Lula diz que conceito de democracia varia para cada pessoa e que Venezuela tem mais eleições que Brasil
(Reuters) - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quinta-feira que a Venezuela tem mais eleições que o Brasil e que o conceito de democracia varia para cada pessoa, em uma defesa do regime do presidente venezuelano, Nicolás Maduro, classificado por parte da comunidade internacional como uma "ditadura".
Em entrevista à Rádio Gaúcha, Lula lembrou que haverá eleição na Venezuela neste ano e quem quiser derrotar Maduro que o faça nas urnas. Entre as principais críticas ao regime venezuelano estão as denúncias de fraude e falta de legitimidade nos processos eleitorais do país.
"A Venezuela tem mais eleições que o Brasil", disse Lula à emissora, para logo em seguida ouvir do entrevistador que apenas eleições não bastam para garantir democracia. "Deixa eu lhe falar uma coisa, o conceito de democracia é relativo para você e para mim", respondeu.
O presidente fez questão de dizer que defende a democracia e que foi a democracia que permitiu a ele eleger-se pela terceira vez à Presidência. Lembrou ainda dos ataques às sedes dos Três Poderes em Brasília em 8 de janeiro e disse que, das vezes que perdeu eleições, aceitou o resultado das urnas.
"Vai ter eleições neste ano na Venezuela. Vai ter eleições, a Rádio Gaúcha pode mandar uma equipe lá para ver se ela vai ser legítima ou não", disse.
"Quem quiser derrotar o Maduro, derrote agora nas próximas eleições. Vai ter eleições, derrote e assuma o poder. Vamos lá fiscalizar. Se não tiver uma eleição honesta, a gente fala", acrescentou.
Ao mesmo tempo, Lula reconheceu que há "um problema" na Nicarágua, onde o presidente Daniel Ortega tem sido acusado de perseguir membros da oposição, inclusive integrantes da Igreja Católica.
Lula repetiu o que disse após visita recente ao papa Francisco, no Vaticano, e afirmou que conversará com Ortega para pedir a libertação de um bispo católico crítico do regime do líder nicaraguense preso.
"Nós temos um problema com a Nicarágua, eu vou conversar com o presidente da Nicarágua, porque tenho relação para conversar e eu acho que tem que resolver o problema com a Igreja", afirmou.
Lula também foi questionado sobre a possibilidade de o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) financiar obras de estrutura no exterior, especialmente a de um gasoduto na Argentina, e sobre a capacidade de pagamento do país vizinho, que vive uma prolongada e profunda crise econômica.
Lula defendeu a prática, argumentando se tratar de exportação de engenharia e lembrando que China e Índia também têm financiado obras no exterior. O presidente afirmou ainda que países como Cuba e Venezuela, que receberam financiamento brasileiro para obras de infraestrutura, são "bons pagadores" e acertarão os pagamentos atrasados com o Brasil.
"É verdade que a Venezuela não pagou, porque o governo brasileiro fechou as portas para a Venezuela. Foram praticamente quatro anos sem relação", disse Lula.
"Eu conversei com o Maduro agora e falei: 'Maduro, é preciso começar a acertar o pagamento da dívida', e ele vai acertar. Ele vai acertar, Cuba vai acertar e todos vão acertar, porque todos são bons pagadores e nunca deveram ao Brasil", acrescentou.
"REVOLUÇÃO DE 64"
A defesa feita por Lula de governos de esquerda na América Latina acontece no mesmo dia em que o presidente participará em Brasília de uma reunião do Foro de São Paulo, que reúne partidos e entidades de esquerda latino-americanos.
Na entrevista à Rádio Gaúcha, no entanto, Lula deu uma declaração que tem potencial de gerar desconforto entre progressistas e esquerdistas, ao se referir ao golpe militar de 1964, que iniciou 21 anos de ditadura no país marcada por cerceamento de direitos e violação de direitos humanos como "revolução" -- mesmo termo usado pelos apoiadores do regime militar.
A fala ocorreu em uma resposta sobre a reforma tributária, cuja proposta tramita no Congresso Nacional.
"Vai ser a primeira reforma tributária votada no regime democrático. A última reforma tributária nossa foi depois da revolução de 64", disse o presidente.
(Por Eduardo Simões, em São Paulo)
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