Análise: Ainda restam motivos para cautela do BC com juros?
(Bloomberg) -- A aprovação da medida que limita o crescimento dos gastos do governo foi recebida de maneira positiva, mas sem festa, no mercado.
A expressiva vitória do governo Temer, aprovando a PEC sem alterações e com 58 votos a mais do que o necessário, amplia a chance de o Copom cortar a Selic em 0,5 ponto percentual na semana que vem. Mas a incerteza com os juros do Fed (Federal Reserve, banco central norte-americano) pode ser um dos fatores que seguem travando um pouco esta aposta mais otimista.
A aprovação da PEC ocorreu da "melhor maneira possível" e completa as condições citadas pelo próprio BC para aliviar a política monetária, diz Thiago Carlos, do UBS Brasil.
O economista lembra que as outras duas condições citadas pelo BC já tinham melhorado antes, com a alta dos alimentos sendo revertida para deflação e os preços de serviços mostrando desaceleração. Carlos espera um corte da Selic de 0,5 ponto percentual na próxima semana, iniciando um "longo ciclo" de redução dos juros.
A aprovação do teto de gastos permite não apenas ao BC baixar a Selic em 0,5 ponto percentual agora como abre caminho a um ciclo "agressivo" de cortes, diz o economista-chefe do Banco Fibra, Cristiano Oliveira.
O economista prevê 500 pontos base de corte nos próximos doze meses, o que levaria a Selic para 9,25%, contra os 14,25% atuais. De acordo com Oliveira, a aprovação da PEC em 1º turno e "sem desidratação" era condição fundamental para o BC começar a cortar os juros.
A aprovação da PEC foi uma "votação espetacular", na qual o governo deu demonstração de força e controle de sua base no Congresso, diz Solange Srour, economista-chefe da ARX Investimentos.
A aprovação da medida "em tempo recorde e sem modificações" mostra que há uma folga para conduzir reformas mais desafiadoras, como a da Previdência, que também exige 308 votos para passar na Câmara, diz a economista.
Mesmo com a aprovação da PEC e os números recentes mais positivos da inflação, o mercado de juros futuros ainda hesita em abraçar mais convictamente a aposta em um corte mais avantajado da Selic na semana que vem.
Os contratos na BM&F ainda mostram um investidor dividido entre as projeções de corte de 0,25 e 0,5 ponto percentual, contrastando com a recepção mais positiva dos analistas à aprovação da PEC.
Cautela no exterior
Especificamente hoje, o principal motivo para a cautela vem do exterior. O dólar sobe contra a maioria das moedas e as Bolsas caem com o avanço das apostas em alta dos juros do Fed em dezembro.
Para Luciano Rostagno, estrategista-chefe do Banco Mizuho, um aperto monetário nos EUA pode pressionar o câmbio, o que seria um fator de preocupação para o BC. Afinal, uma eventual alta do dólar poderia gerar pressão inflacionária.
Outro ponto de cautela, segundo Rostagno, é a questão do horizonte que o BC vai considerar na decisão da semana que vem, se será voltado para atingir a meta de inflação em 2017 ou 2018. Em pronunciamentos recentes, o BC disse que essa mira não é estática e que muda com o tempo.
Como a inflação de 2018 está mais bem ancorada à meta de 4,5% do que a de 2017, se o BC voltar sua mira para o horizonte mais longo, o espaço para corte dos juros já neste Copom de outubro será maior.
Caso o BC insista no horizonte de 2017, contudo, a aposta em um corte maior da Selic –a não ser que as projeções do BC para a inflação no ano que vem tenham caído– pode ter de esperar as reuniões seguintes.
Se os juros do Fed e a mira do BC geram dúvidas, o alto desemprego e a recessão reforçam o cenário para o BC cortar juros, diz Carlos, do UBS. "O mercado de trabalho, com o desemprego perto de 12%, não representa risco de pressão inflacionária".
Embora os índices de confiança tenham melhorado após o impeachment, a melhora da atividade está demorando para se materializar, o que, combinado ao encaminhamento das reformas, ajuda a manter o caminho aberto para o Copom. "O governo está entregando e não vejo porque o BC postergar uma queda mais expressiva", diz Solange, da ARX.
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