Produtores africanos não conseguem alimentar população crescente
(Bloomberg) -- Josephine Mbinya se abaixa para recolher feijões do solo negro de sua pequena propriedade ao sul de Nairóbi, a capital do Quênia, e joga-os em uma pilha ao lado do campo.
"Dependemos da agricultura para suprir todas as nossas necessidades", disse Josephine, 52, uma viúva que também cultiva tomate e milho e cria gado para manter dois filhos, duas filhas e um neto.
"Quando a colheita não é boa, às vezes não há comida. A única forma de sobreviver é vender um dos animais".
Como boa parte da fatia de 80% dos agricultores da África que operam com menos de dois hectares de terra, Josephine enfrenta a falta de financiamento, de irrigação apropriada, de fertilizantes e de maquinários.
As restrições à posse de terras em alguns países também desencorajam o cultivo, tanto em grande quanto em pequena escala.
Como a produção alimentícia em outras partes do mundo está perto do limite, superar essas restrições será fundamental para alimentar a população global que, segundo previsão da ONU (Organização das Nações Unidas), aumentará para 9,7 bilhões em 2050, contra os atuais 7,3 bilhões.
Dados do Banco Mundial apontam que a produção agrícola no continente aumentou 4,2% em 2014, acima da média de 2,3% ao ano da década de 1980, mas ainda abaixo da meta de crescimento anual de 6% estabelecida pelas autoridades africanas em 2003.
O rendimento médio da safra africana continua abaixo da metade da média global. No caso do milho, os ganhos de produtividade têm sido marginais, ficando aquém dos de outros continentes.
Apesar de contar com cerca de 60% das terras cultiváveis não trabalhadas do mundo, o continente gasta cerca de US$ 40 bilhões ao ano com importação de alimentos, segundo a Aliança por uma Revolução Verde na África (Agra, na sigla em inglês), uma organização sem fins lucrativos de Nairóbi que auxilia pequenos agricultores.
"A vontade política de melhorar o desenvolvimento agrícola está aumentando, mas ainda não chegou aos níveis necessários", disse Joachim von Braun, economista agrícola da Universidade de Bonn que é membro do conselho da Agra, em mensagem enviada por email.
Os países africanos precisarão aumentar a mecanização, gastar mais em estradas rurais e em outros tipos de infraestrutura e melhorar o acesso dos agricultores ao financiamento e ao treinamento e também aos direitos sobre a terra, disse ele.
Mesmo com um acesso maior a fertilizantes e irrigação, existem limites ao que os pequenos agricultores conseguem cultivar, e os países africanos precisarão atrair mais investimento estrangeiro para ampliar a produção mecanizada de alimentos, segundo Ernst Janovsky, chefe do setor de agronegócio do Barclays Africa.
Em sua opinião, os limites à propriedade estrangeira de terras em muitos países são o maior obstáculo para a atração de capital estrangeiro.
"Apesar de a África ter um grande potencial agrícola e do fato de que se pode ganhar muito dinheiro lá, não se pode conseguir investimentos ou captar financiamento tendo as terras como garantia", disse ele, de Johannesburgo.
"É difícil, também, obter acordos de arrendamento negociáveis em caso de o investidor querer sair ou acordos que sejam suficientemente longos para render um retorno adequado sobre o investimento. Alguns projetos agrícolas podem levar até 10 anos para devolver o dinheiro investido".
Duncan Vink, codiretor da UFF Agri Asset Management, que assessora a seguradora Old Mutual em seus fundos de investimento agrícolas na África, ainda enxerga muito potencial no continente.
A UFF mira retornos anuais 10% acima da taxa de inflação nas fazendas que o fundo compra e arrenda.
"Há 54 países na África, ou seja, uma infinidade de opções", disse ele, da Cidade do Cabo.
"Os governos estão cada vez mais abertos ao investimento. O principal problema que enfrentamos com a expansão é convencer os investidores estrangeiros a subirem a bordo".
Reformas do Brasil
Os países africanos podem aprender com o Brasil, que tem clima, topografia e solo similares a algumas regiões da África.
O Brasil se transformou em uma superpotência agrícola há mais de quatro décadas implementando um plano integrado para aumentar a produtividade, segundo a PricewaterhouseCoopers.
A chave para o sucesso do país foi a realização de reformas pelo governo que melhoraram o clima de investimento e permitiram o florescimento do setor privado, disse a empresa de contabilidade, em um relatório divulgado em dezembro do ano passado.
Para Josephine, cuja propriedade rende 13 caixas de tomate, 1,4 tonelada de milho e nove sacas de feijão nos anos bons, o clima favorável é a chave para alimentar a família.
"Quando há chuva suficiente nós ficamos felizes, porque sabemos que teremos uma boa colheita", disse ela.
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