Aneel chega a impasse e adia decisão sobre transferência da distribuidora do AM para Âmbar

Por Letícia Fucuchima

SÃO PAULO (Reuters) - Diretores da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) chegaram a um impasse e não conseguiram decidir, em reunião nesta sexta-feira, se cumpririam ou não uma decisão liminar da Justiça que ordenou o órgão a aprovar a transferência do controle societário da distribuidora de energia do Amazonas para a Âmbar, empresa da holding J&F.

Em reunião extraordinária convocada por causa da ordem judicial, os diretores apresentaram visões divergentes sobre a necessidade de se cumprir a decisão de 1ª instância da Justiça do Amazonas que obrigou a autarquia a aprovar o negócio conforme o plano proposto pela Âmbar no fim de junho.

Ricardo Tili, relator do caso, e Fernando Mosna votaram por não acatar o cumprimento, por avaliar que já existia uma decisão anterior do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), uma instância superior, que anularia a ordem da juíza do Amazonas desta semana.

Já Agnes da Costa e o diretor-geral, Sandoval Feitosa, votaram por cumprir a decisão judicial, conforme sugerido pela Procuradoria da Aneel, mas, em vez de aprovar os termos colocados pela Âmbar em junho, deixar em aberto a possibilidade de a empresa apresentar uma proposta mais adequada.

"Não tenho o que proclamar, porque não temos decisão. Então, é mais um processo... já pedi um contato direto da 1ª Vara Federal do Amazonas para comunicar à magistrada que não conseguimos chegar a um resultado", disse Feitosa, ao fim da deliberação do processo.

Segundo análises da área técnica e da Procuradoria da Aneel, a proposta inicial da empresa de energia dos irmãos Batista para assumir a concessionária de distribuição do Amazonas é desfavorável aos consumidores de energia de todo o país, ao embutir custos bilionários desnecessários na conta de luz, e está em desacordo com determinações de uma medida provisória sobre o tema editada pelo governo federal.

Procurada, a Âmbar afirmou que "segue confiante" na aprovação pela Aneel de uma nova solução apresentada pela empresa nos últimos dias, "por ser a mais favorável para a população do Amazonas, os consumidores de energia de todo o país e a União".

Os diretores da Aneel chegaram a comentar sobre o novo plano da Âmbar em reunião nesta sexta-feira, mas ponderaram que a agência não teve tempo de fazer uma ampla análise ele.

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Na última proposta, os custos aos consumidores se reduziriam a 14 bilhões de reais, e a dívida da Amazonas teria uma redução já nos primeiros anos, com um aporte de capital de 2 bilhões de reais até o fim deste ano e mais 4,5 bilhões em 2025.

A empresa da J&F apresentou uma proposta para assumir a Amazonas Energia depois da publicação de uma medida provisória com várias ações consideradas essenciais para garantir a sustentabilidade econômico-financeira da distribuidora amazonense, que soma mais de 11 bilhões de reais em dívidas e corre risco de perder o contrato de concessão.

O negócio vinha sendo analisado pela Aneel nos últimos meses, mas a decisão judicial desta semana acelerou o processo, diante da possível perda de validade da medida provisória, que expira em 12 de outubro.

Conforme a proposta da Âmbar entregue em junho, e que foi rejeitada pala área técnica da Aneel, os consumidores de energia de todo o país arcariam com um custo de quase 16 bilhões de reais na conta de luz, em 15 anos, para ajudar na recuperação econômico-financeira da distribuidora do Amazonas. Esse valor é o dobro da quantia considerada suficiente pelos técnicos do órgão regulador.

Também nesta sexta-feira, a Aneel adiou uma decisão sobre uma mudança nos contratos de energia firmados entre a Amazonas Energia e usinas termelétricas locais, atualmente controladas pela Eletrobras mas em processo de venda para a Âmbar.

A ideia é que esses contratos, que hoje são bilaterais e sofrem com uma elevada inadimplência por parte da Amazonas, sejam convertidos em contratos de energia de reserva, custeados pelos consumidores de todo o país via conta de luz. Essa seria uma forma de reduzir a sobrecontratação da distribuidora amazonense, situação criada por uma série de distorções do setor e decisões tomadas nos últimos anos.

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NA DIRETORIA

Embora não tenham chegado a um acordo, os diretores da Aneel foram unânimes em criticar a decisão judicial do Amazonas, vendo nela uma interferência do Judiciário na autonomia e competência do órgão para julgar um processo estritamente técnico.

Durante a reunião, o diretor Tili, afirmou que a Aneel foi colocada em uma situação "extremamente embaraçosa".

"... Valendo-se de autonomia na tomada de decisões por parte da agência reguladora, e estando o agente público vinculado ao Princípio da Legalidade, não vejo como conciliar a decisão que obriga a agência a aprovar um plano claramente ilegal, que afetará não só os consumidores do Amazonas, mas de todo o Brasil", disse Tili em seu voto.

Já o diretor-geral afirmou que a Aneel "foi colocada à prova".

"A escolha de um concessionário de distribuição pelos próximos 30 ano é uma decisão difícil, complexa, temos dificuldade de analisar cenários em um prazo tão logo, quem dirá em 48 horas", disse Feitosa, se referindo ao prazo conferido pela liminar.

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Ele lembrou, porém, que a não aprovação de um plano de transferência de controle da Amazonas Energia pode criar problemas ainda maiores para os consumidores locais e de todo o país no futuro, já que as alternativas são extinção da concessão e intervenção por parte do regulador.

O novo impasse ocorre em meio a um desfalque na diretoria da Aneel, com a quinta cadeira vaga desde a saída de Hélvio Guerra, em maio, sem que o Ministério de Minas e Energia tenha indicado um nome para assumir o posto. A falta de um quinto diretor tem levado a empates na votação de vários processos do setor elétrico, sendo que outros sequer são pautados para deliberação.

(Por Letícia Fucuchima)

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