IPCA
0,83 Abr.2024
Topo

Não é preciso ser negativo com juros abaixo de zero

Piotr Skolimowski e Catherine Bosley

10/08/2016 10h36

(Bloomberg) -- Mark Carney pode estar enganado.

O presidente do Banco da Inglaterra disse na semana passada que não é "fã" das taxas de juros negativas e que não tinha intenção de adotar taxas abaixo de zero, diferentemente de seus colegas da Europa e do Japão. Aliás, ele os acusou de adotarem uma postura "um pouco errada".

O argumento de Carney: alguns bancos elevaram os juros das hipotecas em resposta à decisão dos bancos centrais de adotar taxas negativas.

Mas o que pode ser correto para os bancos, individualmente, não vale para toda a zona do euro, formada por 19 países. Na verdade, a transmissão da política monetária do Banco Central Europeu nunca funcionou melhor na última década -- apesar da taxa de depósito de menos 0,4 por cento, segundo cálculos de David Mackie, economista do JPMorgan.

O truque do presidente do BCE, Mario Draghi, é um "pacote abrangente" de medidas de estímulo que também engloba aquisições de ativos da ordem de 80 bilhões de euros por mês e empréstimos de longo prazo aos bancos para estimular o crédito a empresas e famílias.

"A combinação de QE soberana e TLTROs (operações de refinanciamento de longo prazo direcionadas) garantiu um pass through maior das mudanças na taxa básica para as mudanças nas taxas de depósito e de crédito de varejo dos bancos do que se poderia esperar com base na experiência passada", escreve Mackie em nota técnica.

Mackie está utilizando dados sobre as taxas de depósito e de crédito de varejo dos bancos publicados pelo BCE desde 2003. Seu período de referência cobre o ciclo de aperto do banco, de novembro de 2005 a setembro de 2008, e a fase de cortes de juros até maio de 2010 que veio a seguir.

Durante esse período, entre 50 por cento e 75 por cento das mudanças nas taxas de juros chegaram à economia real. Desde maio de 2014, mês anterior à primeira vez que Draghi testou o terreno abaixo de zero, o pass through aumentou muito.

O declínio das taxas de empréstimos foi mais acentuado no caso dos novos negócios, com queda de 1,07 ponto percentual da taxa média ponderada, segundo o JPMorgan. Uma taxa comparável para negócios existentes caiu 0,7 ponto percentual. As taxas de depósito de varejo também tiveram um declínio maior que a referência do BCE.

"A experiência da zona do euro sugere que o pass through da taxa de juros continua sólido, mesmo quando o nível das taxas de juros é baixo", diz Mackie. "O Banco da Inglaterra deveria se consolar com isso".

Com QE e um programa de empréstimos já em vigor, o que poderia dar errado, sr. Carney?