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Jovens rebelam-se contra feudos antes de eleição do Paquistão

Faseeh Mangi, Chris Kay e Ismail Dilawar

24/07/2018 11h59

(Bloomberg) -- Perto da cidade rural de Badin, no sul do Paquistão, a cerca de quatro horas de carro de Carachi, a capital financeira, dezenas de homens esperam durante a noite por uma oportunidade de se reunir com Zulfiqar Mirza.

A família do proprietário de terras tem influência em parte da província de Sind, do tamanho do estado americano de Delaware, e os aldeões recorrem a Mirza para tudo: conseguir emprego, escolaridade e até mesmo resolver brigas. Um dos homens, Khalid Hussain, de 69 anos, disse neste mês que precisava de ajuda porque foi abandonado pelos filhos.

A família Mirza "ajuda as pessoas", disse Hussain enquanto aguardava na propriedade da família, de mais de 280 hectares. "Eu só quero um emprego para encher a barriga."

Os poderosos locais, como a família Mirza, podem acabar tendo grande influência no país, que possui armas nucleares, após a eleição de 25 de julho, e pesquisas mostram que provavelmente nenhum partido obterá maioria no parlamento paquistanês. Para os políticos nacionais, cortejar grandes proprietários rurais conhecidos como "elegíveis" tem um porém: o apoio deles é essencial para vencer as eleições no Paquistão, mas muitos tendem a se opor a medidas que impulsionariam o crescimento econômico no país sem dinheiro, como a modernização das leis trabalhistas e tributárias.

Conhecido como biradiri, o sistema de clientelismo rural ajuda a explicar por que o Paquistão obteve a menor pontuação da Ásia no Índice de Percepção de Corrupção da Transparência Internacional, atrás de Afeganistão, Coreia do Norte e Camboja. Embora a urbanização e o redistritamento tenham reduzido o poder dos políticos rurais - cerca de 10 distritos eleitorais municipais foram criados neste ano -, em muitas regiões eles ainda podem fornecer favores, fazer justiça e até mesmo pressionar aldeões a votar em determinado candidato.

O feudalismo continua "muito forte" na zona rural, disse Mustafa Kamal, ex-prefeito de Carachi e diretor do partido Pak Sarzameen, voltado à urbanização. "O homem comum não tem muita força para enfrentar o senhor feudal, que é capaz de esmagá-lo completamente."

Essa estrutura de poder está sendo atacada. Imran Khan, ex-estrela do críquete que viu sua popularidade disparar, tentou conquistar eleitores jovens e urbanos ao denunciar partidos feudais e dinásticos que dominam o cenário político do Paquistão. Khan, cuja campanha anticorrupção ajudou a provocar a prisão de Sharif, prometeu ampliar a baixa base tributária do Paquistão e fortalecer as instituições do governo.

Desde a década de 1970, o país foi governado alternadamente pelos militares, pelo Partido Popular do Paquistão e pela Liga Muçulmana do Paquistão-Nawaz, comandada por Nawaz Sharif, que foi primeiro-ministro três vezes e agora está preso por corrupção. No entanto, mesmo enquanto protestava contra o feudalismo, Khan considerou necessário cortejar os principais políticos rurais, particularmente na província de Punjab, que fornece mais da metade dos cargos federais do país.

Em Badin, a família Mirza está concorrendo com a Grande Aliança Democrática, um partido minoritário que não revelou quem apoiará para o cargo de primeiro-ministro após a eleição. Hasnain Mirza, de 34 anos, filho de Zulfiqar, reconheceu a linhagem política de sua família, mas também negou que ela fosse feudal.

"A base do apoio vem de todos os serviços prestados às pessoas", disse Mirza. "As pessoas são livres para nos dar as costas. Todos são livres para decidir quem vão apoiar e por quanto tempo."

Mirza também disse que o eleitorado se tornou mais esclarecido e que surgiram rachaduras no sistema biradiri. "Os políticos que dependem do clientelismo lutam contra o tempo", disse.

Repórteres da matéria original: Faseeh Mangi em Karachi, fmangi@bloomberg.net;Chris Kay em Karachi, ckay5@bloomberg.net;Ismail Dilawar em Karachi, mdilawar@bloomberg.net