Corte generoso do Copom impulsiona Ibovespa, mas real tomba com menor diferença de juros e temor de interferência no BC

Por Luana Maria Benedito

SÃO PAULO (Reuters) - Investidores comemoraram nesta quinta-feira o corte mais generoso da Selic pelo Banco Central na véspera, com o Ibovespa chegando a subir 1,5% pela manhã, embora o real se desvalorizasse diante da perspectiva da redução do diferencial de juros entre o Brasil e outras economias, em meio ainda a temores de interferência política no Comitê de Política Monetária (Copom).

O BC anunciou na véspera a redução da Selic de 13,75% para 13,25% ao ano, em decisão que dividiu os membros de sua diretoria em 5 a 4. O Copom também sinalizou novos cortes de 0,50 ponto percentual nas próximas reuniões, após a primeira flexibilização na taxa básica de juros em três anos.

Economistas consultados pela Reuters esperavam redução mais branda, de 0,25 ponto percentual, enquanto operadores do mercado financeiro se mostravam igualmente divididos entre corte de 0,25 e ajuste de 0,50 ponto.

Na esteira da redução, as taxas dos principais contratos de juros futuros caíam nesta manhã na curva até janeiro de 2027, enquanto o Ibovespa -- que já vinha se beneficiando da expectativa de início do afrouxamento monetário em agosto -- chegou a ganhar 1,46% por volta de 10h50, a 122.619,14 pontos. Por volta de 11h50, o índice tinha alta de 0,42%

"A maioria das empresas brasileiras carrega dívidas com taxas flutuantes, o que significa que, quando os juros caem, suas despesas líquidas com juros caem com elas. Isso se traduz em revisões de resultados positivas sem qualquer melhoria operacional", disse Malcolm Dorson, gerente sênior de portfolio da Global X.

"Os cortes da Selic permitem que os investidores em ações usem um custo de capital mais baixo ao descontar os fluxos de caixa futuros. Isso se traduz em metas de preço mais altas e pode levar a uma reavaliação do mercado", completou ele.

Por outro lado, o dólar disparava 1,67%, a 4,8861 reais na venda, rondando os patamares intradiários mais altos em mais de quatro semanas. Luciano Rostagno, estrategista-chefe do banco Mizuho, atribuiu isso ao corte de juros mais acentuado do que boa parte dos mercados esperava, que torna o apelo de diferencial de juros do real menos atraente.

Isso porque o nível alto das taxas torna o real interessante para uso em estratégias de "carry trade", que consistem na tomada de empréstimo em país de juro baixo e aplicação desses recursos em mercado de renda fixa de retornos maiores. Quanto mais a Selic cair, mais o Brasil perderá vantagem no "carry trade".

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"Alternativas de renda fixa nos EUA vão ganhar cada vez mais espaço nesse novo contexto", disse o economista-chefe da Nomad, Danilo Igliori, sobre o corte de 0,50 ponto percentual da Selic.

Por outro lado, disse Rostagno, do Mizuho "o impacto no mercado de câmbio acaba sendo um pouco limitado pela forte sinalização que o BC deu de que não pretende acelerar o ritmo de cortes", ao mesmo tempo que parte do risco de um corte menos parcimonioso da Selic já havia sido precificado pelos operadores.

DECISÃO TÉCNICA OU PRESSÃO POLÍTICA?

Outro fator possivelmente por trás do salto do dólar citado por participantes do mercado é uma preocupação com a possibilidade de que a postura monetária mais branda do Copom reflita, de alguma forma, a pressão política exercida desde o início do ano pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, com um coro de autoridades cobrando cortes da Selic.

"O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, teve uma mudança bastante significativa de postura em relação à última decisão do Copom, quando houve unanimidade entre os diretores para que se mantivesse estável a taxa Selic em um comunicado duro, sem sequer citar a possibilidade de reduções futuras da taxa de juros", disse Leonel Oliveira Mattos, analista de inteligência de mercados da StoneX.

"É preciso mencionar o contexto dessa decisão, que agora iniciou dois diretores indicados pelo novo governo Lula. Então, coincide esse período, e os agentes de mercado acabam se questionando se essa é apenas uma coincidência ou não."

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No geral, agentes no mercado dizem que seria ruim para o ambiente de negócios do Brasil qualquer tipo de interferência política no Banco Cetral, que é independente. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse na véspera que a decisão do Copom foi baseada inteiramente em critérios técnicos e não representou uma concessão às críticas do governo.

O ex-secretário-executivo de sua pasta, Gabriel Galípolo, é um dos novos diretores do BC que fez sua estreia no Copom esta semana, ocupando a cadeira de Política Monetária. O outro indicado do governo à autarquia é Ailton Aquino, que assumiu a diretoria de Fiscalização.

(Reportagem adicional de Paula Arend Laier e Gabriel Araujo)

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