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'A crise política não deve abortar a decolagem', afirma economista

José Fucs

São Paulo

14/07/2017 08h43

O economista Carlos Geraldo Langoni, de 72 anos, parece convencido de que, depois de dois anos e meio, a recessão, enfim, ficou para trás. Segundo ele, as previsões de crescimento para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2017 e 2018 estão sendo revisadas para baixo, mas a crise política não deverá abortar a decolagem da economia. Nesta entrevista ao Estado, Langoni fala sobre o descolamento entre a política e a economia e os efeitos da aprovação da reforma trabalhista e da condenação de Lula nos negócios. Ele analisa, também, as consequências de uma eventual rejeição da reforma da Previdência pelo Congresso Nacional. A seguir, os principais trechos da entrevista.

Com a condenação do ex-presidente Lula, os mercados reagiram de forma positiva: a Bolsa subiu e o dólar caiu. Em que medida a sentença de Lula pode influenciar a economia?

Ela reforça a independência do Judiciário e sinaliza que as instituições democráticas do País são sólidas. Mas, apesar da reação favorável dos mercados, é preciso aguardar as eleições de 2018 para avaliar melhor suas consequências econômicas. Agora, eu acredito que reduz a probabilidade de haver uma mudança de rota na política econômica atual.

Como o sr. viu a aprovação da reforma trabalhista pelo Senado? Que impacto terá na economia?

Tem um impacto direto e positivo sobre o ambiente de negócios. Funciona como um contraponto às incertezas políticas. É emblemático que, apesar de toda a turbulência política, o Congresso tenha aprovado a modernização das leis trabalhistas. Isso vai ampliar a geração de empregos formais e permitirá ganhos expressivos de produtividade.

Muitos economistas dizem que a economia está se descolando da crise política. O sr. concorda com eles?

Sim, apesar de toda a tensão política que contagiou o Congresso e o epicentro do Poder, a resiliência demonstrada pela economia brasileira é admirável. O que está acontecendo hoje é bem diferente do que aconteceu na eleição de Lula em 2002 e no primeiro semestre de 2016, antes do impeachment, quando câmbio e juros dispararam e houve uma queda acentuada na Bolsa. Agora, os mercados estão relativamente comportados. Os juros mostram tendência clara de queda e o câmbio, relativa estabilidade. Isso sugere que o contágio da percepção de risco país pela tensão política foi baixo.

Em relação à economia real, os efeitos da crise política foram mais visíveis, com a desaceleração da retomada. Como o sr. analisa isso?

A decolagem da economia brasileira é lenta, mas está dentro do que se poderia esperar depois de dois anos e meio de recessão. As projeções do PIB (Produto Interno Bruto) estão sendo revisadas para baixo, mas permanecem positivas. A estimativa de crescimento é de 0,4% neste ano e de 2% em 2018. A recessão acabou, mas o crescimento continua abaixo do que poderia ser. A divulgação da delação do empresário Joesley Batista interrompeu a alta dos índices de confiança, mas não parece ter força para abortar a decolagem, como aponta o bom desempenho da indústria em abril, puxado pelo setor automobilístico.

A que o sr. atribui esse resultado?

A mudança de foco da política econômica já deu frutos importantes. Ela passou a se concentrar na correção dos desequilíbrios macroeconômicos e está abrindo espaço para o setor privado, com uma onda de concessões e a adoção de marcos regulatórios consistentes. A percepção de que a estratégia econômica deve permanecer inalterada, ancorada numa equipe econômica altamente qualificada, independentemente do desfecho da crise política, também é fundamental. A política econômica pode até sofrer desvios, ajustes de timing. A natureza das reformas também pode sofrer ajustes, mas a direção não deve mudar. Não é nem uma escolha ideológica, é pragmática mesmo.

Como o atraso na reforma da Previdência pode afetar esse processo?

Acredito que há um exagero no que se refere ao impacto da reforma da Previdência. Não concordo que, se a reforma não for aprovada, o País terá uma recaída recessiva. O mundo não acaba ou começa na reforma da Previdência, como se ela tivesse o condão mágico de resolver todos os nossos problemas. Ela é importante? É. Mas não esgota as reformas. O efeito dessa reforma se dará ao longo tempo: no curto prazo, o impacto negativo será mais sobre as expectativas, principalmente em relação à sustentabilidade fiscal. Se for adiada, é preocupante, porque mantém a tendência de crescimento da relação dívida pública/PIB, mas o que importa é que mais cedo ou mais tarde a reforma da Previdência vai se tornar realidade.

De qualquer forma, o sr. acredita que será possível aprovar a reforma da Previdência?

Com o aprofundamento da crise política, o Congresso provavelmente aprovará uma reforma minimalista. Em todos os países, esse é um processo demorado. Muitas vezes, leva três ou quatro anos. Por isso, não acho nada absurdo se a reforma for adiada para 2018 ou 2019 ou que seja aprovada uma reforma parcial a ser complementada pelo novo presidente. Isso não significa que o País vai voltar para a recessão. Agora, não podemos repetir a tragédia grega nem a experiência dramática do Rio de Janeiro, que não tem capacidade de honrar a aposentadoria de seus funcionários públicos. Seguramente, quem for o presidente em 2019 terá de enfrentar esse desafio e implementar ou aprofundar a reforma.

As informações são do jornal "O Estado de S. Paulo".