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No sul da Bahia, a indicação geográfica valoriza o cacau

Coaraci (Bahia)

26/12/2019 10h38

Com olhar atento, Henrique Almeida observa um técnico abrir com precisão 100 grãos de cacau antes de colocá-los em uma bandeja de madeira, enquanto um colega coleta amostras em sacos, para verificar se esse lote está de acordo com a indicação geográfica "Sul da Bahia", uma esperança para os agricultores em crise.

"A produção de cacau fino e a criação da indicação geográfica transformam nossa atividade em algo rentável e impulsionam a região", explica à AFP o agricultor de 63 anos, de uma família de cultivadores de cacau e que adquiriu em 2006 a fazenda centenária de Sagarana, de 60 hectares em Coaraci, sul da Bahia.

Antes dedicado à produção de cacau comum, destinado à indústria de chocolates, Henrique Almeida, como outros produtores do sul da Bahia, optou por melhorar a qualidade de seu cacau para poder continuar sua atividade. Essa mudança começou após a doença da "vassoura-de-bruxa" que reduziu drasticamente, a partir de 1989, a produtividade dos cacaueiros baianos, que cobriam até 86% da produção nacional.

"Quando comprei a fazenda, os preços do cacau comum estavam baixos, e os cacauicultores estavam desanimados, enquanto o mercado do chocolate andava bem. Comecei a fazer cacau fino para fabricar meu próprio chocolate de origem e agregar valor ao meu produto", ressalta o produtor.

Cacau mais bem remunerado

Assim, ele estabeleceu um método de produção preciso e mais longo do que para o cacau comum. Depois de colher e abrir os frutos e classificar os grãos de qualidade, ele os coloca para fermentar em cubas de madeira por sete a oito dias, misturando a cada 24 horas para deixar o aroma do chocolate se formar. Depois, leva os grãos para secar ao sol por vários dias, cobrindo-o em caso de forte calor, ou chuva.

Esses esforços valem a pena: em média, o cacau fino, como aqueles com o selo de indicação geográfica, é pago entre 40% e 160% a mais do que o cacau comum.

O cacau fino agora responde por quase metade de sua produção, e 40% desses grãos de qualidade atendem às especificações de indicação geográfica "Sul da Bahia".

Registrado pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) em abril de 2018, essa IG é fruto de um longo trabalho, iniciado há dez anos por Henrique Almeida e outros produtores de cacau fino, além de cooperativas e pesquisadores, depois que criaram a "Associação Cacau Sul da Bahia" (ACSB), para definir as regras relativas à produção.

Regras de qualidade, sociais e ambientais

Segunda indicação geográfica atribuída ao cacau brasileiro, depois do da região de Linhares, no estado do Espírito Santo, registrada em 2012, e antes da de Tomé-Açu, no início de 2019, estabelece critérios qualitativos mais rigorosos.

"Não queríamos uma simples certificação mostrando a herança histórica e cultural do cacau na região. Queríamos uma certificação para defender a qualidade desse produto e proteger o meio ambiente e os direitos sociais do povo, era também o jeito de nos diferenciar", diz a bióloga Adriana Reis, cofundadora da ACSB.

Os lotes de cacau candidatos para indicação geográfica devem apresentar pelo menos 65% de grãos totalmente fermentados, com um teor de umidade inferior a 8% e menos de 3% de defeitos internos (mofo, insetos, germes).

Para verificar o cumprimento dessas regras, os produtores enviam uma amostra para o Centro de Inovação do Cacau, um laboratório independente criado em 2017. Se o resultado for positivo, os técnicos da ASCB realizam um teste visual no local e enviam uma segunda amostra do mesmo lote para o laboratório.

A associação também controla o monitoramento do sistema de produção agroflorestal, a fim de proteger a Mata Atlântica, sob a qual os cacaueiros crescem, e garantir o cumprimento das normas trabalhistas.

Desde abril de 2018, 25 produtores já certificaram 40 toneladas de cacau com a indicação de origem, ou 15% das 300 toneladas de cacau fino produzidas no sul da Bahia, quantidade que deve aumentar, principalmente agora que o chocolate fabricado com cacau IG também poderá ostentar o rótulo.

"Para convencer mais produtores do interesse da IG, temos que convencer os compradores a pagar mais. Esse ano, criamos um QR code para melhorar a rastreabilidade do produto, que passa a ser mais exigida pelos consumidores", ressalta Adriana Reis.