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Rali do câmbio deve acabar logo, dizem analistas mais precisas

Aline Oyamada e Felipe Saturnino

24/10/2018 12h07

(Bloomberg) -- Para as melhores analistas do real, o rali do câmbio logo chegará ao fim.

Depois de o dólar cair quase 10% frente ao real neste mês --a maior queda entre as principais moedas do mundo--, a divisa está pronta para uma reversão após a eleição de domingo (28), que decidirá o novo presidente do país, segundo You-Na Park, do Commerzbank, e Tania Escobedo, da RBC Capital Markets, as analistas que mais acertaram o rumo do real este ano no ranking da Bloomberg.

Com as pesquisas indicando uma vitória fácil para o deputado de direita Jair Bolsonaro (PSL), as duas estrategistas de câmbio dizem que a maior parte do otimismo já está precificada, uma vez que os investidores acreditam que o militar da reserva irá consertar as finanças públicas do país com uma série de medidas fiscais.

No entanto, reformular o sistema previdenciário, elevar impostos e privatizar empresas estatais são medidas difíceis e impopulares, que provavelmente enfrentarão considerável resistência no Congresso. E uma vez que o mercado reconhecer que o caminho será difícil pela frente, há muito espaço para que o otimismo diminua e o real enfraqueça.

"Os mercados querem ver a reforma da Previdência perfeita, o programa de privatização perfeito, o esquema tributário perfeito", disse Escobedo, a estrategista de moedas da América Latina do RBC sediada em Nova York, que previu corretamente a depreciação do real no primeiro semestre do ano e tornou-se a analista mais precisa no primeiro e segundo trimestres.

"Há muito espaço para decepção, pois a falta de experiência política do gabinete de Bolsonaro provavelmente atrapalhará as reformas."

Ativos brasileiros tiveram desempenho superior ao de pares globais desde meados de setembro, período no qual as pesquisas começaram a mostrar Bolsonaro ganhando terreno entre os eleitores, e estenderam o avanço depois que o capitão da reserva angariou um forte apoio no primeiro turno em 7 de outubro.

Os mercados abraçaram sua candidatura principalmente devido a seu assessor econômico e futuro superministro da área econômica, Paulo Guedes, um dos fundadores da Bozano Investimentos, empresa de "private equity" com base no Rio de Janeiro e formado pela Universidade de Chicago.

A perspectiva dos agentes financeiros é que a perspicácia de Guedes nos negócios compensará a falta de interesse de Bolsonaro em questões econômicas, abrindo o caminho para políticas que irão sustentar as finanças do país.

Mas todas as propostas corretas de política econômica podem não ser o bastante caso não sejam aprovadas no Congresso. Ainda que o PSL de Bolsonaro tenha visto sua bancada aumentar de oito para 52 cadeiras na Câmara dos Deputados, ele pode ter dificuldades em aprovar projetos e terá que construir alianças em um ambiente difícil.

Segundo qualquer padrão internacional, o Congresso do Brasil é fragmentado, indisciplinado e brutal, com dezenas de partidos competindo para promover seus próprios projetos e interesses.

O dólar deve voltar a subir à medida que essa realidade se instale, de acordo com as duas analistas. Após uma breve queda depois do segundo turno para cerca de R$ 3,60, o Commerzbank prevê que o dólar suba para R$ 3,90 no início de 2019. O RBC espera um 'overshoot' do dólar para R$ 3,50 após a votação, mas o movimento deve se dissipar rapidamente e o dólar deve voltar para acima de R$ 4,20 depois de três meses.

A estimativa mediana dos estrategistas pesquisados pela Bloomberg é que o dólar encerre o ano em R$ 3,92, uma alta de mais de 5% em relação ao seu nível atual, que está próximo aos R$ 3,70.

"Haverá alguma incerteza nos primeiros meses de sua presidência e pode haver algum potencial de decepção em relação à consolidação fiscal e à reforma previdenciária", disse Park, estrategista de câmbio do Commerzbank sediada em Frankfurt e que foi a mais precisa analista para a moeda no terceiro trimestre. "Ainda há muitas incertezas em relação a Bolsonaro."

Park espera que Bolsonaro impulsione uma versão enxuta da reforma da Previdência proposta pelo presidente Michel Temer, um projeto de lei que reduziria os gastos estabelecendo uma idade mínima para aposentadoria, entre outras mudanças.

Ela prevê que Bolsonaro não terá o capital político para aprovar uma versão mais forte, já que provavelmente encontrará forte oposição a algumas de suas posições sociais mais controversas, como facilitar para os brasileiros a posse de armas. Enquanto isso, Escobedo espera que Bolsonaro remeta ao Congresso no primeiro semestre de 2019 um projeto de lei de reforma do sistema previdenciário.

Os investidores afirmam que o Brasil necessita desesperadamente de uma nova abordagem econômica depois de anos de má administração fiscal nas mãos do Partido dos Trabalhadores, de esquerda. Uma agenda de reformas ganhou destaque quando Temer assumiu o cargo em 2016, depois que a ex-presidente Dilma Rousseff foi destituída em um processo de impeachment por violar as regras orçamentárias.

Medidas bem-vindas pelos mercados no governo do emedebista incluíram a revisão das leis trabalhistas brasileiras e um teto para os gastos públicos destinados a reduzir o déficit.

O real subiu até R$ 3,0574 por dólar no início de 2017, mas caiu nos primeiros nove meses deste ano refletindo incerteza sobre as eleições. A moeda atingiu um nível recorde de baixa em setembro, cotada a R$ 4,2071 por dólar.

O caso Haddad

Uma vitória totalmente inesperada do candidato do PT, Fernando Haddad, provavelmente faria os mercados despencarem, segundo analistas e investidores.

Haddad tornou-se o candidato do partido depois que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva --preso após condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro-- foi impedido de concorrer.

Haddad já disse ser contra o teto de gastos aprovado, e geralmente é visto como menos propenso a conter o déficit orçamentário. Se ele se tornar presidente e decidir aumentar os gastos, isso poderá levar o rating de crédito do Brasil ainda mais para baixo e os investidores ficarão muito cautelosos, disse Park.

"Se houver erros de política, então não há realmente um limite para a desvalorização da moeda", disse ela.