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Opinião: Problema de dívida da China não vai desaparecer

Christopher Balding

08/08/2016 15h34Atualizada em 10/08/2016 12h18

(Bloomberg) -- Durante muito tempo, havia um estereótipo recorrente sobre a economia da China: se o crescimento começasse a desacelerar significativamente, segundo essa ideia, os prudentes tecnocratas de Pequim poderiam impulsioná-lo com um estímulo fiscal e manteriam as instituições financeiras do país à tona. Junto com dados oficiais otimistas sobre os déficits, essa ideia soava tranquilizadora por um tempo.

No entanto, agora a realidade está interferindo asperamente. As contas públicas da China estão em pior forma do que se imagina. E, à medida que os níveis de endividamento aumentam e a economia continua lenta, a capacidade do governo de estimular o crescimento parece cada vez mais precária. Sem uma reforma, esta situação terá consequências nefastas.

De acordo com o Fundo Monetário Internacional, projeta-se que a China vai registrar um déficit orçamentário moderado neste ano, de 3 por cento do produto interno bruto, com uma carga de dívida gerenciável igual a 46,8 por cento da economia, no centésimo lugar do ranking de 184 países. À primeira vista, então, a China parece bem posicionada para lidar com uma desaceleração.

Mas a situação é mais complexa do que parece. O número geral usado pelo FMI cobre apenas a dívida do governo central, sem incluir a de províncias e municipalidades. Como mais de 80 por cento do gasto público da China é efetuado por governos locais, esta é uma omissão importante. Supondo que esses governos tenham incorrido na máxima carga de dívida estatutária no ano passado -- 16 trilhões de yuans ao todo -- o total de empréstimos públicos dobra, com um aumento de 47 por cento do PIB.

No entanto, até mesmo essa suposição é generosa. Uma análise realizada pelo Escritório Nacional de Auditoria da China em 2013 concluiu que a dívida em circulação era de 18 trilhões de yuans. Em outras palavras, a dívida já excedia o limite estatutário de 2015 três anos atrás. E, de lá para cá, as finanças locais só pioraram. O FMI estimou no ano passado um déficit fiscal total de 10 por cento do PIB. O Goldman Sachs recentemente colocou-o em torno de 15 por cento. Esses números são gigantescos: eles sugerem um nível de déficit total equivalente ao dos EUA durante a crise financeira de 2008 -- talvez pior.

E mesmo assim eles não revelam o verdadeiro montante. Governos locais que tentam evadir os limites de dívida muitas vezes garantem empréstimos fora do balanço (explicitamente ou não) e criam empreendimentos estatais para realizar projetos em seu nome. No ano passado, suas obrigações cresceram tão notoriamente que Pequim precisou arquitetar um resgate e ordenou um swap de dívida com bancos estatais.

Além disso, investidores e empresas de classificação de crédito têm dificuldades para estabelecer uma distinção clara entre a dívida governamental e a privada. Pressupõe-se na China que o governo está por trás da maior parte da dívida de empresas estatais com empreendimentos estratégicos ou com outras firmas favorecidas. E os investidores tenderam a acreditar que o governo respaldará a maioria dos grandes projetos ou empresas.

Por enquanto, eles têm acertado: apesar do aumento dos calotes, o governo não permitiu a quebra de nenhuma grande empresa por medo de desencadear uma crise. Mas as tensões estão aumentando no sistema bancário da China, e como a dívida pública é um problema mais grave do que os dados oficiais indicam -- e continua crescendo --, o governo está cada vez mais apertado.

Diversos passos poderiam ser dados por Pequim para arrumar essa bagunça. Desalavancar deveria ser o primeiro. Limitar o quanto os governos locais podem tomar emprestado simplesmente estimula novos meios criativos de esconder a dívida, o que na verdade faz com que seja ainda mais difícil controlá-la. Seria mais efetivo -- embora menos atraente do ponto de vista político -- permitir que as empresas zumbi quebrem, desacelerar a taxa de investimento e aceitar que o PIB cresça mais lentamente.

Mas parece que Pequim está rezando para o multiplicador keynesiano, na esperança de que, com ainda mais estímulos, poderá crescer para se livrar dos problemas, como fez há uma década. Mas o período posterior ao 2000 foi ímpar, porque a China entrou na Organização Mundial do Comércio, o crescimento mundial elevava as receitas de exportação e os orçamentos se corrigiam magicamente. O governo precisa aceitar que é improvável que essa história se repita.

Se não fizer isso, a inadimplência crescente, os déficits de dois dígitos e um sistema financeiro raquítico vão contribuir para uma mistura cada vez mais volátil. Os investidores pessimistas que projetam desvalorizações em grande escala e crises bancárias compreendem os riscos que historicamente acompanharam um desregramento assim. Como o crédito da China não pode se expandir infinitamente, ele precisa parar -- por opção ou à força.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial nem da Bloomberg LP e de seus proprietários.