As semelhanças e diferenças entre as reformas da Previdência do Brasil e da Argentina
Sob intensos protestos, o Congresso da Argentina aprovou na segunda-feira (18) uma polêmica reforma em seu sistema previdenciário, que muda a forma como se reajustam os benefícios sociais de estimados 17 milhões de argentinos.
Foi uma importante vitória política do presidente Mauricio Macri, patrocinador do projeto --aprovado por 127 votos a favor, 117 contra e duas abstenções.
Enquanto isso, no Brasil a votação da reforma da Previdência é alvo de intensa negociação entre o governo Michel Temer e o Congresso, que adiou a análise do tema para fevereiro.
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Na Argentina, aposentadorias, pensões e benefícios eram até então reajustados semestralmente a partir de índices como evolução dos salários e arrecadação previdenciária. A reforma prevê que o aumento passe a ser regido pelos índices de inflação auferidos trimestralmente.
"O que fizemos foi garantir, nos próximos anos, uma fórmula que defenda os aposentados do pior mal que sofremos, a inflação, contra a qual lutamos, mas não conseguimos vencer", afirmou Macri.
Críticos, no entanto, argumentam que a mudança resultará em perdas para os aposentados --a aprovação foi seguida de amplas manifestações e uma greve geral.
"O projeto é perverso de A a Z, prejudica o conjunto do povo argentino. Por isso gerou reação em todos os lados, menos neste recinto (em referência ao Congresso)", afirmou o deputado opositor Agustín Rossi.
Nas redes sociais, usuários brasileiros destacaram a forte onda de protestos registrada na Argentina, comparando-a às reações populares à reforma daqui.
Se por um lado a reforma aprovada no país vizinho é mais restrita do que a que se planeja aplicar no Brasil, o cenário político e econômico dos dois países guarda semelhanças.
Veja, a seguir, o que há em comum ou não nos esforços governamentais de reforma, aqui e lá:
Diferenças
Reformas de alcances distintos
A reforma argentina focou sobretudo na mudança como se reajusta o benefício previdenciário, que passa a ser vinculado majoritariamente à inflação trimestral, em vez de a um índice que combinava reajustes salariais e arrecadação.
Para compensar as perdas que serão sofridas no período de transição das regras, o governo prometeu um bônus único adicional de até 750 pesos (cerca de R$ 140) a cerca de 10 milhões de aposentados --algo que foi criticado como "irrisório" por sindicatos e oposição.
Analistas afirmam que Macri tenta preservar seu capital político para as demais reformas, como a tributária, que também está tramitando no Congresso.
No Brasil, a atual proposta em discussão tem alcance mais amplo: prevê idade mínima para se aposentar (65 para homens e 62 para mulheres), tempo mínimo de contribuição para se ter direito ao benefício (15 anos na iniciativa privada e 25 para servidores públicos), o fim do benefício apenas por tempo de serviço e limites à aposentadoria integral, restrita apenas a quem contribuir por 40 anos.
É uma das principais bandeiras do governo Temer, mas enfrenta forte resistência no Congresso. Na semana passada, depois de muitas idas e vindas, o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), declarou que a análise do tema ficaria para fevereiro.
Macri mais fortalecido
Outra importante diferença é o momento político dos governos brasileiro e argentino.
Macri viu sua popularidade ser afetada pelo recente desaparecimento do submarino ARA San Juan, com 44 tripulantes a bordo, e pelas falhas de comunicação da Marinha argentina durante o episódio.
Mas, segundo pesquisa encomendada pelo jornal "Clarín" no final de novembro, cerca de 54% da população mantém a aprovação ao governo --queda de 5 pontos percentuais em relação ao início de governo, em janeiro de 2016, porém em patamar ainda elevado.
Temer, por sua vez, vive um momento bem mais delicado --usou seu capital político para angariar apoio para enterrar duas denúncias contra si em decorrência da delação premiada da JBS.
Isso, somado à baixa popularidade do presidente --segundo levantamento mais recente do instituto Datafolha, ele é rejeitado por 71% da população-- e à proximidade das eleições gerais de 2018, tem tornado mais difícil angariar apoio para uma reforma polêmica.
Semelhanças
Deficit crescente e crise persistente
Aqui e lá, os dois governos defendem que reformas são essenciais para combater enormes rombos nas contas públicas.
Na Argentina, segundo a agência Reuters, a meta de Macri é diminuir o deficit fiscal para 3,2% do PIB (Produto Interno Bruto) no ano que vem, contra os 4,2% deste ano, além de reduzir a inflação para um patamar entre 8% e 12% - atualmente, está em cerca de 20% ao ano.
Um informe do Instituto Argentino de Análise Fiscal estimou que, com a reforma, ao final de 2019 a aposentadoria argentina estará em média 8% menor, gerando uma economia de estimados US$ 4 bilhões no ano que vem.
No Brasil, o escopo da Reforma da Previdência é alvo de debate acalorado entre economistas, mas não há dúvidas de que a situação econômica seja delicada: o governo federal tem registrado rombos bilionários nas contas públicas desde 2014, reflexo da perda de arrecadação e do contínuo aumento das despesas obrigatórias, entre elas o regime de aposentadorias e pensões.
O Ministério do Planejamento calcula que, mantidas as regras atuais, os gastos do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) representarão 58% das despesas primárias do governo federal (excluindo juros com a dívida) do governo federal em 2022.
Impopularidade de reformas
Outra similaridade é a impopularidade das reformas. Por mais que esteja disseminada a ideia de que mudanças são necessárias para conter o escalonamento dos gastos públicos, é difícil obter um consenso sobre quem deve sofrer com os cortes.
Na Argentina, a votação foi seguida de enfrentamentos entre manifestantes e policiais nas ruas, com um saldo de 200 feridos e dezenas de pessoas detidas, além de panelaços em diversos bairros de Buenos Aires e a convocação de uma greve, que afetou os transportes e o comércio.
No Brasil, pesquisa de maio do Datafolha apontou que 71% das pessoas se opõem a uma reforma previdenciária, rejeição que sobe para 83% entre funcionários públicos.
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