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Britânicos solicitam passaporte francês por medo do 'Brexit'

Angeline Benoit

19/04/2016 14h31

(Bloomberg) -- Os britânicos na França estão perdendo a tranquilidade.

Louise Garavaglia, que mora na França há mais de duas décadas, está correndo para solicitar o passaporte francês antes do referendo de 23 de junho no Reino Unido sobre o "Brexit" e não tem tempo para "esperar para ver". O consultor financeiro Paul Johnson-Ferguson, que trabalha em Paris, mandou traduzir sua certidão de nascimento para solicitar a cidadania francesa.

Faltando apenas dois meses para o referendo que determinará se o Reino Unido permanecerá na União Europeia, parte do total estimado em 1,2 milhão de britânicos como Garavaglia e Johnson-Ferguson que moram e trabalham nos outros 27 estados-membros da UE estão preocupados com o que uma possível saída significará para suas situações nos países onde residem. Alguns estão correndo para conseguir garantias de que não vão ter que mudar de vida.

"Há riscos que você não pode se dar ao luxo de correr quando a vida da sua família e o seu sustento estão em jogo", disse Garavaglia, 47, em entrevista por telefone. Casada com um francês, ela tem dois filhos franco-britânicos e é dona de uma escola de idiomas em Paris.

"Se o Reino Unido sair da UE, eu posso acabar sendo tratado como qualquer outro estrangeiro por aqui, nunca se sabe", disse Johnson-Ferguson, que mora em Maisons Laffitte, na Grande Paris, desde 1998. "Eu não desejo particularmente ser francês, mas sou avesso ao risco, por isso prefiro cobrir minhas apostas".

Revisão de privilégios?

Se o referendo encerrar a adesão do Reino Unido à UE, o direito dos britânicos de permanecer, trabalhar e ter acesso a aposentadoria, saúde e serviços públicos nos países do bloco estarão dentro de uma longa lista de assuntos a serem negociados com um atraso de dois anos estabelecido pelo Artigo 50 do tratado da UE. Se as negociações fracassarem, é possível que esses privilégios não sejam mantidos, segundo um memorando do governo do Reino Unido publicado em 29 de fevereiro.

Assim como as empresas, os indivíduos tentam entender o que uma possível saída poderia significar para eles. O temor é perceptível nas grandes comunidades britânicas da Espanha, da Irlanda, da França e da Alemanha, os quatro países-membros da UE que, segundo a Organização das Nações Unidas, abrigam o maior número de cidadãos do Reino Unido, totalizando cerca de 852.000.

"Para muitas pessoas, se você obtém dupla cidadania você deixa de ter dificuldades", disse Christopher Chantrey, presidente do conselho do Comitê da Comunidade Britânica, órgão que representa residentes britânicos na França. "A incerteza é enorme".

As cartas enviadas aos governos francês e britânico pedindo diretrizes sobre o assunto ficaram sem resposta, disse ele. Não há dados recentes disponíveis sobre os pedidos britânicos de cidadania ou residência permanente na França, disse uma porta-voz do Ministério do Interior francês, que pediu para não ser identificada devido à política do governo. O processamento das candidaturas demora pelo menos um ano, disse ela.

Aposentados preocupados

Para muitos aposentados britânicos, que moram há muito tempo em outro país da UE, muito coisa está em jogo.

É o caso de Brian Cave, 83, por exemplo. Ele e a esposa se mudaram há 18 anos para Gourdon, no sul da França, para ter paz, tranquilidade, beleza natural e uma casa mais barata do que no Reino Unido. Cave, ativista pelos direitos dos aposentados britânicos que moram no exterior, diz que o Brexit se tornou a questão mais urgente para o seu grupo chamado Pensioners Debout!, ou Aposentados de pé!

Os aposentados que moram na UE correm o risco perder a cobertura de saúde, bem como o risco de ter suas pensões congeladas, disse ele. As estatísticas do Reino Unido mostram que 470.000 pensões foram pagas em outros países da UE, em agosto de 2015, segundo os últimos dados disponíveis.

Os milhares de aposentados britânicos que nunca trabalharam no país da UE que escolheram para morar após a aposentadoria e esperam pagamentos mensais do Departamento do Trabalho e Pensões do Reino Unido podem ter que acabar atravessando o canal para obter cobertura de saúde se o Brexit acontecer, disse Chantrey.

"A vida é capaz de mudar totalmente se o Brexit ocorrer", disse Cave. "Eu fui contatado por centenas de pessoas que estão pensando em voltar a morar no Reino Unido"