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Tereza Cristina terá delicada missão à frente da Agricultura

Simone Iglesias e Samy Adghirni

20/12/2018 17h40

(Bloomberg) -- A futura ministra da Agricultura, a deputada Tereza Cristina Dias (DEM-MS), tem uma delicada missão: tentar administrar o impacto das fortes opiniões de seu chefe em política externa nas exportações agrícolas do país.

Tereza, uma das poucas nomeações políticas feitas pelo presidente eleito Jair Bolsonaro, disse à Bloomberg que está tentando sensibilizá-lo a respeito do impacto que teria transferir a embaixada brasileira em Israel para Jerusalém. Esse movimento incomodaria muitos clientes no mundo árabe, que se tornou um grande mercado para a carne brasileira. "Tenho colocado para o presidente a preocupação do setor, os números das nossas exportações, o impacto que teriam essas medidas", disse a futura ministra, que liderou a Frente Parlamentar da Agropecuária.

O presidente eleito "está convicto" sobre a transferência da embaixada, mas continua atento a outras opiniões. "Ele é muito sensível, não é inflexível. Ele ouve, tem suas convicções e vamos ter que nos adaptar ao que ele quer para o Brasil", afirmou. A futura ministra disse que todos no governo têm consciência de que existirá uma reação dos clientes árabes e que, tomada a decisão, o impacto vai depender da forma e timing em que será operacionalizada esta mudança.

O Brasil acumulou um superávit de US$ 7,1 bilhões com as 22 nações da Liga Árabe em 2017, em comparação com um déficit de US$ 419 milhões com Israel. A liga pediu a Bolsonaro que repensasse os planos de seguir os passos dos EUA e transferir a embaixada do Brasil de Tel Aviv para Jerusalém.

Tereza disse que o alinhamento com os Estados Unidos é uma decisão tomada por Bolsonaro e defende parceria comercial, "inclusive com a China", já que ambos os países competem pela exportação de mesmos produtos a mesmos mercados.

China

A futura ministra afirmou que o Brasil precisa reduzir a sua dependência comercial da China com abertura a mercados como Índia, Indonésia e Malásia, estes dois últimos de maioria muçulmana e foco de potencial atrito em relação à mudança da embaixada em Israel.

"Temos na China um grande mercado, mas vamos vender só para a China ou vamos abrir novos mercados?", disse. "Temos que ter uma política mais macro, diversificar países. O Brasil vende menos para a Índia, é um país que temos que olhar, assim como a Indonésia, Malásia. Temos que explorar mais o mercado asiático."

Mercosul

Tereza defendeu uma reformulação do Mercosul, ao questionar o funcionamento do bloco formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. "O Mercosul tem algumas coisas que são danosas. O Brasil acaba sendo prejudicado em alguns setores", disse, citando arroz, leite e maçã. "Não podemos deixar que esses setores produtivos nossos acabem morrendo porque temos que receber de todos os países. O modelo de livre comércio do Mercosul não está funcionando para a agropecuária".

Tereza quer chamar os países para conversar e propor "um acordo de cavalheiros" para estabelecer cotas privadas. "Com a Argentina já foi feito e funcionou muito bem", disse.

A futura ministra afirmou que sua missão principal é manter os atuais mercados e abrir novos, comprovando aos países que o sistema de inspeção animal no Brasil é confiável, apesar dos escândalos de corrupção recentes envolvendo a JBS, maior exportadora de proteína animal do país, e as operações Carne Fraca e Trapaça, sobre esquemas de fraude em análises sobre a qualidade do frango e da carne bovina, que envolvem diversas empresas do setor.

"Temos sistema robusto e o que havia de fragilidades estão contornadas. Precisamos mostrar isso para os países que tiveram mercados suspensos pelas crises", afirmou. Segundo ela, o sistema de defesa brasileiro é bom, mas não é suficiente para atender o mercado, que cresceu muito nos últimos anos. Dias afirmou que pretende estabelecer um sistema de autogestão dos frigoríficos, com responsabilidades compartilhadas entre o governo e as empresas.

Acordo de Paris

A futura ministra defendeu ainda a revisão da participação do Brasil no Acordo de Paris, pacto internacional assinado por 195 países em 2015 para combater o aquecimento global. Tereza disse que há pontos positivos e negativos e que não há uma posição fechada no governo sobre a permanência ou não.

"Temos de rever algumas coisas e propor algum tipo de mudança. O presidente tem falado no Triplo A (proposta de um grande corredor ecológico que ligue os Andes ao Atlântico, passando pela Amazônia), isso é uma coisa que a gente tem que pensar. Esse governo é muito preocupado com a soberania nacional."

--Com a colaboração de Gerson Freitas Jr..