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Propostas dos candidatos à presidência para o meio ambiente são opostas

Giovana Girardi

São Paulo

19/10/2018 07h30

Investir em energia eólica e solar é o único ponto de convergência entre os planos de governo dos presidenciáveis Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) dentro do que poderia ser enquadrado como agenda ambiental. Fora isso, as propostas sinalizam para caminhos opostos.

O plano de Haddad tem como linha condutora a chamada "transição ecológica para a nova sociedade do século 21", que considera conceitos amplos de desenvolvimento sustentável, as ideias de "viver bem" no campo e na cidade e ações para promover uma economia de baixo carbono, a fim de ajudar a conter o aquecimento global.

No programa de Bolsonaro, o assunto não é tratado como um tema próprio. A palavra "meio ambiente" só aparece uma vez, no item que propõe a junção de várias instituições relacionadas à agricultura em uma pasta só.

Esse ministério teria, entre outras atribuições, gerir os recursos naturais e o "meio ambiente rural". Em entrevistas, Bolsonaro afirmou que a ideia era "acabar a brincadeira dessa briga entre ministérios" - mas após receber críticas de vários lados, a campanha começou a rever essa ideia. Ele indicou também o plano de transformar o Ibama (responsável pela fiscalização ambiental no País) e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio - que faz a gestão das unidades de conservação) em uma coisa só, para acabar com o que chama de "indústria da multa".

Fortemente rejeitadas por ambientalistas, as propostas de Bolsonaro foram endossadas pela Frente Parlamentar da Agropecuárias (FPA). Mas, mesmo no agronegócio, há alguma reserva em relação a elas.

A mais contestada é a que prevê a retirada do Brasil do Acordo de Paris, esforço internacional assinado por 195 países em 2015 para conter o aquecimento do planeta. O presidenciável sugere que o acordo fere a soberania do País e que o Brasil teria de "pagar um preço caro" para atender aos compromissos.

Para o ex-ministro da Agricultura Roberto Rodrigues, coordenador do Centro de Estudos do Agronegócio da Fundação Getulio Vargas, a proposta não é razoável. "O Brasil assumiu um compromisso de Estado, não pode um novo governante dizer que não tem mais nada a ver com isso", afirma.

Ele defende que o agronegócio "pode dar uma contribuição extraordinária", sobretudo na questão do etanol, do biodiesel e também se beneficiar. "O agro pode ajudar muito com a agricultura de baixo carbono (ABC). Nós temos um compromisso e temos condição de cumpri-lo", diz. "Veja a crítica universal que o Trump recebeu por causa de atitude parecida", complementa, referindo-se ao presidente norte-americano. Os Estados Unidos são o único país que voltou atrás no acordo.

Desmatamento

A proposta de abandonar o acordo e o possível enfraquecimento do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama são vistos como retrocesso por pesquisadores e ambientalistas. "Ele diz que o Brasil teria de pagar um preço muito alto, mas é ao contrário. Para outros países, que dependem da energia a carvão, é muito alto. Mas aqui é basicamente dar continuidade à política ambiental. Quase todo o compromisso brasileiro é cumprido pelo atingimento da meta de zerar o desmatamento", afirma o diplomata Rubens Ricupero, ex-ministro do Meio Ambiente e da Fazenda e hoje diretor da Faap.

Ricupero opina que se a ideia for colocada em prática, assim como a junção dos dois ministérios e do Ibama ao ICMBio, haverá um efeito de redução da fiscalização, que pode promover uma alta do desmatamento.

O próprio ministro do Meio Ambiente, Edson Duarte, vem fazendo alertas nesse sentido. Dados do Instituto de Pesquisas Espaciais apontam para uma alta de 36% no desmatamento entre junho e setembro deste ano, na comparação com o ano anterior. "Já estamos percebendo uma movimentação diferente de aumento de pressão sobre a floresta neste período eleitoral. A Amazônia é muito sensível. A pressão avança quando há sinais de mudança no horizonte. E ao falar em indústria da multa, o debate pode incentivar a impunidade", diz.

Haddad propõe alcançar desmatamento líquido zero (reflorestamentos compensariam eventuais cortes) até 2022 em todos os biomas e promover a expansão da produção agropecuária nos "mais de 240 milhões de hectares já abertos para agricultura e pastagens".

Para João Adrien, diretor executivo da Sociedade Rural Brasileira, em linhas gerais as propostas de Bolsonaro estão mais alinhadas com coisas defendidas pela SRB. "Ele tem uma visão mais macro, de trazer segurança jurídica, organizar regulamentações e o mercado." O setor tende a discordar das metas de desmatamento zero total, em especial no Cerrado.

"O desmatamento ilegal tem de ser combatido com todas as forças, rigor absoluto. Por mim tinha de acabar hoje, não em 2030 ou 2022. É ilegal, portanto não é aceitável. Mas o Código Florestal permite um corte legal. Dentro de normas adequadas, que contemplem o universo da sustentabilidade, não vejo o problema, sobretudo no Cerrado. Porque é possível que em algum momento seja necessário expandir", diz Rodrigues.

Baixo carbono

Ainda no contexto climático, Haddad propõe uma "reforma fiscal verde, que progressivamente aumentará o custo da poluição e premiará investimentos e inovação de baixo carbono". A ideia é reduzir o custo tributário do investimento verde em 46,5%.

"Não há comparação possível entre os dois planos", afirma Ricupero. Carlos Rittl, secretário executivo do Observatório do Clima, também vê diferenças fundamentais: "Enquanto um busca integrar o ambiente como elemento estratégico para o desenvolvimento - e a maioria dos planos dos demais candidatos demonstrava, também, compromissos, em maior ou menor grau, com a proteção ao ambiente -, as promessas do outro representam colocar por terra a governança socioambiental do País". As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.