Felipe Salto

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Opinião

50 dólares: de grão em grão, a galinha enche o papo

A discussão sobre a revogação da isenção tributária para compras internacionais até US$ 50 deve ser feita a sério, longe do clamor das redes sociais. Estão em jogo a proteção da indústria nacional e a recuperação de receitas importantes para a estratégia de política fiscal do ministro Fernando Haddad.

O projeto de lei que trata do programa Mover, voltado à indústria automotiva, foi modificado para contemplar a tributação das compras internacionais de pequeno valor, hoje isentas do Imposto de Importação. Aprovado no dia 28 de maio pela Câmara, resta ainda tramitar no Senado.

A saber, a alíquota atual do Imposto de Importação é de 60%, mas restrita a valores superiores a US$ 50. Promover a mera revogação, vale dizer, implicaria adotar essa mesma alíquota para os itens hoje importados sem recolhimento do tributo.

Na semana passada, o Congresso resolveu incorporar uma proposta de alíquota de 20% para os itens de pequeno valor. Uma medida correta, a meu ver, em razão dos efeitos esperados para a economia nacional e as contas públicas.

A competitividade da indústria é dada por diversos fatores: custo da mão de obra, qualidade da infraestrutura logística, inserção do país nas cadeias globais de valor, nível de investimentos em tecnologia e inovação, treinamento dos trabalhadores, qualidade do sistema tributário, tamanho e forma dos subsídios e políticas industriais adotadas pelos governos, competitividade, entre outros. A isenção para produtos importados com similar produzido pelas empresas brasileiras não tem razão de ser, pois não colabora em nenhuma dessas frentes e ainda prejudica o Erário.

Pode até ser popular para determinados nichos da sociedade, mas faz sentido permitir importações sem tributos e sem controle?
O economista Gabriel Garrote e eu fizemos alguns cálculos, na Warren Investimentos, para avaliar a questão. Com base nas declarações de imposto publicadas no site da Receita Federal, sabemos que, em fevereiro e março deste ano, o Imposto de Importação foi de R$ 328 milhões. Assim, o fluxo tributado, isto é, de compras acima de US$ 50, teria sido de R$ 547 milhões. Sabemos, ainda, que, nesses dois meses, o volume total comercializado foi de R$ 2,650 bilhões. Logo, as compras abaixo de 50 dólares, em fevereiro e março, teriam sido de R$ 2,103 bilhões.

Anualizando essas contas, temos um volume total estimado em compras abaixo de US$ 50 igual a R$ 13,143 bilhões (já considerando, na conta, a distribuição do Imposto de Importação ao longo dos meses, que não é linear ou homogênea). Assumimos, ainda, que o consumo também deve reagir negativamente ao aumento de preço, supondo que o novo tributo de 20% deva ser repassado para o preço final.

Sabemos também que as importações representam cerca de 12% do consumo dos brasileiros, na média. Assim, chegamos a uma redução potencial de 3,2% nas importações e aplicamos esse percentual sobre o volume de R$ 13,1 bilhões para atingir R$ 12,7 bilhões estimados.

Dadas todas essas hipóteses, seria possível arrecadar, em termos anualizados, com uma alíquota de Imposto de Importação de 20%, R$ 2,5 bilhões. Para 2025, incrementando a projeção pela evolução do PIB esperado, chega-se a R$ 2,7 bilhões.

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Parece pouco, quando lembramos o tamanho do desafio fiscal do atual governo, que enfrenta, neste momento, a tarefa de zerar o déficit público entregue no ano passado (de R$ 230,5 bilhões), mas, de grão em grão, a galinha enche o papo.

Além disso, a medida protegerá os produtores nacionais de bens similares que hoje têm de competir com importações isentas. O resultado, a médio prazo, poderá ser benéfico não apenas para o desenvolvimento da produção local, como também da arrecadação tributária, tendo em vista o aumento da oferta, venda final e faturamento das empresas.

Noves fora a bagunça causada por um debate torto estimulado por redes sociais da esquerda e da direita desinformadas, a medida é muito positiva e precisa avançar. É muito bom que o presidente do Senado Federal, o senador Rodrigo Pacheco, já tenha indicado horizonte próximo para sua apreciação, após a aprovação pela Câmara, em 28 de maio.

O Ministro Geraldo Alckmin sinalizou, em entrevista à BandNews (31 de agosto), que o presidente Lula não vetará a tributação de 20% para as compras até US$ 50. Também lembrou dos efeitos esperados com o projeto Mover, da ordem de R$ 130 bilhões em novos investimentos nos próximos anos.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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