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Dilma 'estreia' em Davos em meio a pessimismo sobre o Brasil

22/01/2014 13h51Atualizada em 22/01/2014 14h55

Pela primeira vez em seis anos, o encontro anual da elite política e econômica mundial na estação de esqui suíça Davos, que começa nesta quarta-feira (22), acontece em meio a um certo otimismo, com boas previsões de recuperação das economias avançadas.

Países desenvolvidos como Reino Unido e Estados Unidos, que passaram mais de meia década patinando em recessões e com baixos índices, têm perspectiva de crescer 2,8% e 2,4% em 2014, respectivamente, segundo previsões divulgadas nesta semana pelo FMI.

Já o Brasil chega ao encontro nadando contra essa maré de otimismo --em um momento de pouca confiança dos investidores internacionais com o futuro de diversos países emergentes, cujo crescimento está desacelerando. Pela primeira vez desde 2003 um presidente brasileiro vai ao Fórum Econômico Mundial.

Analistas ouvidos pela BBC Brasil dizem que a presidente Dilma Rousseff vai para Davos com a missão de desfazer um pouco do pessimismo que tomou conta de grande parte de empresários e banqueiros estrangeiros nos últimos anos. Muitos teriam perdido crença na capacidade do governo de gerir a economia e voltar a crescer acima de 3%.

Acompanhada da equipe econômica e do ministro Guido Mantega, Dilma passará parte da quinta-feira em Davos, quando haverá um debate intitulado "A crise de meia-idade dos BRICS" [bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul].

Dois públicos

"Não há dúvidas de que existe hoje uma completa falta de confiança no Brasil no mercado financeiro internacional", diz Richard Lapper, diretor do serviço FT Confidential, de pesquisa em mercados emergentes.

Ele faz a ressalva de que existem dois públicos distintos em Davos, e que o pessimismo por ora só se manifesta em um deles: os investidores do mercado financeiro, que há três anos amargam mais prejuízos que ganhos comprando e vendendo títulos do governo e ações em bolsa.

"Não tenho dúvida de que algumas dessas pessoas não querem mais saber do Brasil. É como se tivesse havido um grande caso de amor, e agora o clima é de fim de namoro."

Segundo Lapper, outro público de Dilma são os diretores de multinacionais que promovem investimentos externos diretos no Brasil, como instalação e ampliação de fábricas. Este grupo tende a olhar "o copo meio cheio" da economia brasileira, já que a renda média das classes mais baixas continua subindo e o desemprego é baixo.

"Se você olhar os investimentos externos diretos (IED) nos últimos anos, eles se mantêm fortes. O Brasil atraiu quase US$ 60 bilhões em IED em 2013. O boletim Focus do Banco Central prevê que em 2014 não será um valor muito menor que esse."

Para o diretor do FT Confidential, o perigo para o futuro Brasil é que o pessimismo do mercado financeiro afete as decisões das pessoas responsáveis por investimentos diretos no Brasil. Por ora, o pessimismo ainda está concentrado no mercado financeiro.

"Mas isso poderia mudar se empresas como Proctor & Gamble, Unilever, L'Oreal, Toyota e Ford pararem de acreditar na história do Brasil, e passem a acreditar que o país vai parar de crescer."

Diálogo com setor privado

Para Stephen Rose, diretor da LatinCo, empresa britânica que auxilia instituições europeias a investir no Brasil, o pessimismo com o Brasil é um pouco exagerado, mas investidores estão certos em questionar a capacidade do governo de trabalhar com a iniciativa privada.

"O problema maior é que todo mundo fala em pessimismo o tempo todo. Para as pessoas que estão interessadas em investir, que é o meu negócio, isso é o que fica", diz Rose.

Para ele, os investidores acham que o Estado ainda tem um papel grande demais na economia, intervindo em diversos mercados - desde o preço da gasolina e eletricidade à margem de lucro de concessionárias públicas e de bancos privados.

"Existe um setor privado que precisa lucrar. Existe um elemento capitalista na nossa economia. Dilma precisa conversar, ouvir e trabalhar com esse setor. É isso que ela precisa dizer (em Davos), se quiser chegar a qualquer lugar. Não faz sentido ela tentar impor ao setor privado o que ela acha que está certo para a economia."

Para Irene Mia, diretora de América Latina e Caribe da consultoria britânica Economist Intelligence Unit (EIU), há limites no que Dilma pode falar em Davos em relação à crítica de que há excesso de intervenção estatal. Uma das reivindicações de vários analistas - de pôr fim aos subsídios estatais à gasolina - ameaçaria outra ponto que também está na mira do mercado, que é a inflação.

"No caso da Petrobras, se o governo quer controlar a inflação, ele precisa manter um limite nos preços da gasolina. Eles conseguem manter o preço baixo, que é bom para a economia, mas isso gera um problema fiscal e outro problema para a Petrobras, que fica sem dinheiro para investir na sua produção."

Macroeconomia e crescimento

Para a diretora da EIU, os investidores não acreditam que o governo está comprometido o suficiente com o tripé macroeconômico: superávit das contas públicas, inflação próxima ao centro da meta e câmbio flutuante.

A percepção é de que a dívida pública, os preços gerais da economia e a cotação do dólar não estão em níveis satisfatórios para aumentar e sustentar o crescimento do PIB.

"O que os investidores querem ouvir é que o governo está controlando a economia e sabe administrá-la. E também eles querem ser assegurados de que o Brasil ainda está aberto para negócios."

"Nós não devemos esperar que ela chegue em Davos e reconheça 'desculpe, nós sabemos que não temos sido muito consistentes em macroeconomia'. Isso não é nem da personalidade de Dilma. Ela provavelmente vai se concentrar nos aspectos positivos do seu governo, de redução de pobreza, de desemprego, entre outros temas."

Os três analistas acreditam que há sinais recentes de que os investidores estariam dispostos a acreditar mais no Brasil e no governo Dilma. Eles citam o leilão do campo de Libra em outubro passado com uma das conquistas do governo, que atraiu um compromisso grande de investimentos de gigantes como Shell e Total.

"O fato de Dilma ir a Davos é bastante importante. É um sinal de um certo desespero do Brasil de dizer ao mundo que o país está aberto para negócios e que há bom potencial para investimentos. E sendo sincero, ainda há muitas oportunidades", diz Mia.

Rose acredita que os investidores internacionais estão abertos a mudar de opinião.

"Eu acho que há o começo do sinal de mudanças. Há o começo de um pequeno otimismo no Brasil", diz ele. "Há pessoas indo a Davos que pensam: 'será que o pessimismo atual não é exagerado?'"