Todos a Bordo

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Reportagem

Acidente aéreo com Renato Aragão quase impediu que Os Trapalhões existissem

Em setembro de 1958, um acidente aéreo em Campina Grande (PB) poderia ter mudado o rumo do humor na TV brasileira. Um avião da extinta companhia aérea Lóide Aéreo Nacional caía durante a madrugada, levando a bordo Renato Aragão, intérprete do personagem Didi, que estrelou "Os Trapalhões".

Histórico do voo

O voo 652, realizado pela extinta companhia aérea Loide Aéreo Nacional, decolou do Rio de Janeiro na madrugada do dia 5 de setembro de 1958. A aeronave utilizada era um Curtiss C-46 Commando, e tinha como destino a cidade de Fortaleza, no Ceará.

No caminho, foram feitas escalas em Vitória (ES), Ilhéus (BA), Salvador (BA), Aracaju (SE), Maceió (AL) e Recife (PE). O avião ainda passaria por Campina Grande (PB) antes de seguir para concluir a viagem do dia.

Entretanto, nessa última etapa, o avião não conseguiu pousar, se acidentando.

Última etapa

Em Recife, Renato Aragão, então um jovem estudante de Direito de apenas 23 anos, embarcou no voo para voltar à cidade de Fortaleza. Ele falou do acidente para a gravação do documentário "Nosso Querido Trapalhão", que celebrou os 50 anos de carreira do humorista.

O intérprete da personagem Didi disse que participava dos jogos universitários em Recife, jogando futebol. Ele estava com um colega, que jogava basquete e, assim como o humorista, não passou da primeira fase da competição.

Foi naquele dia que eles embarcaram em Recife com destino ao Ceará, mas sequer conseguiram concluir a escala em Campina Grande.

A queda

Na noite daquele 5 de setembro de 1958, o Curtiss C-46 Commando de matrícula PP-LDX se aproximava do aeroporto de Campina Grande. Uma forte névoa reduzia a visibilidade, o que atrapalhou a primeira tentativa de pouso.

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Segundo o relato constante no livro "O Rastro da Bruxa - História da aviação comercial brasileira no século XX através de seus acidentes", de Carlos Ari César Germano da Silva (Editora da PUC-RS), foi feita uma arremetida e nova tentativa de pouso. Dessa vez, optou-se por voar em torno do aeroporto em uma baixa altura em relação ao solo para tentar se aproximar usando referências visuais.

A altitude mínima de voo naquela região era de 647 metros, mas o avião estava a 520 metros de altitude. Nesse momento, em uma nova tentativa de pouso, uma das asas do avião bateu em um morro, e se soltou do corpo da aeronave.

O avião caiu na sequência, se destroçando na queda. A bordo estavam 18 pessoas, e treze morreram, incluindo o comandante e o radiotelegrafista do avião.

O relatório final apontou erro do piloto como uma das causas do acidente, já que ele teria adotado um procedimento impróprio durante o voo. Ainda, contribuiu a informação meteorológica incorreta repassada aos pilotos.

Curtiss C-46 'Super C' da California Central Airlines no ano de 1957: Modelo era o mesmo usado pela Lóide Aéreo Nacional
Curtiss C-46 'Super C' da California Central Airlines no ano de 1957: Modelo era o mesmo usado pela Lóide Aéreo Nacional Imagem: Bill Larkins

Renato Aragão lembra do acidente

O humorista relembrou o exato momento do acidente em seu depoimento. "Ele [o avião] quebrou a asa, quebrou a cauda, e eu fiquei nessa parte que sobrou. Aí, pronto... Eu de cabeça pra baixo, pancada, cadeira, voando", disse Aragão, lembrando que também se feriu na cabeça.

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Foi aí que eu vi um quadro horroroso, com muita gente morta, muita gente ferida, pessoas incendiando, gente ajudando.
Renato Aragão, sobre o acidente aéreo que sobreviveu em 1958

Ele, então, procurou seu colega e, ao encontrá-lo, se abraçaram e rezaram de joelhos, lembra, para agradecer por estarem vivos. Aragão disse que eles ficaram no local ajudando aos demais, e quando tudo ficou mais calmo, buscaram entender onde é que estavam e o que estavam fazendo ali.

Avião ainda foi saqueado

Em um certo momento, Renato Aragão e seu amigo ficaram sentados aguardando ajuda. Foi quando eles ouviram barulhos na mata, de pessoas abrindo caminho com facão.

Ele reconheceu que era uma multidão, mas que estavam chegando para saquear o avião. "Os primeiros que vieram era para saquear, com facão, tirando a aliança de pessoas que já tinham morrido. Meu colega quis ir para cima, mas eu falei que não: 'Ele está com o facão na mão'", relatou o humorista.

O colega de Aragão, então, deu uma ideia: de seguirem pela clareira aberta na mata, pois ela deveria dar em algum lugar.

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Eu nunca andei tanto numa vereda na minha vida pra chegar lá. Andei muito, andei com mato batendo. A gente sabia que era por ali, até por estar com a visão mais acostumada.
Renato Aragão

No ano seguinte, o humorista já tinha voltado a voar.

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