação é clara para os parlamentares e para o restante do Brasil.

Pacheco reforçou que quem demite ministros é o presidente, mas o recado vindo do Congresso está claro.

Uma das grandes questões sobre a saída de Araújo é quem, entre possíveis nomes para substituí-lo, seria bem aceito por Bolsonaro e também palatável no Congresso.

Dentro do Itamaraty, segundo fontes ouvidas pela Reuters, voltaram a circular os nomes do embaixador em Paris, Luís Fernando Serra, que chegou a ser cotado para assumir o Itamaraty no início do governo, mas foi destronado por Araújo. Serra se tornou, hoje, um dos maiores defensores de Bolsonaro no exterior.

Outro nome que ressurgiu foi o da chefe do Consulado do Brasil em Nova York, Maria Nazareth Farani, que foi chefe de gabinete de Celso Amorim, mas se tornou uma forte defensora de Bolsonaro a ponto de bater-boca com o ex-deputado Jean Wyllis em uma sessão das Nações Unidas em Genebra, onde servia antes da mudança para Nova York, em janeiro.

As fontes ouvidas pela Reuters também não descartam nomes de fora do Itamaraty. Surgiu, por exemplo, o do senador Fernando Collor de Mello.

Até agora, no entanto, mais do que tudo, o que circula em Brasília são especulações.