"A prosperidade dos países ricos não existiria sem os países pobres", defende Thomas Piketty
A revista L'Obs desta semana traz uma longa entrevista com o economista Thomas Piketty. Um dos intelectuais franceses mais celebrados no exterior, ele retraça em um novo livro a história da repartição de riquezas no mundo e denuncia mais uma vez as desigualdades.
Em "Une brève histoire de l'égalité", que chega às livrarias na próxima semana, Piketty traz uma compilação de seus estudos, conhecidos por terem influenciado pesquisadores em vários países. O economista, cujas ideias inspiraram a esquerda norte-americana e principalmente o ex-presidente Barack Obama, detalha em pouco mais de 300 páginas a evolução do processo de concentração de riquezas nas mãos de um pequeno grupo da sociedade, em um sistema que "corrompe as nossas democracias", resume a revista L'Obs.
Na entrevista, Piketty explica que o mundo assiste, desde o final do século 18, a um movimento profundo rumo à igualdade social, econômica e política. Ele lembra que, "historicamente, foi o combate pela igualdade que permitiu a prosperidade, principalmente graças a um acesso maior à educação e ao saber".
No entanto, o economista lamenta que a liberalização das movimentações de capitais sem nenhuma contrapartida fiscal ou social tenha impedido um progresso maior e mais acelerado. "Inventamos um direito quase sagrado de se enriquecer utilizando as infraestruturas de um país, de suas escolas, etc, e em seguida de transferir sua fortuna para outro lugar deixando a conta para o restante da população pagar", afirma. "Esse sistema não criou nenhuma riqueza", insiste. "A circulação de investimentos não é algo negativo em si, mas deve ser acompanhada de transparência e justiça fiscal", pontua.
Piketty se refere à economia contemporânea, com multinacionais aproveitando de um sistema fiscal vantajoso, como os gigantes da internet ou empresas como L'Oréal, Total e LVMH, mas também à história, mencionando como exemplo a exploração colonial da França na Argélia ou no Haiti. O intelectual defende que, como parte dos judeus foram ressarcidos pela espoliação durante a guerra, os países colonizados deveriam ser indenizados por seus colonizadores para evitar o sentimento de "dois pesos, duas medidas".
Sistema de ajuda internacional ineficaz
"Como discutir a taxação das multinacionais e dos bilionários sem refletir sobre o direito legítimo de os países pobres se desenvolverem?", questiona o economista, que contesta os sistema de ajuda internacional em vigor. Segundo seus cálculos, esses dispositivos oferecem fundos com valores "de quatro a cinco vezes inferiores aos lucros obtidos em seguida por grupo ocidentais" nesses mesmos países. Sem falar dos danos ambientais, muitas vezes incalculáveis.
Para ele, a solução passa por "um verdadeiro sistema de partilha das receitas baseado no tamanho das populações". Afinal, frisa Piketty, "cada ser humano deveria ter o mesmo direito a um mínimo de saúde, educação e desenvolvimento". Além disso, ele insiste que "a prosperidade dos países ricos não existiria sem os países pobres".
Em seu livro, Piketty defende o que qualifica de "uma forma de socialismo democrático, descentralizado, participativo, autogerido, feminista, mestiço e ecológico". Pois, segundo ele, "se não fizermos nada (para mudar), esse sistema indecente vai acabar explodindo na nossa cara".
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