Felipe Salto

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Opinião

O Rio Grande do Sul precisa de nós

É muito bonito constatar que a solidariedade e a fraternidade tomaram conta de todas as regiões do país nos últimos dias. A comoção perante à situação de calamidade no estado do Rio Grande do Sul faz-nos lembrar de que é possível ter esperança na vida em comunidade. Os gaúchos precisam de todos nós, neste momento, e cada um deve agir como puder para salvar vidas e reconstruir o RS.

Na Warren Investimentos, empresa que nasceu em Porto Alegre, temos nos mobilizado, principalmente, a partir da iniciativa de uma das fundadoras da empresa, Kelly Gusmão. Ela tem comandado ações de distribuição de mantimentos, água e itens de primeira necessidade. Além disso, organizou uma campanha para receber doações (acompanhe seu perfil no Instagram para saber mais — @kellyjgusmao). Muitos brasileiros e brasileiras estão fazendo o mesmo. É bonito de ver, em meio à tragédia, a fé, a esperança e a caridade em operação.

Os Poderes Públicos também estão conseguindo responder à altura, lançando mão dos instrumentos já previstos nas leis e na Constituição para angariar e transferir os recursos necessários ao governo do Rio Grande do Sul e à prefeitura de Porto Alegre e das cidades afetadas. A Constituição de 1988, nesse aspecto, é precisa. O parágrafo 3° do artigo 167 contempla a possibilidade de edição de créditos extraordinários ao Orçamento anual aprovado pelo Congresso em situações como as de calamidade ou guerra.

A saber:

"§ 3º A abertura de crédito extraordinário somente será admitida para atender a despesas imprevisíveis e urgentes, como as decorrentes de guerra, comoção interna ou calamidade pública, observado o disposto no art. 62."

É assim que não há qualquer impedimento à edição de medidas provisórias de crédito extraordinário, até porque o artigo 62, referenciado no dispositivo acima transcrito, garante ao presidente da República a prerrogativa de gastar mais, de modo extraordinário e por medida provisória, nas situações especificadas. O desafio é a articulação adequada entre as três esferas federativas e a mobilização tempestiva de recursos para diferentes tipos de ações em cada fase da reconstrução do RS.

Em um primeiro momento, deparamo-nos, ainda, com a necessidade de levantar e guarnecer os abrigos e os hospitais. É preciso também ter o contingente de profissionais de resgate, bombeiros treinados, etc. para resgatar as famílias. Numa segunda frente, a reconstrução de estradas, casas, prédios e equipamentos públicos, sem mencionar o cuidado com as pessoas que possam ter se contaminado por conta das enchentes, vai demandar mais recursos e capacidade de mobilização desse dinheiro da maneira mais eficiente possível.

Eu acho incrível que existam pessoas capazes de partidarizar ou, politizar, se preferir, as ações no bojo da tragédia do Rio Grande do Sul. Felizmente, uma minoria. Tem prevalecido a força da solidariedade, da compaixão, da empatia e, por que não, o peso da federação, na prática, como um grande movimento de ajuda e apoio, independentemente de questões políticas. A tragédia ambiental, social e humana do Rio Grande do Sul é uma questão de todos nós, como coletividade e como nação, mas também de cada um de nós.

O governador Eduardo Leite está se dedicando integralmente a organizar as ações necessárias para salvar vidas, evitar novas mortes e planejar a reconstrução do estado. As chuvas ainda não cessaram, entretanto, o que torna mais difícil a tarefa. O desafio é pensar e forjar o futuro enquanto ainda se busca equacionar o caos presente.

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Há uma linha estratégica que busca resolver outros problemas fiscais e financeiros do Rio Grande do Sul, notadamente, as questões que tocam à gigantesca e histórica dívida do estado com a União. Não vejo como combinar uma boa solução para a dívida daquele Estado ao mesmo tempo, em que se faz necessário ajudar a população afetada, com urgência e intensidade, a partir do regramento vigente. A solução para a dívida é complexa e precisará ser discutida com cautela e em conjunto com os demais Estados, de preferência, no âmbito do Conselho de Gestão Fiscal (CGF), estrutura federativa prevista na Lei de Responsabilidade Fiscal. Chegou a hora de tirar o CGF do papel.

Já se avançou no sentido de interromper as exigibilidades do Regime de Recuperação Fiscal (RRF), por decisão do seu Conselho Supervisor, pelo período de trinta dias. Em paralelo, seguem as decisões do STF, que já haviam determinado, antes do desastre, a interrupção do pagamento do serviço da dívida (juros e amortizações). É um caminho perigoso misturar as estações. Não precisamos tomar esse risco de "soluções" açodadas no tópico do endividamento, se a própria Constituição e as leis em vigor garantem a execução de gastos, sem qualquer limitação, no caso do enfrentamento de situações de calamidade como a atual.

O risco é tomar a direção de um acordo com efeitos fiscais preocupantes para o conjunto da sociedade, como no programa "Juros por Educação", um bom slogan, mas até o momento vazio de significado prático e recheado de riscos fiscais, como apontei em seminário organizado na semana passada pelo jornal Valor Econômico.

A dívida dos Estados demanda soluções estruturais e pensadas para cada realidade. O estouro da tragédia ambiental, social e econômica no RS, precisa ser endereçada na esteira da solidariedade individual e coletiva, com ações concretas, rápidas e municiadas por quantias suficientes de dinheiro público. Não tenho dúvida disso e acho que, até o momento, as autoridades estão atentas a isso. Temos, entretanto, de evitar propostas que acabem ambicionando resolver questões fiscais estruturais em um momento em que ninguém terá condições de construir algo que pare de pé.

Vamos separar as coisas, dar todo apoio ao governador do Rio Grande do Sul, meu amigo Eduardo Leite, uma das lideranças que mais inspira confiança neste momento em nosso país, deixando para um segundo momento o debate da dívida dos Estados. O foco, agora, a meu ver, precisa ser a viabilização dos créditos extraordinários da União e das ajudas diretas, como as que ocorreram nos últimos dias, vindas de vários estados. Destaque-se a chegada do Navio-Multipropósito Atlântico, com um potencial enorme para ajudar o Rio Grande do Sul.

O site do governo do RS explica que: "Além de ser uma embarcação utilizada para ações de defesa, o Navio-Multipropósito Atlântico é adequado para a realização de missões de ajuda humanitária. Entre os principais equipamentos que serão trazidos pelo navio ao RS estão duas estações de tratamento de água, capazes de produzir um total de 20 mil litros por hora. (…) O Atlântico conta com infraestrutura composta por uma unidade de tratamento intensivo com dois leitos, uma banheira termal para aquecimento ou resfriamento, uma sala de trauma, um centro cirúrgico, um consultório odontológico, um laboratório, dois consultórios médicos, uma enfermaria com oito leitos, uma farmácia completa, uma recepção e uma sala de espera".

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É por essa direção que temos de seguir, evitando a tentação de avançar sobre temas pendentes de solução há décadas e que não deveriam ser tratados, agora, em meio a tantas complicações e dificuldades impostas pela tragédia. O momento é de solidariedade, de exercitar o amor ao próximo e o sentimento de pertencimento e de fraternidade.

Todo o apoio aos nossos irmãos gaúchos e gaúchas! Façamos a nossa parte!

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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