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Moro vê 'inércia muito grande' dos políticos no combate à corrupção

18/10/2017 01h37

O juiz federal Sergio Moro afirmou que Operação Lava-Jato, sozinha, não será capaz de acabar com a corrupção no Brasil e que enxerga "uma inércia muito grande" da classe política no combate a esse crime.


Moro deu as declarações em entrevista concedida na manhã da terça-feira (17), em Curitiba, e que foi ao ar pela GloboNews à noite.


Para Moro, a Lava-Jato tem "começo, meio e fim", mas novos casos de corrupção vão surgir, exigindo novas investigações. "Não temos a ilusão de que vamos acabar com a corrupção, mas ajudamos a reduzi-la. A questão é que a Justiça, a polícia, o Ministério Público não conseguirão acabar com a corrupção sem que os políticos adotem um discurso reformista", disse.


Segundo Moro, sistemas de corrupção como os encontrados pela Lava-Jato precisam ser combatidos por ações da classe política. "Será que nossas lideranças não vão trabalhar para acabar com o uso do loteamento político que leva à corrupção? Elas precisam ter um papel mais forte para evitar a repetição da Lava-Jato com outro nome no futuro, e hoje eu vejo uma inércia muito grande", afirmou.


Abaixo, outros trechos da entrevista:


Balanço da Lava-Jato - "A operação começou em março de 2014 e houve muito imprevistos, mas temos várias condenações, vários presos e pessoas que jamais imaginávamos que pudessem ir para a cadeia. A Lava-Jato ajudou a diminuir a impunidade e isso é muito positivo. Um bom governo pode ser competente e honesto. Esse trabalho que vem sendo feito pelas instituições envolvidas levará à percepção de que a corrupção nos deixa para trás."


Importância do mensalão - "A ação conhecida como 'mensalão' foi um momento muito importante na história política e jurídica porque o Supremo Tribunal Federal (STF) tomou uma decisão difícil, condenou por corrupção e lavagem de dinheiro pessoas que ocupavam altos cargos, gente poderosa. Teve um efeito importante, porque serviu de exemplo e precedente da Lava-Jato, com postura mais rígida no combate aos crimes."


Operação-abafa - "Sempre existem os que vivem desse sistema [corrupto]. E existem os que têm a ousadia de tentar frear os processos da Lava-Jato. Isso é vergonhoso. Frear o combate à corrupção, porém, não tem tido sucesso, embora haja retrocessos. O discurso contra a corrupção encontram respaldo da opinião pública e da imprensa."


Delação premiada - A colaboração premiada consiste em usar o que um criminoso sabe para alcançar seus pares. Há no mundo todo. O que não significa que não possa haver equívocos, mas não podemos tomar a parte pelo todo. Temos de tomar cuidado com propostas legislativas que não querem aprimorar, mas sim extinguir essa ferramenta. Proibir que uma pessoa presa faça a delação premiada é um desses absurdos. A questão é que as pessoas aceitam a colaboração soltas ou presas, mas sempre quando percebem que estão em situação processual difícil e aceitam a delação. A maioria das delações foi firmada com acusados que estavam em liberdade. A prisão antes do julgamento é uma forma de impedir que as pessoas que praticam corrupção sistemática e reiterada, por anos. É preciso usar um recurso drástico para impedir que essas pessoas não continuem a prejudicar a sociedade. Houve casos em que pessoas respondiam no mensalão enquanto cometiam crimes descobertos pela Lava-Jato. Se isso não é motivo para prender alguém, não sei o que seria. E fomos rápidos em julgar para evitar injustiças."


Prisão em segunda instância - "Houve uma percepção do STF que a impunidade e a corrupção sistêmica andam juntas, estimulando a criminalidade. Em 2016, ao relatar a matéria, o ministro Teori Zavascki [morto em 2017] mostrou que os poderosos manipulavam o sistema para não serem condenados, aproveitando da demora até a tramitação na última instância. Acredito que os ministros serão sensíveis e manterão a execução da pena a partir da segunda instância. A partir das provas cabais recolhidas em primeira e segunda instância, não se está indo contra a presunção de inocência ao se executar a pena, mas sim impedindo que recursos garantam a impunidade."


Lula - "É uma pergunta complicada para se responder [sobre Lula]. Ele já foi condenado uma vez e há casos pendentes aqui em Curitiba, então não fico confortável para comentar. Sobre as provas, tudo o que eu pensava , divulguei na sentença e não vejo necessidade de falar publicamente sobre o assunto.


Foto com Aécio - "Sobre a foto com o senador Aécio Neves, fui num evento público da revista IstoÉ e ocasionalmente nossas cadeiras ficaram próximas. Não tem nenhum processo dele sob minha responsabilidade. A foto sugere mais do que ela significa. Ela na verdade não significa nada."


Lava-Jato está perto do fim? - "O que vejo é que parcelas importantes dos casos foram enviados a outros juízos, e que investigações importantes apareceram até fora da Lava-Jato, como no Rio de Janeiro. A investigação se espalhou e dá uma resposta vigorosa. Do ponto de vista da Lava-Jato em relação à Petrobras, há coisas relevantes ainda, mas boa parte dos trabalhos já foi feita. Vários diretores da Petrobras, intermediadores, lavadores e dirigentes de empresas envolvidas já foram julgados e presos. Mas o que apresenta foro privilegiado está no STF e, portanto, fora de Curitiba. Então já percorreram um bom caminho."


Candidatura política - "Pesquisas que incluem meu nome como candidato a presidente em 2018 estão perdendo tempo. A carreira política é bonita, representar a sociedade, seus eleitores, mas entendo que há outras formas de influenciar positivamente e minha escolha foi pela magistratura. Não existe a perspectiva de eu migrar para a política. Não tenho essa vocação. Não há empecilho administrativo, mas não é minha opção."