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Brasil só é menos vulnerável que Argentina entre 18 emergentes, diz estudo

Camilla Veras Mota

Da BBC News Brasil em São Paulo

08/06/2018 18h38

A chance de o Brasil viver uma crise como a da Argentina --apesar do susto com a disparada do dólar nos últimos dias-- é pequena. A parcela em dólar da dívida brasileira é marginal, o déficit em transações com outros países é pequeno e a inflação, que costuma ser pressionada quando o real desvaloriza, está controlada.

Ainda assim, a situação está longe de ser confortável. Entre as 18 principais economias emergentes, o país ocupa a segunda pior posição no ranking de vulnerabilidade feito pelo coordenador de economia aplicada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV), Armando Castelar, com base em índice feito pelo Fed, o Banco Central americano, em 2016.

Dois anos atrás, o Fed tentava identificar as economias mais suscetíveis ao aperto nas condições financeiras externas, logo após os EUA subirem seus juros pela primeira vez em uma década.

Desde então, o indicador mostrou correlação forte com a desvalorização cambial das moedas desses países. Ou seja, quanto pior a posição, maior seria a perda de valor em relação ao dólar.

A arrancada da moeda americana no Brasil nos últimos dias tem um componente, contudo, que foge do escopo das variáveis do indicador: o pessimismo em relação à política, personificado pela incerteza em relação às eleições e pela solução encontrada pelo governo para a greve dos caminhoneiros.

Na quinta-feira (7), depois de bater R$ 3,96, a cotação fechou o pregão a R$ 3,92. Nesta sexta-feira (8), depois de o Banco Central intervir no mercado de câmbio, anunciando injeção adicional de R$ 20 bilhões em contratos de dólar na próxima semana para aumentar a oferta de moeda americana, a cotação recuou para perto de R$ 3,70.

Cenário externo adverso

De forma geral, o dólar ganha força quando o banco central americano sobe os juros. O movimento torna os títulos americanos mais rentáveis e estimula a saída de moeda dos mercados considerados mais arriscados, como os emergentes.

O ciclo de alta nos juros dos EUA, contudo, foi mais lento do que se esperava, e apenas agora os efeitos para os quais os economistas chamavam atenção em 2016 estão tomando forma de maneira mais concreta.

Desde março, o dólar ficou mais caro em praticamente todos os emergentes. As maiores desvalorizações, se considerado o acumulado em 2018, aconteceram na Argentina, na Turquia e no Brasil, nessa ordem.

"A mudança no ambiente externo também inclui a ameaça de guerra comercial entre EUA e China, a retirada dos EUA do acordo nuclear com o Irã --que, ao lado da crise na Venezuela, pressiona os preços do petróleo--, a política na Itália, na Espanha. Tudo isso gera ainda mais aversão ao risco", avalia Castelar.

O indicador de Fed, que o economista atualizou com dados mais recentes, compila seis variáveis: saldo em conta corrente (o resultado das transações do Brasil com outros países), dívida pública bruta, inflação média trienal, variação trienal do crédito bancário para o setor privado, razão entre dívida externa e exportações, e reservas internacionais.

O Brasil tem uma situação melhor do que a maioria de seus pares nos indicadores relacionados ao setor externo. Ele tem o pior desempenho, contudo, quando se compara a dívida pública dos 18 países.

"O problema do Brasil é fiscal (o desequilíbrio das contas do governo) e o baixo crescimento", diz o economista.

A volta do dólar a R$ 4

A composição do desempenho do Brasil tem duas leituras possíveis. De um lado, a chance de uma crise financeira no curto prazo - como vivem Argentina e Turquia - é pequena.

As reservas do país em moeda americana somam mais de 20% do Produto Interno Bruto (PIB), a parcela em dólar da dívida pública é pequena e o déficit em transações correntes (as trocas com outros países) é o menor em muitos anos, compensado pela entrada de investimento direto estrangeiro.

De outro, nossos problemas domésticos acendem um sinal amarelo sobre a recuperação da economia, com chance de que o cenário de desemprego alto e crescimento baixo se prolongue por mais tempo que o previsto.

"A chance de crise é pequena no sentido de que não vai faltar dólar. O Brasil tem espaço para acomodar os choques porque tem um inflação controlada, mas isso não quer dizer que não pode haver estresse social", ele destaca.

Se as incertezas em relação às eleições se concretizarem, no próximo governo, em uma eventual crise de confiança em relação ao risco de crédito do setor público --por uma piora da situação fiscal, por exemplo--, o Brasil pode assistir a uma corrida para longe do real, com consequências amargas para a economia.

No cenário atual, contudo, "o dólar já subiu o que tinha que subir", ele avalia. O componente político das eleições - que não está mensurado pelo indicador - pode exercer pressão sobre o câmbio nos próximos meses --ou seja, o dólar pode ficar mais caro--, mas a chance de que haja uma arrancada como a dos últimos meses é pequena.

O economista da Capital Economics Edward Glossop concorda com a avaliação. Sua estimativa atual para o dólar no fim de 2018 está em R$ 3,80, mas ele admite que deve reavaliar para algo mais próximo de R$ 4 devido à desvalorização rápida dos últimos dias --que ele atribui majoritariamente às questões internas do país.

Uma parte, ele pondera, se deve à falta de clareza sobre as propostas dos atuais pré-candidatos à presidência - ausência de sinais mais diretos em relação ao compromisso com o reequilíbrio das contas públicas, por exemplo.

"Também teve a greve de caminhoneiros. O mercado ficou preocupado com a solução dada pelo governo, com o sinal que ela dá em relação à política fiscal", diz o economista, referindo-se aos subsídios liberados pela União ao diesel em um momento em que a capacidade de gastar é limitada.

Cristiano Oliveira, economista-chefe do banco Fibra, acredita que a Copa do Mundo deve dar um respiro na tensão das últimas semanas. "Depois disso, as eleições vão ganhar as ruas", avalia o especialista, que também atribui a disparada do dólar nesta semana à "contaminação eleitoral".

A partir de então, o mercado estará atento à comunicação dos candidatos com os eleitores e à agenda de propostas, ele afirma, especialmente em relação à reforma da Previdência, ao equacionamento do déficit orçamentário do governo e às medidas para retomar o crescimento e impulsionar a produtividade.