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ENFOQUE-Disparada da energia gera apreensão, e indústria pede alívio a Bolsonaro

09/04/2021 12h47

Por Luciano Costa

SÃO PAULO (Reuters) - Uma disparada em custos da energia elétrica e do gás natural em tempos de pandemia tem gerado apreensão em investidores, consumidores e indústrias, o que já leva o governo de Jair Bolsonaro a lidar com pedidos de alívio de encargos e tributos que pesam sobre a conta da eletricidade.

Enquanto isso, a agência reguladora Aneel trabalha para limitar o impacto dos custos maiores --que apontam para alta de mais de mais de 10% nas tarifas de luz em 2021--, prometendo evitar medidas que eventualmente tragam insegurança jurídica. A agência já adiou reajustes para distribuidoras como CPFL e Energisa.

"Tudo preocupa. De um lado, temos que reconhecer esse momento extremamente delicado e difícil em função da pandemia. Por outro lado, qualquer alteração no processo regulatório e tarifário geraria uma insegurança jurídica muito grave", disse o presidente do centro de estudos Acende Brasil, Claudio Sales.

Representantes da indústria têm demonstrado preocupação com uma tendência de forte alta nos custos, que impactam até grandes empresas, que adquirem energia em negociações bilaterais no mercado livre.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) disse que tem defendido junto ao governo medidas para redução de gastos no setor, como forma de impulsionar a retomada da economia em momento em que o recrudescimento da crise do coronavírus ameaça a recuperação das atividades.

"Uma das medidas sugeridas é a isenção de tributos federais e encargos setoriais que incidem sobre a conta de luz por um período de 90 dias", afirmou a entidade em nota, ao estimar que isso poderia reduzir em 25% o custo da energia elétrica.

Impostos respondem por cerca de 30% das faturas de energia, sendo 4% dos tributos federais PIS e Cofins, enquanto encargos que bancam desde programas como o Luz Para Todos e subsídios diversos até o acionamento de térmicas equivalem a 14% do total.

Especialistas têm projetado aumentos na casa dos dois dígitos para as tarifas em 2021, o que chegou a causar irritação no presidente Jair Bolsonaro, que afirmou em fevereiro que o governo iria "meter o dedo na energia elétrica", apontado por ele como "problema".

No gás natural, outra importante fonte de energia da indústria, a Petrobras anunciou aumento de 39% a partir de maio no preço de venda do insumo às distribuidoras, que atendem o cliente final.

O aumento também gerou críticas de Bolsonaro, que disse na quarta-feira que o movimento da estatal foi "inadmissível", embora com a ressalva de que não iria interferir.

Para o chefe da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia (Abrace), Paulo Pedrosa, o governo tem encaminhado propostas animadoras de reformas na regulação dos setores de eletricidade e gás, mas essas medidas não trarão alívio no curto prazo.

"Tem coisas boas acontecendo no plano institucional e de ideias, mas na prática, no dia a dia, o cenário está muito ruim para a indústria", disse ele, que já foi secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia.

O cenário de pressão nas tarifas elétricas tem preocupado até a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que decidiu adiar decisões sobre novos reajustes enquanto avalia medidas que possam conter a escalada de custos.

Um dos principais fatores por trás da alta é a disparada do dólar frente ao real. A moeda norte-americana tem forte peso no IGP-M, índice que corrige parte dos contratos no setor elétrico. A produção da hidrelétrica de Itaipu também é cotada em dólares.

"Esse cenário é agravado pelas condições para geração hídrica em 2021", disse na terça-feira o diretor da Aneel Sandoval Feitosa.

Ele prometeu que as ações da agência para aliviar os aumentos não serão "nenhuma alquimia regulatória" e nem "pedalada".

ALTA GERAL

Mesmo empresas que atuam no chamado mercado livre elétrico, onde clientes com maior demanda negociam contratos e preços diretamente com geradores e comercializadoras de energia, têm visto disparada de custos neste ano, disse Pedrosa, da Abrace.

Isso ocorre porque o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), liderado pelo Ministério de Minas e Energia, tem autorizado desde outubro passado o uso de térmicas além do apontado por modelos computacionais que guiam a operação do sistema, em meio a chuvas fracas nos lagos das hidrelétricas.

Esse uso adicional de térmicas gera encargos que pesam sobre a tarifa de distribuidoras, mas também recaem sobre consumidores livres. Os encargos somaram 7,2 bilhões de reais desde outubro.

Pela proposta da CNI, a União deveria assumir os custos com encargos por 90 dias, zerando também encargos federais.

"A ideia... é reduzir os custos de produção durante essa fase aguda da pandemia", afirmou.

TENSÃO NO AR

A soma de queixas do setor produtivo, declarações do presidente Bolsonaro e sinalizações da Aneel têm gerado alguma tensão no ar nos bastidores do setor de energia.

Analistas do Credit Suisse disseram em relatório na quarta-feira que não acreditam que a Aneel possa tomar medidas que envolvam desrespeito a contratos ou impactos sobre as empresas.

"No entanto, a percepção de risco pode crescer até que tenhamos mais informações... consequentemente, esperamos pela decisão final da Aneel sobre as medidas que devem ser implementadas para reduzir as tarifas em 2021", escreveram.

O diretor-geral da Aneel, André Pepitone, disse que a agência deve apresentar suas propostas para alívio tarifário em até duas semanas.

(Por Luciano Costa; edição de Roberto Samora)