Crescimento menor, meta de gastos: o que esperar para a economia em 2024?
O ano de 2023, perto do fim, terminará com um saldo positivo na economia. Especialistas destacam que o crescimento do país deve superar os 3%, número consideravelmente maior do que os 0,6% projetados pelo mercado no início do ano. A inflação acumulada dos últimos 12 meses está em 4,68%, dentro da meta estipulada pelo governo. Ainda que continue alta, a Selic termina 2023 em 11,75%, com mais sinalizações de cortes no próximo ano. Mas, para 2024, o cenário não deve se repetir e espera-se uma economia mais estagnada. Veja abaixo o que dizem os economistas.
PIB crescerá menos em 2024
O governo federal estima que o crescimento de 2023 seja de 3%, mas deve ser menor ano que vem. No início do mês, quando os dados do PIB do terceiro trimestre foram divulgados e mostraram uma alta de apenas 0,1%, o ministro da Fazenda Fernando Haddad reafirmou a projeção de crescimento de 3% e disse esperar 2,5% para 2024 — número acima da atual projeção da pasta, que é de 2,2%.
O crescimento de 2023 "surpreendeu", avaliam economistas, principalmente por causa do agronegócio. No início de dezembro, quando foi divulgado o PIB do terceiro trimestre, o IBGE frisou que o grande destaque do ano foi o crescimento no setor, com alta de 8,8% em relação a 2022. Produtos como o milho (alta de 19,5%), cana-de-açúcar (13,1%), algodão herbáceo (12,5%) e café (6,9%) também foram destaque.
O Brasil também voltou em 2023 para a lista das dez maiores economias do mundo. No último dia 19, o FMI (Fundo Monetário Internacional) do ranking do ano. O país aparece em 9º lugar, com um PIB estimado em US$ 2,13 trilhões em 2023. Os dados são do relatórios mais recentes do World Economic Outlook (Perspectiva Econômica Mundial, na tradução).
Além disso, a agência de risco S&P (Standard & Poor's) melhorou a nota de crédito do Brasil. O país saiu da nota BB-, três níveis abaixo do grau de investimento, para a nota BB.
Mas 2024 não deve apresentar um PIB tão robusto. Claudio Considera, coordenador do Núcleo de Contas Nacionais (NCN) da FGV Ibre, diz que o próximo ano será mais complicado por questões como equilíbrio fiscal e investimentos.
O governo vai continuar buscando equilíbrio fiscal e vai aumentar gastos. Não pode cortar gastos correntes, de forma que deve cortar onde é possível. Analistas estão prevendo crescimento entre 0,6% e 1,2%. Eu não faço previsões, a gente calcula no Ibre o monitor do PIB. O que a gente apurou é que o quarto trimestre [de 2023] deve ter economia estagnada.
Claudio Considera, coordenador do Núcleo de Contas Nacionais (NCN) da FGV Ibre
Para os juros, que impactam diretamente o crescimento do país, o mercado projeta uma Selic em 9,5% para o fim de 2024. Genilson Junior, head de investimentos da Conta Black, acredita que o Brasil fez um bom trabalho no aumento da taxa em um momento que a alta era necessária para conter a inflação. "Fizemos a lição de casa cedo aumentando a taxa de juros. Quando os EUA aumentaram, no começo de 2022, houve uma preocupação. A gente entrou primeiro e está saindo antes do que outros, reflexo de 2023 menos conturbado", explica.
Os embates com o Congresso
A reforma tributária, uma das principais pautas do governo federal, foi aprovada no último dia 15. Trata-se da primeira reforma tributária do país em mais de 30 anos. Apesar de todo o trabalho político feito para a aprovação da reforma, a vitória foi esmagadora, já que o tema era quase que consensual.
Mas a aprovação fácil de reformas não necessariamente se repetirá em 2024. Alessandra Ribeiro, economista da consultoria Tendências, pondera que o debate sobre fontes de arrecadação, sobretudo por meio de impostos, enfrentará dificuldades no Legislativo.
Um exemplo recente é a derrubada do veto da desoneração da folha de pagamento no último dia 14. No dia 23 de novembro, o presidente Lula (PT) vetou o PL do deputado Efraim Filho (União Brasil-PB), que previa a prorrogação do benefício para 17 diferentes setores da economia. A desoneração, que tem caráter temporário, terminaria em 31 de dezembro deste ano, mas foi prorrogada até 2027. Tanto Lula como Haddad argumentaram na ocasião que a medida não havia impactado criação de empregos. Além disso, a medida custa R$ 9 bilhões à União, aponta o Ipea.
Na nossa avaliação, o governo está correto, é uma medida pouquíssimo eficiente que custa muito. O governo estava certo, mas a gente viu o posicionamento do Congresso. Isso dá um pouco a tônica de 2024, essas batalhas vão ser mais difíceis para o governo. Isso vai impactar, principalmente, as contas públicas. É um cenário difícil para o governo do ponto de vista fiscal, porque vai ter dificuldade de andar com essa agenda de aumento de arrecadação. Ao mesmo tempo, com permissão de aumento de gastos pelo novo regime fiscal, não vai conseguir fechar a conta.
Alessandra Ribeiro, economista da consultoria Tendências
A corrida pelo déficit zero
O ministro Fernando Haddad não abriu mão da meta do déficit zero no Orçamento de 2024. O tema, no entanto, não é consensual — o próprio presidente Lula chegou a dizer que o governo dificilmente alcançaria a meta. O déficit zero está previsto no arcabouço fiscal e significa, basicamente, um equilíbrio nas contas públicas.
Haddad reiterou o compromisso, mesmo após a fala de Lula. Mas há descrença sobre a possibilidade real da meta ser atingida. Alessandra explica que, ainda assim, é importante que a Fazenda se mantenha firme porque isso direciona esforços para que o déficit zero seja atingido de alguma forma.
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Quero receberSe você não cumpre a meta, há mecanismos de ajuste já previstos no arcabouço fiscal que precisam ser acionados. Se você muda a meta, não aciona os gatilhos e nunca gera a correção, esse é o problema. Muito ruim mudar a meta mesmo ela não sendo factível, porque você começa a tirar credibilidade do que foi construído do regime fiscal. Se mudar para 2024 vai ter que mudar 2025 e 2026. Por isso é tão ruim, vai ser desafiador, uma batalha dura especialmente para o Haddad.
Alessandra Ribeiro, economista da consultoria Tendências
A economista também avalia que a economia deva desacelerar em 2024. Tanto pela questão fiscal, como pelo ambiente político mais difícil e mesmo por um menor impacto do agro, que deve crescer menos.
O ano também deve ser de muita incerteza. Genilson, da Conta Black, explica que será mais possível ver como as coisas vão caminhar mais no início do ano. Muitas metas podem acabar flexibilizadas, a depender inclusive de fatores externos.
O mercado, segundo o Boletim Focus, acredita que a Selic deva chegar em 9,25%. Isso vai depender da economia, inflação, geração de emprego. Se tudo correr conforme esperado, com inflação dentro da meta, acho que o Brasil pode atingir a meta. Mas pode acontecer alguma coisa que ninguém está esperando durante o ano, um fato externo, como foi a guerra entre Rússia e Ucrânia, ou mesmo o conflito na Palestina, -- que gerou muita preocupação mas acabou que não teve grande impacto para o Brasil.
Genilson Junior, head de investimentos da Conta Black
Brasileiros esperam um 2024 melhor
Apesar das ponderações dos especialistas, os brasileiros estão mais otimistas para 2024. A mais recente pesquisa Radar Febraban, realizada pelo Ipespe (Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas) com duas mil pessoas, entre os dias 29 e 2 de novembro, nas cinco regiões do país, apontou que quase seis em cada dez entrevistados (59%) acreditam que o Brasil vai melhorar em 2024, quatro pontos a mais que no mesmo período de 2022 (55%), pouco antes do novo governo assumir.
Entre os pessimistas, houve recuo. Eram 26% e na edição mais recente do levantamento, totalizaram 17% dos entrevistados, uma queda de nove pontos. Para 49% dos brasileiros o país está melhor do que no ano passado. É o maior percentual da série histórica no intervalo de 12 meses e representa um salto de dez pontos em relação a dezembro de 2022.
30% avaliam que o país está igual (antes eram 25%). E, por fim, 20% acreditam que o Brasil está pior (antes eram 34%). Antonio Lavareda, presidente do Conselho Científico do Ipespe, diz que o otimismo reflete o balanço positivo de 2023.
Os resultados desta edição de dezembro refletem o balanço positivo de 2023 e o otimismo com a chegada do novo ano. Isso está em linha com a melhora da percepção sobre sua vida pessoal, o que se pôde ver, por exemplo, com menor expectativa de inflação e a queda na perspectiva de endividamento, para o que deve ter contribuído o Programa Desenrola, apoiado pelos bancos. O sentimento das pessoas oscilou ao longo do ano, o que é natural, mas terminar o ano olhando para a frente com melhores expectativas pode ajudar a influenciar de forma benigna 2024.
Antonio Lavareda, presidente do Conselho Científico do Ipespe
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